Conversa.

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Desculpa se iludi tu que tá bem aí, mas hoje eu só quero conversar pra desabafar umas coisa que tão matutando na minha cabeça!

Eu sempre fui uma menina muito leve. Meus pais sempre priorizaram minha felicidade antes de qualquer coisa. Prova maior foi terem visto que meu lugar num ia de ser advogando e por isso concordaram em me deixar ir pra Sampa atrás de treatralizar minha curta existência nesse mundo gigante.

Então voei do meu ninho e aportei no cais da cidade de pedra. Não faz sentido, mas não precisa de sentido, só valeu ter vivido tudo mesmo. Enquanto tudo isso ia se fazendo com minha história, Ana ganhava cada vez mais lugar em cada capítulo da vida escrito por mim.

Gravamos covers, passamos períodos distantes uma da outra, nos falávamos por telefone, quando a gente se encontrava era uma alegria que não cabia no peito. Depois veio Felipe em nossas vidas, Ana teve que sair do curso de Medicina pra vir pra Sampa seguir nosso sonho. Tanta coisa que sou grata, sabe? Cresci tanto nesse tempo que vivemos esse sonho. E não foi um crescimento individual, foi coletivo! Cresci sozinha, cresci como duo, cresci como FSimas, como filha, irmã, amiga e amante... Não amante de uma pessoa, eu sou amante da vida!

Esses dias eu tava pensando nas coisas bunita que já pude ver e viver e aí G de Melo (lê-se com sutaque nórdextinu), me manda uma mensagem perguntando se pudia me ligar. Eu tava sozinha em casa, mas mesmo que num tivesse teria dito que sim, já que num imaginava de jeito nenhum o que Gabi tinha pra me dizer. Depois de uns segundin ela me ligou:

– Vit, tá boa, meu amor? – Sorri. Gabi era leve que nem eu. Sabia que amor tinha que ser leve também e que as diferenças são a beleza e o motivo do mundo ainda ser mundo.

– Oi minha plincesinha, aconteceu alguma coisa?

– Mulher, é o seguinte... Eu preciso ver tu quanto antes. Tô preocupada com uns negoço de Ana Clara. Ela tá com Mike, né? – Revirei os olhos só de lembrar da princesa e do príncipe do castelo encantado.
 
– Tá, Gabi! E só deve voltar no dia do show de Salvador... – Eu tava vendo a hora Mike construir uma escala de avião na casa dele, só pra Ana ir dos shows direto pra lá de novo.

– Pois bora se ver, pessoa? Vem aqui pra casa que eu quero fazer um Ratatouille pro jantar. – Sorri com a proposta, Gabi era biruta da cabeça.

– Mulher! Te orienta, que ainda num é nem hora de almoço e tu já tá pensando na janta?  – A ouvi rir e ri junto. Eu sentia falta de poder me reunir com meus amigos, então achei que a ideia não seria nada má. – Eu vou, amiga. Só preciso ligar pra Ana, pegar uma muda de roupa e desço pra tuas bandas. Aí aproveito e conheço teu lugarzin novo!

– Tá bom, Vi. Só vem, que eu tô cheia de coisa pra te dizer!

– Vish, Maria! Então vou correr porque tu me deixou curiosinha! – Rimos juntas de novo e desligamos.

Como ainda era 09:15, achei melhor arrumar tudo logo pra poder ligar pra Ana, e quando desligasse já pegar o caminho da casa de Gabi. Quando tudo tava pronto e as poucas bagunças que eu tinha feito na casa já estavam arrumadas, peguei o celular pra ligar pra Ana:

– Oi, Vitória! – Uma palavra que definia Ana comigo naquela semana era "finesa".

– Opa, Amargarida! Turu bom contigo? – Ri do trocadilho e mordi o lábio na esperança de Ana rir também. Ela não riu...

– Oi. Algum problema?

– Crêem Deus pai, que bicho que mordeu tu por aí?... Liguei só pra saber se tu tá bem e se vem hoje. – Eu já entendi que ela mudou depois que começou a namorar com Mike, mas ser tão seca comigo era novidade.

– Nenhum, ora. Vou hoje não, só chego em casa amanhã! Agora tenho que desligar, vou correr com Mike e Bianca. Tchau, Vi!

– Tchau, Ana Clara!

Me doía demais ver toda aquela indiferença. Podia ser um modo de defesa que ela criou, podia ser fase, podiam ser mil e uma coisas e eu nunca ia saber. Depois daquela conversa/briga que tivemos, nunca mais Ana tentou voltar ao assunto. A gente até se beijou em Paris, mas isso eu conto depois.

A Ana de agora era uma pessoa prática e objetiva comigo. Tava sumida das coisa, era superficial, não ria como antes quando aparecia nas redes sociais da gente. E eu como resposta só vivi no meu canto.

Ela tinha criado a mania feia de ficar me evitando, me cortando, não correspondia a nenhum carinho meu, seja publicamente ou não. E eu feito uma boba metida a apaixonada, acabava por sempre fazer carinho, vigiar o sono dela de manhã, mas nada disso ela via. Resmungava feito uma velha chata! A nossa interação era só pelo instastorie e alguma coisa do duo. Virou mecânica, marketing, gancho pra ganhar mídia. E eu achei que Ana e Mike é que significavam isso... Mas isso também fica pra depois, tá?

Quando cheguei em Gabi, percebi o tumulto no apartamento e quando entrei vi que era a Terceira Guerra Mundial pra instalar um fogão. Assim que me viu ela veio me abraçar e quando disse a Léo para ficar ali resolvendo as coisas, me arrastou pro quarto dela e me sentou na cama  como se eu fosse uma criança prestes a ouvir que os seus pais vão se separar.

– Vai, G, fala logo!

– Ana veio falar de tu comigo! – Enquanto disse isso ela me olhava nos olhos de cabeça baixa, como que analisando minha reação.

– Oxe, conversa! Ela nem comigo fala direito, ia falar o que de mim pra tu?  – Ela demorou um pouco e vi que era uma forma de procurar jeito pra falar.

– Ela sente tua falta, Vitória!

– Mas se ela sente, então que venha onde eu tô e me fale, ora! Dá pra entender Ninha não. Hora me quer, hora quer outro. Foge de mim e me grita, mas num sai de mim. Fica nesse jogo eterno de bate e alisa. Isso desgasta!

– E tu acha mermo que eu tô do lado de Ana? Tu já tinha me dito que ela tinha mudado, mas eu num sabia que era tanto!

– Eu tô de num aguentar mais viver com Ana, amiga. Ela num é mais nem de perto o que era antes. E não que precisasse ser, mas a gente não tem mais o brilho que tinha antes. Eu penso em desistir, mas sempre que tento ela me puxa de volta, só que não quer ficar pra me ter.

Ana queria ser pássaro e me fazer de Ninho. Ela só não via que eu também voava sempre que queria, pássaro que cresce solto não vive se alguém prender. Já Ana era um Canarinho. Pássaro cantante que sofre em silêncio, um dia deixa de agir e morre por não se deixar sentir o que o peito pede pra se cantar... E a música de nós naquele momento era a que outra Ana tinha dado vida e jogado pro mundo.

Se eu disser que já não sinto nada
Que estrada sem você é mais segura
Eu sei, você vai rir da minha cara
Eu já conheço o teu sorriso
Leio o tu olhar
Teu sorriso é só disfarce
E eu já nem preciso... 🎵

Incerteza.Onde histórias criam vida. Descubra agora