Bebês de fralda suja

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Já no avião, Victória ficava pensando no que dizer aos empresários, ela teria que convencê-los de que os seus doces traria um ótimo retorno financeiro. A viagem não foi longa, até porque São Paulo faz fronteira com Mato Grosso do Sul. No hotel, Victória tomou banho, se trocou, com os bolos na geladeira, ela ligou a televisão para tentar se distrair, pois já sabia o endereço da empresa.
Na advocacia, Enrique chamou Nancy, a recepcionista, para pegar alguns papeis.

 - Sr. Mendonza, recebi a pouco esses convites é do aniverário do Doutor Fonseca para o fim da semana.
Ela os entrega:
- Ora, ora, Doutor Fonseca! Não posso faltar Nancy ele é um dos nossos maiores clientes e foi um dos primeiros desde que esse escritório ocupava apenas um andar. Por favor, deixe eles com a Sra. Mendonza.
- Sim, Senhor! Algo mais?
- Não, somente, obrigado!
Ao passar pelo corredor Nancy entrega o convite de Geraldo.
- Obrigado, Nancy! Já pode confirmar a minha presença e a de Helena. Enrique ja confirmou a dele?
- Não, pediu apenas pediu para que eu entregasse os convites a Sra. Mendonza.
- Ah, okay, obrigado Nancy!
Geraldo estava se perguntando porque Enrique não havia ido pessoalmente avisar sobre a festa, ele já estava estranhando o modo como ele tratava Tatiana, sabia que havia algo de errado e raro no amigo que andava mais ocupado e estressado.
Na mansão, Jerô que estava lendo um cronograma da rádio, parou elevou a cabeça para cima e pediu:
- Deus, acompanhe Victória...
Com uma caixa em forma de bandeija tampada e colorida, onde se encontrava as fatias, Victória entrou na empresa e pegou o elevador para o quinto andar. Lá ela encontrou mais duas mulheres e um homem também carregando caixas e vasilhas, ela se aproximou da recepcionista:
- Pois não?!
- Boa tarde, sou a Sra. Santisteban, vim para uma reunião com o Sr. Santos Dominguez, vou lhe apresentar os meus doces.
- Ah, sim, a Sra. pode sentar e esperar, pois essas três pessoas também vão oferecer seus doces. A Sra. é depois daquela moça de vestido verde.
- Sim, obrigada! 
Ela sentou e ficou observando os doces das outras pessoas, eles vinham em embalagens personalizadas, cada doce em uma, as pessoas carregavam uma pasta junto delas. E ela só estava com a sua bolsa, seus doces não tinham embalagens individuais personalizadas e ela carregava uma faca e guardanapos na caixa. Ela viu uma moça sair com um sorriso no rosto. Minutos depois saiu o rapaz um pouco mais sério do que havia entrado e em seguida entrou a moça de vestido verde. Instantes depois a moça saiu e mais rápido do que os demais. Não deve ter agradado muito. 
- Já pode entrar Sra. Santisteban!
- Obrigada!  Victória já tensa e tremendo um pouco, ajeitou o blazer azul que cobria a blusa branca e contrastava com a calça social preta.

 A sala era enorme, dava dois do seu quarto. Bem no meio havia um mesa extensa onde havia apenas homens velhos e um jovem. Havia quatro de um lado e três do outro, o seu Santos Dominguez com certeza era o no centro da mesa.
- Depressa Sra. Santisteban, não temos tempo a perder.
- Boa tarde a todos! Então, vou lhes servir os doces enquanto falo... Eles repararam bem na vasilhinha transparente, nas grandes fatias que ela cortava para colocar nos pratos, no tamanho do bolo e a cor do recheio.

- Os doces a La Victória são preparados com leite caipira e com a manteiga que eu mesmo faço, junto com a minha sócia Carlota em casa... 
Todos eles riram:
- Quer dizer que você os prepara em casa? Na cozinha?
- Sim... Não entendi a graça.
- Pela quantidade que a Sra.vai fornecer, vai precisar de uma cozinha industrial e mais funcionários. Disse o mais novo enquanto os mais velhos riam.

 - E como a Sra. pretende transportá-los? Pergunta um deles.
- No meu carro, ele...  Eles voltaram a rir. Victória se sentia uma palhaça, via que eles não a estavam levando a sério.

O jovem a esquerda comentou:
- Não tem como a Sra. abastecer três supermercados, isso porque falo só dos da sua cidade, carregando eles no seu carro. Os doces precisam de transportes refrigerados para não derreterem.
Um Sr. do lado direito de Santos Dominguez perguntou:
- Eu não estou vendo na sua ficha o CNPJ da empresa ou os comprovantes da vigilância sanitária.
Ela tentou erguer a cabeça e responder:
- Bem, na verdade os documentos da empresa ainda estão em andamento e não precisamos de vigilância, pois o armazém não é tão grande assim. E eu e a minha sócia deixamos tudo bem limpinho,
Um deles da ponta gritou:
- "Eu e a minha socia" parece ate que são as empregadas! As risadas foram mais altas. Victória queria enfiar a cabeça embaixo da terra, gritar com aqueles homens, mas não sabia o que dizer, pois tudo o que dizia se tornava cômico.
O senhor Santos Dominguez não falava, um homem a esquerda dele apontou para o relógio. Já haviam desperdiçado muito tempo. Todos haviam experimentado os bolos que ela serviu, entre uma risada ou outra eles limparam o prato, mas ninguém elogiou.
- Sra. Santisteban o tempo já acabou, a Sra. pode ir ,vou pensar em relação a sua empresa e em seis ou sete dias eu lhe darei a resposta. Responde Santos.
Victória ainda de pé de frente para mesa, recolheu os talheres e os pratinhos deles e os colocou dentro da caixa onde só restou alguns biscoitos.
- Obrigada, pela oportunidade Sr. Santos Dominguez.
- Boa tarde, Sra.! Alguns senhores ainda riam baixinho embora tentassem tampar com a mão no rosto. Ela estava envergonhada e desiludida. Ao sair da sala ela ouviu a recepcionista dizer ao telefone:
- Eu ainda vou sair de casa porque eu não preciso de você, eu tenho o meu dinheiro, não preciso de homem nenhum para me sustentar. Eu sozinha posso sustentar a mim e aos meus filhos!  A mulher desligou na cara da pessoa na outra linha.
Victória então se deteve ao lado dela após fechar a porta da sala de reuniões, ela se viu no lugar da moça.
A recepcionista se virou para Victória e perguntou:
- Sra. Sanristeban, está tudo bem?
Ela se lembrou das palavras de Jerô "Você é muito mais que uma dona de casa... se sentir medo de falar com eles imagine que estão todos sentados na privada". 
- Eu sou muito melhor que eles!
- Disse alguma coisa Sra.?
Victória pegou na maçaneta da sala.
- Sra. o que vai fazer? Esqueceu alguma coisa?
- Sim, a minha dignidade!
Victória entrou, deixou a caixa sobre a mesa.
- Sra. não pode entrar sem premissão, nós temos que...
De pé ela colocou as duas mãos sobre a mesa e olhou seriamente para aqueles bebês de fralda:
- Já sei, já sei que estão ocupados, fizeram questão de me recordar isso desde que entrei. Sei que não entendo nada de negócios, embalagens, termos ou transportes, mas eu estou disposta a aprender! Sou dona de casa sim, mãe de três filhos, fui casada durante 25 anos com um marido que me traiu e me deixou. Um homem por quem eu larguei uma carreira, entreguei a minha juventude, o meu futuro. Tenho 50 anos e só agora eu estou tentando conquistar o trabalho e o reconhecimento de uma vida e sabe por quê? Porque tenho que ir adiante, porque eu sei fazer alguma coisa! Eu sei fazer esses doces que vocês gostaram e comeram tudo, embora não tenham me elogiado!  Esses doces que eu aprendi com mamãe, uma receita inigualável de tanto amor. Espero que tenham saboreado muito bem cada pedacinho dele, pois eu espero que os senhores não tenham que comprar eles em outro supermercado.  Ela pegou a bolsa, deixou a caixa e apontou o dedo para o Sr. Santos Dominguez. Vou esperar o seu telefonema e eu espero que seja em breve, pois como o Sr. bem disse :"Não posso perder tempo". Mais uma vez, tenham uma boa tarde!
A recepcionista que havia ouvido tudo abriu a porta para Victória e a viu sair com a cabeça erguida. Victória ria da cara dos bebês com a fralda suja.

Ela ainda sabe amarOnde histórias criam vida. Descubra agora