Capítulo 9

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Acordo com uma terrível ressaca na manhã seguinte, o que, para os meus padrões, significa que eu devo ter batido recordes. Pergunto-me por um instante o motivo da dor de cabeça ser tão forte, considerando que já passei muitas madrugadas regadas a uísque, e então me lembro de que havia algum tempo que eu não o misturava com outras bebidas. Deve ser essa a razão, eu concluo, sem muita dificuldade.

Noto que estou no sofá da minha sala. Não sei como cheguei até aqui na noite anterior, mas estar em casa são e salvo parece suficiente para mim. Ainda assim, a partir do momento em que verifico que não estou machucado e que não fui roubado, minha curiosidade se atiça e eu começo a refazer meus últimos passos. Lembro-me, claro, de beber por longas horas ao lado de Hugo em dois ou três bares diferentes. Tento imaginar o que aconteceu com ele, se está bem, e me pergunto se devo ligar para ele. Penso que sim, mas depois penso que não. Ele pode estar morto, e a culpa pode ser minha. Torço para que não e tenho medo de descobrir a resposta, mas estou totalmente ciente de que posso guardar tamanha aflição apenas para mim.

Contrariado, levanto e procuro pelo meu celular no sofá. Porém, devido ao susto que tomo, paro imediatamente e volto a me sentar de forma brusca.

Há alguém na minha sala.

É um homem. Ele está sentado do outro lado da sala, na minha cadeira de descanso. Suas pernas estão cruzadas e ele olha seriamente para mim. Depois suspira, aliviado.

— Até que enfim, caramba — ele diz, com uma voz rouca.

Olho rapidamente para os lados. Preciso imediatamente de algo pontiagudo e cortante. Vejo as chaves do meu carro jogadas no sofá. Não é muita coisa, mas está ao meu alcance. Aponto na direção dele.

— Quem é você?

— Isso é sério? — ele pergunta, indicando minha mão. — Está me ameaçando com uma chave? Isso é ridículo. Além do mais, seu carro tem mais de sete anos de uso, a chave está gasta e não duraria nem um segundo se pressionada com força contra uma superfície maciça.

— Consigo furar seus olhos com ela — forço minha voz para que ela soe segura, mas não posso afirmar com certeza se obtenho sucesso.

— E eu consigo furar os seus sem objeto algum — ele responde.

Não faço ideia de quem é esse cara, mas, de alguma forma, ele parece mais convencido sobre suas habilidades do que eu.

— Não tenho muito dinheiro — afirmo de imediato. — Acabei de ser demitido da minha gravadora. Olha, tenho algumas joias, e você pode levar meu carro, se quiser.

Ele suspira e esfrega as mãos no rosto.

— É sempre a mesma coisa, que droga.

Ele se estica e se acomoda no sofá, colocando as pernas em cima da mesa central.

— Está vendo este terno? — ele pergunta, apontando o tecido de linha fina que usa. — É da Givenchy. Já viu alguém assaltar usando Givenchy?

— Talvez um deputado.

— Não é isso.

— Olha — eu começo, envergonhado, quando chego à conclusão que tanto temia. — Eu sei que bebi muito ontem à noite e talvez por isso não esteja me lembrando de você. Seja lá o que aconteceu, eu não estava consciente quando decidi trazer você para cá. Não curto homem. Foi minha primeira vez, eu juro.

Ele me olha horrorizado.

— Caramba, que merda. Vocês são mesmo malucos. Como pode pensar uma coisa dessas?

— Não foi isso?

— Claro que não.

— Então, quem é você?

Ele se acalma e sorri com o canto da boca.

— Tenho muitos nomes.

— Pode ser o de batismo.

— Não acho que eu tenha sido batizado.

Ele se levanta e olha pela janela. Noto que estou suando. O fato de acordar, encontrar um desconhecido dentro do apartamento e não conseguir descobrir uma explicação, nem mesmo com a minha criatividade para tragédias, faz com que eu me sinta um pouco nervoso.

— Disse que não se lembra da noite passada, mas recorda a conversa que teve com Hugo? — ele pergunta.

— Não. Quer dizer, mais ou menos. Por falar nisso, ele está bem?

— Está ótimo.

— Como sabe? Foi a casa dele também? O que você fez com ele?

— Não fiz nada, não quero nada com ele. Só tenho negócios a tratar com você.

— Por quê? O que eu fiz?

— É isso o que venho tentando explicar. Lembra-se da conversa ou não?

— Não sei do que está falando. Conversamos por horas ontem.

— Você disse que está disposto a tudo para recuperar a sua carreira.

— Ah, sim... eu lembro. Estou mesmo.

— Disse que está desesperado.

— Sim. Você é empresário?

— Não, porra. Estou tentando ajudar. Lembra o que disse depois?

— Por que não fala logo?

— Porque não é assim que as coisas funcionam. A lembrança precisa partir de você. Recorda o que falou depois ou não?

— Que eu faria qualquer coisa... Acho que foi algo assim.

— Qualquer coisa o quê? Teve algo que Hugo não gostou de ouvir.

— Ah, sim... Eu disse que faria até um pacto com o Diabo. Ele achou que eu não deveria dizer isso.

O homem sorri, e é o sorriso mais sinistro que já vi em toda minha vida.

— Chegamos aonde eu precisava antes de começarmos — ele informa, contente, enquanto tenta uma posição mais confortável no sofá. — Você acabou de dizer meu nome, pelo menos um dos vários que tenho. Estamos oficialmente apresentados.

Do Jeito que o Diabo GostaOnde histórias criam vida. Descubra agora