Queima de arquivo em Bouganville

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Ela vinha andando devagar como sempre, olhava para os lados como se o ambiente pacato confirmassem que as coisas haviam ficado tranquilas.

Era bom andar sobre o início da tarde, a tirava das lembranças sombrias que haviam tomado conta do seu lar.

A decepção do marido e como ele a rejeitava por não conseguir cumprir a promessa de dá-lo um filho.

Em pensar que por três vezes esteve tão perto, a morte do vizinho a fez lembrar que aquela cidade era uma terra maldita.

E jamais havia saido dali.

O peso que o corpo carrega com a chegada da idade não era nada perto do que a alma daquela mulher havia sofrido.

Pensou em pela primeira vez desafiar as regras, seus ouvidos ao envelhecer ficaram mais afiados.

Mas ainda aquela tarde era um grande alívio desde a grande briga, parece que estavam se acalmando aos poucos.

Ao redor apenas algumas ruas em Bouganville eram tão desmatadas quanto a dela.

Além de não serem asfaltadas as estradas ao redor tinham imensas propriedades de cerca, onde um mato curto virava alimento para os poucos fazendeiros que criavam gado.

Ao inicio tarde a rua ficava quase deserta pelo sol forte e falta de sombra.

Ela descia lentamente quando percebeu um carro parado logo a frente, atrás de si uma voz familiar gritou seu nome, ela escutou olhando para trás.

- Aquele rosto tomado por fúria, e ela não teve dúvidas, era o assassino.

Começou a correr com enorme dificuldade, e aos poucos as sacolas ficaram pelo caminho, dando uma trilha a ser seguida por seu carrasco.

Viu um carro mas estava vazio, não haveria como pedir socorro ali, o assassino andava a passos firmes mas não corria.

Ela que tinha a disposição de maratonistas para rodas de fofoca, era apenas uma retardatária para salvar a própria vida.

Mas havia uma esperança.

Como um anjo aparecendo do nada, um outro carro estava estacionado na primeira rua em que virou, correndo desajeitada .

Ela se aproximou, sem tempo para cortesias.

Testou a porta de passageiros e por sorte estava aberta

- Socorro, o assassino!!! O homem abriu rapidamente a porta do passageiro pra que ela entrasse.

0s olhos do homem eram muito diferentes de um querubim que veio em socorro, ao contrário.

Olhos mal humorados a olhavam com desconfiança e insatisfação.

- O que está acontecendo?!

Por mais que tentasse falar, a mistura de desespero, felicidade por vê-lo e o esforço físico que teve que fazer.

Respiru fundo antes de responder.

Mas quando ia finalmente explicar o que aconteceu, duas mãos socaram o vidro do carro com toda força.

Pelo desepero o homem percebeu e ligou o carro na mesma hora arrancando dali.

O veículo virou a esquina deixando o assassino pra trás, Carmen entrou num desespero misturado com alívio, mal conseguia falar, mas o homem queria respostas.

- Porque você está correndo daquela pessoa? Diga-me.

- Porque ela quer me matar, disse a senhora.

- Mas quer lhe matar porque?

Enquanto ela tentava escolher as palavras, uma imagem apareceu no seu retrovisor, o carro antes estacionado pelo visto era do assassino, e ganhava velocidade tão rápido quanto se aproximava deles.

- Eu não vou me meter em encrenca por sua causa, ou você me diz o que aconteceu ou vou te deixar aqui. Disse ele.

Ela não queria se intrometer mais naquela história, mas não tinha escolha, o perseguidor estava muito perto e precisaria confiar naquele homem se quisesse escapar, além do mais ele agora também era uma testemunha e poderia ajudar a mantê-lo fora de ação.

-Tudo bem eu tenho motivos pra acreditar que essa pessoa é a mesma que assassinou o homem do armazém e pelo visto até o filho do prefeito, meu Deus como poderia alguém matar...

- Você viu, você tem certeza, falou com o delegado, perguntava o homem enquanto o assassino chegava mais e mais próximo.

- Vamos me diga, me diga.

- Não, não falei, não queria me meter nisso, mas agora não tenho mais saída, nos leve para delegacia por favor.

O homem se virou entrando em ruas enquanto o assassino ficava para trás, e logo lhe viera o alívio.

Por sorte o homem guiava em silêncio, agora entendia o porque daquilo tudo.

Antes era apenas uma mulher humilhada, com tantos úteros um homem escolher uma mulher infértil, era inaceitável.

Mas seu marido era um homem honrado.

Sustentou uma relação de três partos, e três falhas.

Como uma mulher infertil poderia levar três gravidezes ao parto. Se perguntava todos os dias, a todos os momentos.

Mas talvez hoje não.

Porque o assassino estaria a sua procura? Porque os desaparecimentos?

Toda essa circunstancia a fazia pensar que no fundo, no fundo.

Talvez fosse apenas mais uma vitima.

  Considerar aquele lugar como maldito era apenas uma constatação.

Pensou que seria o momento de sua libertação moral.

Mas sem perceber o perseguidor aparecia novamente no retrovisor.

Ela saculeijou o homem que permanecia imóvel enquanto o carro se aproximava.

Ela olhou a estrada ao redor percebendo que estavam longe da cidade, tinham pegado uma estrada mais rural ainda, o homem havia se acalmado, o perseguidor acelerou e os ultrapassou atravessando o carro na frente deles.

Quando parou o carro e os dois observavam enquanto o assassino descia.

Ela gritou apavoradamente para que ele desse marcha ré, e quando se assustou com o carrasco socando novamente o vidro do carro.

De repente duas mãos lhe deram uma gravata , o homem que estava no carro não era seu herói ou querubim, era cúmplice do assassino e aquilo era uma emboscada.

  Enquanto perdia a memória Carmen escutou a conversa dos dois.

- Felizmente ela não contou nada a ninguém, disse ele.

- Pode deixar que eu me encarrego de fazer o silêncio dela ser eterno.

-Ah e parabéns Marconi, você realmente é um homem a frente do seu tempo.

O corte no pescoço não permitiu que Carmen percebesse que ironicamente a primeira que  deixou Bouganville foi justamente na morte.

Revolução ou CriseOnde histórias criam vida. Descubra agora