Desliguei mega irritada o computador. Eu não conseguia trabalhar direito, a empresa começou a desandar por causa de uma fofoca que fizeram de mim e eu senti como se tivesse falhado drasticamente. Caminhei pela sala tentando me acalmar, repetindo palavras que me acalmassem. Mas não ajudou em nada. Eu chorava de frustração. Não era apenas no trabalho, mas em casa também. Eu estava completamente sozinha, sem ninguém para desabafar. Mamãe ouvia um por cento das minhas palavras e depois mudava o foco para os problemas dela, minha irmã iria rir da minha cara e me chamar de incompetente, eu não tinha amigos para esse tipo de desabafo, não tinha intimidade com José e Elliot estava fora de cogitação. Ele falaria do seu jeito a mesmíssima coisa que a minha irmã.
A semana foi um borrão de reuniões, contratações, demissões e ajustes. Nem todos aceitaram bem a diminuição do salário e muito menos ser demitido. Por causa disso saíram contando mentiras sobre a nova direção e como ela pode ser injusta com você do dia para noite. Bem, o que eles queriam que eu fizesse? A galera que foi demitida ficava no celular, batendo papo e sem trabalhar direito como se recebessem para fazer aquilo. Uma chamada foi dada, duas foram dadas e na terceira já receberam a carta de demissão. A outra galera que teve o salário reduzido também ficou boladinha. Estavam achando que iam ficar pegando dinheiro digno de outras pessoas que precisam embaixo do meu nariz? Meu amor...eu não me chamo Petúnia Duques Câmara à toa.
-Já termi...por que está andando de lá para cá? Devia estar fazendo as planilhas!-Elliot entrou de repente na sala.
-Eu não consigo fazer essa droga de planilha, Elliot! Eu já tentei milhares de vezes.
-Então tente de novo. Você fica aqui dez horas por dia. Almoça aqui. Não é possível que não consiga fazer planilhas.
-Eu não consigo. Eu desisto.
-É uma criança mesmo! A empresa está caindo e você não vai lutar por ela? Que tipo de mulher é você?-Ele disse alto, fechando a porta atrás de si.-Você nunca terá sucesso em nada do que fizer se desistir por causa de uma dificuldade ridícula.-Ele olhou para mim com certo desprezo.-Que belo orgulho você deve estar dando ao seu pai.
Não deveria doer, mas doeu. Doeu muito. Depois que ele saiu, derramei mais lágrimas que considerei possível derramar. E fui para casa com os olhos tão inchados que pareciam ter sido picados por uma abelha.
***
No apartamento, pedi duas pizzas tamanho família e um Guaraná Antártica de dois litros e meio. Eu provavelmente ia me arrepender de querer comer isso tudo sozinha, mas eu estava faminta e não estava muito afim de cozinhar. Eu arrumei a cozinha, a sala, o quarto e o banheiro enquanto esperava a pizza chegar. Era muito fácil arrumar o apartamento. Eu vivia sozinha, sempre deixava tudo em ordem e ficava o dia inteiro no trabalho. O "arrumar" era passar um pano e deixar conservado até fazer a faxina semanal.
Quando a pizza chegou, o porteiro ligou e eu autorizei o rapaz a subir. Quando abri a porta para ele, peguei as duas caixas e o refrigerante, paguei-o e agradeci. Ele ficou olhando para a minha cara por uns segundos com os olhos arregalados.
-É isso o que acontece quando você trabalha mais de dez horas por dia e fica com preguiça de cozinhar.
-Pois é né. Boa janta senhora.-Ele disse meio desconfortável.
-Valeu, cara. Bom trabalho aí.
-Obrigado.
Fechei a porta e senti a água transbordando na minha boca. Sentei na sala com uma caixa, maionese e ketchup, um copo e o refrigerante. Liguei a televisão e coloquei num canal de filmes. Por ironia, ou não, estava passando um filme retratando a história de uma ginasta. Gaby Douglas. É um filme bonito pois retrata a história de uma vencedora, eu já chorei muito vendo ele. Só que dessa vez foi diferente. Enquanto eu devorava a pizza eu percebia algo que até agora eu nunca tinha percebido. Além de relatar uma história, o filme tentava passar uma mensagem grandiosa: nunca desistir. Por mais que houvessem obstáculos, por mais que fosse impossível, nós nunca deveríamos desistir. Aquilo me deixou com os pensamentos nevoados e me fez repensar na situação em que me encontrava na empresa. Eu iria desistir? Eu iria deixar todo o trabalho que estava tendo por causa de uma porcaria de planilha?
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Herdeira Legítima
RandomEu preciso saber como uma empresa funciona, como posso fazê-la lucrar horrores e crescê-la ao máximo. Se eu não conseguir isso dentro de nove meses, eu perco meus direitos como herdeira, propriedades que ganhara de meu pai e qualquer vínculo com a e...