Erika tomou todo o fôlego que conseguiu, abriu os olhos assustada e ofegante, tentava respirar como nunca havia respirado, como se tentasse pegar todo o ar para si. O resto das sensações vieram aos poucos, primeiro o frio e depois sua pele molhada, o som de chuva começava aparecer ao longe e o cheiro forte de terra molhada. Após algum tempo, sua visão voltava, e a primeira coisa que viu foi um buraco com um caixão aberto dentro, cheio de água. Levantou a cabeça e viu Franziska sentada sobre um túmulo, com uma pá apoiada entre as pernas, vestida com uma capa de chuva transparente. Sorriu e fincou a pá em um monte de terra ao seu lado, saltando do túmulo em seguida.
– Finalmente – sorriu. Estava com medo de que morresse de verdade, afogada ali dentro – apontou e depois enfiou a mão no bolso, tirando uma barra de cereais. Deve estar com fome, coma isso por enquanto... E isso – tirou uma caixa de suco do outro bolso, a entregando.
– Eu estava enterrada?
– Sim.
Erika olhou a barra e o suco sem acreditar no que via. Após dias considerada morta, pensou, sou recepcionada por uma garota na chuva que me dá uma barra de cereal e um suco encaixotado!
– Está sem fome? – perguntou Franziska, encostada no túmulo.
– Não. Apenas ainda não estou muito bem depois de tudo que passou. Não adiantou em nada na verdade – suspirou, abrindo a embalagem e mordendo um pedaço. Mel com banana!?
– Não gosta?
– Detesto! – respirou fundo terminando de comer rapidamente. Blarg! Credo!
– Gosta de suco de cereja?
– Não vai me dizer que... – olhou a caixa – Ah, não! Pode pegar – levantou e devolveu o suco. O que aconteceu nesses dias? Se passaram três dias mesmo?
– Três dias, isso mesmo.
– Pareceu poucos minutos... Aconteceu alguma coisa nesses três dias?
– Nada demais – saiu de frente do túmulo e apontou. Você morreu, só isso.
Erika leu as palavras no túmulo, continha seu nome, a data de seu nascimento e morte, além de uma frase bonita que ela já havia esquecido quando escreveu em seu diário sobre essa noite.
– Eu fui até enterrada?
– Teve até funeral – Franziska levantou a mão para ver se a chuva ainda estava forte. Choradeira e tudo mais – balançou a caixa de suco, sorrindo. Hod tomou cuidado sobre tudo.
– Tudo?
– Sim – tirou a tampa e jogou dentro da cova. Vamos sair dessa chuva, ir a minha casa – tomou um gole e sorriu, oferecendo para Erika. É mentolado.
– Franziska, não.
– Tudo bem, então.
...
A casa de Franziska era pequena, mas bem aconchegante, eu particularmente gostava de lá. Graças à época de chuva, a cidade caía em uma espécie de clima desértico, em que o dia era quente e a noite muito fria. Sua casa tinha grandes janelas e um belo aquecedor, posicionado em uma lareira falsa, onde uma imagem de fogo ficava se repetindo em uma tela. Nos dias quentes, as janelas abertas e o ventilador central no teto da sala eram suficientes para criar um clima agradável; nas noites frias, a lareira mantinha o bem estar. Logo depois da sala, havia uma porta que dava a um corredor que levava ao único quarto e banheiro, e outra porta que dava na cozinha. Já passava da meia noite quando chegaram naquela casa, Franziska jogou a capa de chuva em um cabideiro e sua boina sobre o sofá no centro da sala. Erika ficou parada à porta de braços cruzados, até ir lentamente à lareira.
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Vazio
Teen FictionErika estava vivendo, sem saber muito o porquê disso. E nesses momentos de vida encontrou o Vazio, ou o Vazio a encontrou, e agora o pouco que sabia sobre a vida se tornou irrelevante. Ao tentar ser completo, o Vazio sempre cresce. Algumas pessoas...