Acordo com uma terrível ressaca na manhã seguinte, o que, para os meus padrões, significa que eu devo ter batido recordes. Pergunto-me por um instante o motivo da dor de cabeça ser tão forte, considerando que já passei muitas madrugadas regadas a uísque, e então me lembro de que havia algum tempo que eu não o misturava com outras bebidas. Deve ser essa a razão, eu concluo, sem muita dificuldade.
Noto que estou no sofá da minha sala. Não sei como cheguei até aqui na noite anterior, mas estar em casa são e salvo parece suficiente para mim. Ainda assim, a partir do momento em que verifico que não estou machucado e que não fui roubado, minha curiosidade se atiça e eu começo a refazer meus últimos passos. Lembro-me, claro, de beber por longas horas ao lado de Hugo em dois ou três bares diferentes. Tento imaginar o que aconteceu com ele, se está bem, e me pergunto se devo ligar para ele. Penso que sim, mas depois penso que não. Ele pode estar morto, e a culpa pode ser minha. Torço para que não e tenho medo de descobrir a resposta, mas estou totalmente ciente de que posso guardar tamanha aflição apenas para mim.
Contrariado, levanto e procuro pelo meu celular no sofá. Porém, devido ao susto que tomo, paro imediatamente e volto a me sentar de forma brusca.
Há alguém na minha sala.
É um homem. Ele está sentado do outro lado da sala, na minha cadeira de descanso. Suas pernas estão cruzadas e ele olha seriamente para mim. Depois suspira, aliviado.
— Até que enfim, caramba — ele diz, com uma voz rouca.
Olho rapidamente para os lados. Preciso imediatamente de algo pontiagudo e cortante. Vejo as chaves do meu carro jogadas no sofá. Não é muita coisa, mas está ao meu alcance. Aponto na direção dele.
— Quem é você?
— Isso é sério? — ele pergunta, indicando minha mão. — Está me ameaçando com uma chave? Isso é ridículo. Além do mais, seu carro tem mais de sete anos de uso, a chave está gasta e não duraria nem um segundo se pressionada com força contra uma superfície maciça.
— Consigo furar seus olhos com ela — forço minha voz para que ela soe segura, mas não posso afirmar com certeza se obtenho sucesso.
— E eu consigo furar os seus sem objeto algum — ele responde.
Não faço ideia de quem é esse cara, mas, de alguma forma, ele parece mais convencido sobre suas habilidades do que eu.
— Não tenho muito dinheiro — afirmo de imediato. — Acabei de ser demitido da minha gravadora. Olha, tenho algumas joias, e você pode levar meu carro, se quiser.
Ele suspira e esfrega as mãos no rosto.
— É sempre a mesma coisa, que droga.
Ele se estica e se acomoda no sofá, colocando as pernas em cima da mesa central.
— Está vendo este terno? — ele pergunta, apontando o tecido de linha fina que usa. — É da Givenchy. Já viu alguém assaltar usando Givenchy?
— Talvez um deputado.
— Não é isso.
— Olha — eu começo, envergonhado, quando chego à conclusão que tanto temia. — Eu sei que bebi muito ontem à noite e talvez por isso não esteja me lembrando de você. Seja lá o que aconteceu, eu não estava consciente quando decidi trazer você para cá. Não curto homem. Foi minha primeira vez, eu juro.
Ele me olha horrorizado.
— Caramba, que merda. Vocês são mesmo malucos. Como pode pensar uma coisa dessas?
— Não foi isso?
— Claro que não.
— Então, quem é você?
Ele se acalma e sorri com o canto da boca.
— Tenho muitos nomes.
— Pode ser o de batismo.
— Não acho que eu tenha sido batizado.
Ele se levanta e olha pela janela. Noto que estou suando. O fato de acordar, encontrar um desconhecido dentro do apartamento e não conseguir descobrir uma explicação, nem mesmo com a minha criatividade para tragédias, faz com que eu me sinta um pouco nervoso.
— Disse que não se lembra da noite passada, mas recorda a conversa que teve com Hugo? — ele pergunta.
— Não. Quer dizer, mais ou menos. Por falar nisso, ele está bem?
— Está ótimo.
— Como sabe? Foi a casa dele também? O que você fez com ele?
— Não fiz nada, não quero nada com ele. Só tenho negócios a tratar com você.
— Por quê? O que eu fiz?
— É isso o que venho tentando explicar. Lembra-se da conversa ou não?
— Não sei do que está falando. Conversamos por horas ontem.
— Você disse que está disposto a tudo para recuperar a sua carreira.
— Ah, sim... eu lembro. Estou mesmo.
— Disse que está desesperado.
— Sim. Você é empresário?
— Não, porra. Estou tentando ajudar. Lembra o que disse depois?
— Por que não fala logo?
— Porque não é assim que as coisas funcionam. A lembrança precisa partir de você. Recorda o que falou depois ou não?
— Que eu faria qualquer coisa... Acho que foi algo assim.
— Qualquer coisa o quê? Teve algo que Hugo não gostou de ouvir.
— Ah, sim... Eu disse que faria até um pacto com o Diabo. Ele achou que eu não deveria dizer isso.
O homem sorri, e é o sorriso mais sinistro que já vi em toda minha vida.
— Chegamos aonde eu precisava antes de começarmos — ele informa, contente, enquanto tenta uma posição mais confortável no sofá. — Você acabou de dizer meu nome, pelo menos um dos vários que tenho. Estamos oficialmente apresentados.
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Do Jeito que o Diabo Gosta
ComédieLIVRO INTEIRO JÁ DISPONÍVEL PARA LEITURA GRATUITA AQUI NO WATTPAD✌🏻 Alex Britto é uma subcelebridade decadente. Depois de vencer um reality show musical com sua banda de rock e se tornar famoso da noite para o dia, seu sucesso desapareceu na mesma...