Capítulo 5 - Cobiças

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Os saltos ecoavam em um ritmo suave e tranquilo pelo piso de madeira. Não era uma construção tão elegante e ostentosa quanto o prédio do Conselho de Comércio, mas, sem dúvida, era bem melhor construído em suas formas retas o prédio do Conselho de Construção e Obras de Rat's Bay. O horário do almoço havia passado cerca de duas horas, e as duas conselheiras, mulheres de quase a mesma idade, embora a de cabelos castanhos fosse alguns anos mais velha, voltavam conversando sobre seus ofícios.

— E como está aquele problema no trânsito, Louise? Conseguiram resolver?

— Karp... Eu odeio o Vosk. Não sei como você consegue lidar com aquela gente. — Parou no corredor, olhou para a amiga e fez uma careta. — Eles simplesmente não aceitam quaisquer modificações no trânsito! Nós criamos projetos, campanhas, mostramos, reunimos a população, explicamos, e nada. No dia seguinte, aquele bando de chimpanzés continua dirigindo e andando da mesma forma.

A morena riu alto, cobrindo a boca com a mão.

— E eu não sei, amiga? Aquele bando de brutamontes das docas está ameaçando fazer uma greve. Primeiro eles não querem trabalhar por causa da violência, aí eu dou tratos à bola para arrumar um patrulhamento com Dax, e eles continuam não querendo. O que eu fiz? Ameacei tirar o abono do inverno para quem não trabalhar. Como me respondem? Com uma ameaça de greve! — A mais velha das duas fez uma pausa, acompanhando com o olhar um belo rapaz, uns vinte e poucos anos, quase trinta, cabelos castanhos curtos, muito bonito. — Quem é ele, amiga?

— Ele? Brian Clarke, se não me engano. É assessor do subconselheiro de trânsito. — Respondeu abrindo a porta de seu gabinete e esperando a amiga, fechando-a em seguida. — Ele é uma gracinha, não é?

— É sim. — Riu, sendo acompanhada pela amiga.

A conversa seguiu por mais algum tempo, até a Conselheira do Comércio levantar-se e se despedir. Ela gostava de Louise Nap, era uma mulher de personalidade, decidida. Era uma das poucas pessoas com quem Karp se permitia, em ocasiões especiais, deixar-se levar pela vontade de outras pessoas. Tinham conceitos parecidos de como se divertirem e isso, por vezes, lhe fazia bem.

No corredor, no entanto, à porta fechada da amiga, voltou-se à sua secretária.

— Boa tarde, menina. Poderia me informar a sala do assessor do subconselheiro de trânsito?

A garota, uma jovem recém formada em secretariado empresarial, recém saída dos vinte anos de idade, tinha cabelos cacheados e soltos, como raspas de chocolate sobre a cabeça, lindos. Não tardou até a mulher visualiza-la em sua mente com uma de suas lindas coleiras no pescoço.

Quando a garota lhe entregou o papel, ela quebrou-se do transe e partiu; desceu dois andares abaixo, terceira porta à direita dos elevadores. Karp entrou sem bater.

— Senhor Clarke?

O rapaz estava absorvido em uma pilha de relatórios. Havia uma expressão compenetrada que franzia as sobrancelhas castanhas um pouco mais escuras que o cabelo curto. As mangas da camisa azul riscada estavam puxadas, e ele olhava com uma preocupada atenção para a tela do computador, mordendo o botão de uma caneta.

— Sim? — Respondeu sem levantar os olhos.

A mulher sorriu e permaneceu em silêncio, pigarreando com a mão em punho junto da boca.

— O que houve? — Perguntou levantando a voz para, só então, levantar os olhos e deparar-se com a mulher de cabelos castanhos. — Oh, me desculpe, senhora.

Sorriu um sorriso constrangido e embaraçado; deixou a caneta cair, bateu o joelho na mesa. Os olhos da Conselheira estreitaram-se por um instante, fitando os dele.

— Brian Clarke. — Ladeou a mesa e estendeu-lhe a mão.

— Encantada, Conselheira Karpax Nikolaidis. — Sorriu e devolveu-lhe o cumprimento.

— Conselheira? Oh, por favor. O Subconselheiro Willian não está, mas se a senhora quiser sentar, uma bebida, talvez... — Pareceu ainda mais atrapalhado. Parou o que tentava fazer, respirou fundo e tentou recomeçar. — O que posso fazer pela senhora?

A mulher se sentou, cruzou as pernas, repousou as mãos sobre elas, em uma pose distinta.

— Diga-me, senhor Clarke... — Fez uma pausa, piscou os olhos com uma velocidade que seria permitido acompanhar o movimento de cada cílio. — Posso lhe chamar de Brian? Acho mais íntimo.

— Claro, fique a vontade. Em que posso lhe ser útil?

— Você gosta de trabalhar aqui, Brian?

— Como assim, senhora? Aqui no gabinete do Subconselheiro?

— Isso.

— Posso lhe ser sincero? Por favor, não conte para meu chefe ou para a Conselheira Nap...

— Confie em mim, rapaz.

— Não é exatamente o que eu tinha pensado, sabe? Não reclamo do trabalho, mas cuidar que sinaleiras estão queimadas não é exatamente o que eu tinha em mente. E minha noiva e eu estamos pensando em comprar uma casa...

— Entendo. — Fez uma pausa, olhou para a tela do telefone pessoal, fingiu que digitava algo, aguardou alguns minutos, fingiu que voltava a responder. Quando julgou que o suspense estava de bom tamanho, guardou o aparelho e voltou-se a seu acompanhante. — Se você tiver interesse, eu tenho uma vaga em meu gabinete. Minha assessora está saindo da cidade para dar a luz e preciso ter alguém de minha inteira confiança. Louise me falou muito bem sobre você.

— A senhora está me chamando para trabalhar com a senhora? Diretamente?!

— Se você quiser e se achar capaz para o cargo. Tem um volume de responsabilidades muito maior, você não será assessor de um subconselheiro. Você terá que confiar em mim; muitas vezes terá que aceitar o que eu disser como lei; e manter segredo de muitos assuntos que ouvir e presenciar.

— Eu nem sei o que dizer, senhora!

— Apenas um "sim, senhora" já está bom. — Sorriu.

— Bem, sendo assim, sim, senhora! — Voltou a apertar-lhe a mão, dessa vez, contudo, com um pouco mais de força que antes, o que fez com que a mulher mandasse-o parar. — Desculpe, senhora. É uma grande honra para mim. Não vou decepciona-la! Nossa, a Jackie vai surtar!

Crônicas de Rat's Bay - Jackie AeonOnde histórias criam vida. Descubra agora