Capítulo 39

3 0 0
                                    


Saio para jantar com Montana e Ezra após a entrevista coletiva. Estou morto de fome, e paramos em um lugar perto do prédio da gravadora.

— Foi uma boa coletiva — comenta Ezra. — Acho que você está se saindo melhor nas respostas, Alex.

— Espero que sim. As perguntas têm ficado cada vez mais complicadas.

— É normal. Você está em evidência. Será transformado em um alvo daqui para frente.

— Um alvo?

— Claro. É a maneira como a imprensa enxerga artistas.

— O que foi a pergunta daquele cara? — Montana pergunta. — Sobre mensagens subliminares.

— Ezra acabou de resumir — digo. — Ele estava apenas me tornando um alvo.

— Sabe, eu realmente não me lembro de termos gravado aqueles vocais. Quero dizer, no começo achei os ruídos tão estranhos que pensei que era uma falha técnica do microfone ou dos instrumentos. Às vezes o áudio é captado de forma tão sensível que não soa bem... Mas depois percebi que era mesmo a sua voz. O que você estava fazendo?

— Provavelmente estava bêbado e acabei deixando algo na mixagem final.

Eles não parecem se importar muito com o assunto.

— Não podemos perder tempo com essas perguntas idiotas que os repórteres fazem — afirma Ezra. — Precisamos começar a pensar no próximo clipe. Estou cotando nomes para a direção, e gostaria de discutir isso com você, Alex.

— Deixe-me ir ao banheiro, antes.

O banheiro fica nos fundos do restaurante. Entro, vou até um dos mictórios e começo a mijar. Estou completamente sozinho e, de repente, tenho uma ideia enquanto balanço meu pinto para secá-lo.

— Será que você poderia aparecer agora? Será rápido, eu prometo.

Espero um momento. Há silêncio, apenas quebrado pelo som abafado de pratos, conversa vindo do salão e da minha descarga. Nada acontece.

Até que alguém abre a porta.

— É uma hora estranha para me convocar — diz o Diabo, fechando a passagem. — Geralmente quando alguém me chama com o pau na mão, é uma emergência médica.

— O que você fez, hoje?

Ele dá de ombros.

— Preciso criar rumores.

— Por quê?

— Não tem graça gravar mensagens se as pessoas não prestarem atenção nelas.

— Vão começar a me acusar.

— O que é ótimo, não vê? Nunca poderão provar nada, apenas especular. É justamente disso que precisamos: pessoas curiosas a respeito do seu disco e da sua figura. Polêmica. É assim que se chama atenção e vende discos.

— Mas isso pode prejudicar minha carreira. Eles vão...

De repente a porta se abre em um estalo. É Ezra. Ele fica me encarando, e, depois, posso notar com clareza que olha para o Diabo.

— Desculpe, Alex. Você demorou, e apenas vim para checar se estava tudo bem.

Olho de um para o outro, sem saber o que fazer.

— Não se preocupe — peço, tentando agir com naturalidade. — Estou bem.

— Não sabia que estava acompanhado.

Fico estático. Eu não imaginava que o coisa-ruim podia ser visto por Ezra. Meu agente se aproxima.

— Bem, meu nome é Jonas Ezra. Eu agencio a carreira do Alex.

Ele estende a mão.

— O prazer é meu — responde o Diabo, retribuindo o cumprimento. — Meu nome é Peter. Velho amigo de infância.

— Ah, sim? — Ezra fica interessado. — Onde se conheceram?

— Na escola. Alex e eu estudamos juntos no ensino fundamental. Somos amigos desde então. E, claro, agora também sou um fã.

— Um dos primeiros, provavelmente.

— Desde o começo. Ele era o orgulho da nossa comunidade.

— Vou deixar vocês conversarem, então. Alex, estarei na mesa. Ainda temos assuntos a discutir.

Ele sai, e espero que feche a porta.

— Ele pode ver você? — pergunto ao Diabo.

— Claro.

— Por que você simplesmente não desaparece, como antes?

— Porque ele acharia estranho se encontrasse você conversando sozinho no banheiro. É isso que você quer?

— Não.

— Então tenho de manter minha forma humana. Vocês, humanos, não pensam em tudo. Deus acredita que tudo o que cria é perfeito, mas não fez vocês direito.

— Tudo bem, mas não faça mais aquilo, ok?

— O quê?

— Tentar me desmascarar na frente de jornalistas.

— Eu já disse: tive de fazer aquilo, e talvez faça de novo. Boatos são tudo. Quando há rumores, as pessoas sempre ficam alertas. Elas são viciadas nisso.

— E se começarem a fazer perguntas?

— Faça mistério. Perde a graça, se for confirmado, mas você também não pode negar. Deve deixar a pergunta no ar. Assim, as pessoas ficam ainda mais curiosas. A incerteza enlouquece. É como os seres humanos funcionam. Então desconverse. Responda qualquer coisa, mas não confirme, nem desminta.

— Vou tentar.

— Agora tenho que ir.

— Espere.

— O que é?

— Tenho uma dúvida. Devo fazer uma turnê?

— Que pergunta é essa? É claro que sim. Está no nosso contrato! Além disso, discos não trazem mais tanto dinheiro. Se quiser ser rico, precisa arranjar uma maneira de explicar de onde toda a sua grana vem. Sua vida melhorou, e agora você vive com luxo. Isso vai gerar perguntas.

— Parece meu contador falando.

— E você pensava que contabilidade era uma criação de Deus?

Ele abre a porta e vai embora. Espero um minuto, e então volto à mesa. Ezra e Montana me esperam.

— Tem algo que eu gostaria de discutir com vocês — digo.

— O que é? — pergunta Ezra.

— A turnê. Precisamos começar a marcar os shows.

— Parece que alguém está ansioso para arrebentar nos palcos — sugere Montana.

— Não é só isso.

— O que mais, então?

Eu os encaro e sorrio.

— Eu preciso ficar rico.

Do Jeito que o Diabo GostaOnde histórias criam vida. Descubra agora