Eu tentava comer em paz, mas sabia que tinha um certo alguém me vigiando no meio do mato. Eu ignorava, eu não queria mata-lo ainda, eu teria que terminar de comer para depois fazer isso.
Quando acabei com a pequena lebre, fui ao riacho lavar minhas patas e meu focinho ficando sentada na beira observando os pássaros sobre as pedras dentro do riacho cristalino. Eu suspirei quando sentir ele se sentar do meu lado observando os pássaros também, fiquei em silêncio pensando em algo para dizer a ele que o fizesse ir embora.
— Se você não for embora, eu vou ter que forçá-lo a ir — disse calma ainda com os olhos nos pássaros que pescavam os ovos de sapos no fundo da água. Eu tinha inveja da vida deles, é tão fácil ser um pássaro.
— Você é engraçada — cravei as unhas no chão disfarçando minha raiva em um suspiro longo. Depois me levantei e fui em direção a um arbusto cheio de amoras. Me sentei perto dele e comecei a retirar as pequenas amoras dos galhinhos jogando no chão na minha frente. Ele também começou a fazer o mesmo colocando no mesmo montinho que eu estava fazendo, com certeza tentando ser gentil.
— Gosta dessas frutinhas? — perguntou ele balançando a cauda e empurrando mais uma amora para meu montinho, apenas balancei a cabeça dizendo sim e depois comecei a comer silenciosamente. Ele ficou me observando me deixando tensa, então eu me virei e levei meu montinho de amoras junto comigo. Fiquei de costas para ele e terminei de comer bem rápido começando a andar novamente pela floresta procurando rastros de mais lobos por ali. Mas eu tinha que me livrar primeiro desse, só que eu encontrei algo bem mais interessante do que rastros.
Eu achei um pó amarelado no chão, e algumas cascas de pinhas, eu sabia que aquela mulher estava por aí em algum lugar.
— É ela... Está me procurando — ele disse ao meu lado com medo olhando para o pó amarelado junto comigo pensativo e ao mesmo tempo ficando irritado.
— Manske... Tem uma raposa na sua frente... Não se mexa! — nós dois nos encolhemos quando ouvimos essa voz masculina e assustadora. Olhamos para cima juntos e avistamos um ser estranho de aparência bizarra em cima de uma árvore andando sobre um galho grosso que o sustentava. Era um garoto de cabelos bem pretos e roupas estranhas rasgadas, parecia um monte de pano cortado até se forma um tipo de casaco grande que ia até seus joelhos, sua calça era algo que chamou minha atenção por não ver nenhum humano usando esse tipo de vestimenta. Tinha furos e era decorada com remendas em todos os lugares. Ele olhou para nós e eu me hipnotizei nos seus olhos amarelos vivo, quase como se tivessem luz própria. Ele era oque?
— Eu só estava... — Manske se encolheu ainda mais atrás de mim abaixando suas orelhas tentando explicar algo que eu nem sabia para o garoto estranho, mas foi interrompido.
— Silêncio, traidor... E quem é você, raposinha? — ele sorriu pra mim gentilmente chegando a ser assustador, veio se curvando na minha direção e parou a centímetros de mim esperando minha resposta com as sobrancelhas levantadas.
— E-eu sou Libby... — falei com as orelhas abaixadas colocando minha cauda entre as pernas denunciando que eu estava com medo desse humano extremamente esquisito.
— Meu nome é Nagel Reinholz, braço direito da princesa da floresta de Moroe Lattifa Muerer — ele sorria orgulhosamente me contando isso que não me interessava nenhum pouco.
— Felizmente você senhorita está com sorte hoje — falou me olhando de cima a baixo colocando uma mão embaixo do queixo se afastando um pouco de mim.
— Posso saber porquê? — perguntei meio insegura olhando para Manske que se mantinha calado com as orelhas baixas e o olhar triste para o chão, depois voltei a encarar ele que ainda sorria pra mim.
— Está convidada a ir em nosso reino falar pessoalmente com nossa princesa — ele dizia isso empolgado até demais me deixando ainda mais confusa, eu não fazia ideia de quem ele era mesmo depois de ter se apresentado. Agora quer me levar para conhecer aquela mulher arrogante e mal educada?
— Eu... — tentei pensar em alguma resposta mas ele bateu palmas me calando e se virando na direção de uma trilha que por acaso surgiu ali sem eu perceber.
— Vamos, vamos que estamos atrasados e Manske... Bom trabalho recrutando uma raposa — ele disse sorrindo para Manske atrás de mim que caminhava junto com a gente ainda calado de orelhas abaixadas. Não entendi porque ele estava triste, mas também não entendi porque esse Nagel disse isso para ele. Como assim ele me recrutou?— . —
Chegamos em um tipo de vila muito peculiar escondida no coração da floresta Moroe. Andávamos em uma rua estreita com passagem constante de pessoas estranhas, algumas tinham caudas e orelhas aparecendo. Se vestiam de uma forma engraçada e diferente dos humanos. Eram bem educadas dando bom dias a todos nós não estranhando nossas formas. Achavam normal uma raposa e um lobo andando por aí? Eles não são humanos... Eu tenho certeza.
Nagel nos guiou até a entrada de um enorme castelo bem protegido com guardas ao lado do portão que se abriu com muita dificuldade por causa do seu peso, lá dentro a primeira coisa que vi, foi um jardim bem grande ocupando metade da área aberta que tinha antes da verdadeira entrada do castelo. Eu fiquei encantada vendo tantas borboletas abelhas em um lugar só, andei meio abobada até perceber que eu estava pisando em algum tipo de solo diferente. Minhas unhas faziam barulhos engraçados naquele piso marrom avermelhado na sala, tinha quadros lindos em todos os cantos das paredes cor de areia. Em frente, um trono vazio iluminado por uma janela no teto, o vidro era decorado, tinha várias tonalidades e todas elas formavam um lindo desenho de um lobo com as cores que imitavam um céu.
— Por aqui, raposinha — Nagel abriu uma porta no corredor me deixando curiosa, mas ele deixou apenas uma brecha, depois se retirou levando Manske com ele.
Ficou tudo em silêncio, eu ouvia um som agudo e musical vindo do lado de dentro daquele quarto. Suspirei meio em dúvida de abrir e entrar, mas fiz isso de uma vez me maravilhando quando vi um outro jardim dentro daquele espaço que pensei que era pequeno. Tinha mais flores e era mais colorido ainda, animais de todas as espécies esculpidos e posicionados no gramado dando a impressão de que eram reais, pássaros voando para todos os lados e mais borboletas ainda. Eu fiquei parada no meio daquilo tudo sem perceber que havia uma mulher na minha frente sorrindo pra mim. Ela estava vestindo um vestido branco com uma fita azulada na cintura e uma prendendo seu cabelo castanho mel, nas suas mãos tinha vários saquinhos de sementes e ela me chamou com um gesto para que me juntasse a ela em frente a um pequeno laguinho com peixes pequenos.
— Você é de Moroe, certo? — ela perguntou com uma voz doce quase me deixando com sono. Eu respondi balançando minha cabeça e sorrindo também meio desajeitada e tímida.
— E por acaso gostaria de viver aqui comigo neste castelo? — ela sorriu ainda mais levantando sua cabeça para olhar pra mim. Eu estava surpresa e sem reação com oque ela acabou de dizer, perguntou se eu gostaria de morar em um lugar incrível como este? Comparando com minha toca, ela parece um buraco de camundongo agora.
— Mas eu... Como? — perguntei confusa me sentando ali com cuidado. Fiquei observando ela retirar um pouco da água do riacho e colocando duas sementes alaranjadas dentro da pequena cuia marrom. Depois pegou um galho com a ponta arredondada e começou a moer as sementes lá dentro até que a água se tornou um suco laranja fraco.
— Tome isto, eu levarei você até seu quarto para descansar da viagem longa que fez até aqui — falou ainda usando sua voz macia e suave colocando a cuia no chão para que eu tomasse aquele suco laranja.
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A raposa Solitária.
FantasiLibby, uma raposa que cresceu sem os pais ou qualquer outro membro da sua família para cuidar dela. Teve o desprazer de assistir sua família sendo levada por caçadores, aprendeu a viver sozinha na floresta cuidando de si mesma. Anos depois se tornou...