Uma cidade com passado sombrio e segredos que perduram para sempre, essa é Hidden Shadows, palco de experimentos e planos dos quais seus moradores sequer desconfiam.
Dylan, filho da família responsável por toda a cidade, governando nas sombras...
Virei para o lado e tateei o criado-mudo a procura do meu celular, logo sentindo a superfície lisa e fria sobre a madeira. Liguei a luz do visor. Hayden não estava mais na cama. Sussurrei seu nome com calma, repentinamente apreensivo. Era meio assustador, sequer sentira-o levantar. Escutei o som da porta ao ser aberta e fechada, mas não sabia dizer qual das portas sofrera a ação. Meus pés descalços tocaram o chão, o que para mim era um alívio, já que assim quase não faria ruídos ao caminhar. Todos os meus sentidos estavam em alerta. Liguei a lanterna do celular e a usei para encontrar a porta do quarto, constatando que estava fechada como antes, mas fui até ela e forcei a abertura, atestando se ainda estava trancada. De fato estava.
Um som surdo e líquido fez minha pele gelar, e me achei extremamente ridículo por isso. Era muito claro que se tratava de pingos d'água caídos de uma torneira, daqueles que se libertam a cada dois minutos, caem como de um precipício para o mármore liso e, se derem sorte, deslizam até o buraco negro antes de secarem ali mesmo. Entretanto, no silêncio obscuro em que estava, cada gota derramada ecoava em meus ouvidos como um puro alarde, compondo a melodia tensa na qual me sentia inserido.
Dirigi a luz do celular para o banheiro, a porta estava aberta, e não havia sinais de qualquer pessoa do lado de dentro. De repente, de detrás da madeira, Hayden saiu semicerrando os olhos em reclamação a luz que recaía diretamente sobre ele. Expirei com precisão. Estava sendo estúpido, comportando-me como se fizesse parte de um filme de terror. Em que estava pensando? Talvez com tudo o que andava acontecendo minha reação não fosse tão ridícula, no fim das contas as pessoas podem ser tão assustadoras quanto os "monstros" das histórias. Felizmente, naquele momento, era apenas Hayden.
— O que você está fazendo? – ele perguntou em um murmúrio quase irritado.
— O que você está fazendo? – rebati, direcionando a lanterna para o outro lado.
— Ah – escutei Hayden suspirar. – Não se preocupe. Já tentou falar com a segurança?
Que ridículo. Não, eu nem me atentara para isso. Sem responder apenas chamei o número pelo telefone em minha mão. Um toque sem fim pôde ser ouvido. Abri a gaveta e peguei o aparelho com um único botão que, em pouco tempo, colocaria parte dos meus guardas naquele lugar. Segurei-o firme na outra mão, observando o revólver guardado no mesmo compartimento. O peguei.
— Vamos ver o que está acontecendo – Hayden abriu a porta do quarto e saiu, sem se importar com a ausência de luz.
O segui, e não havia uma pessoa sequer no corredor, o que me parecia estranho. Fechei a porta em nossas costas e a tranquei, certo de que, na situação em que nos encontrávamos, esta era a melhor escolha. Passos rápidos chamaram minha atenção, e com urgência iluminei a extensão do corredor. Uma jovem garota corria, seu rosto transparecia medo, ela não parecia pensar em mais nada além da necessidade de sair daquele lugar. Antes que eu pudesse pensar em algo Hayden a segurou.
— Me solte – ela gritou, quase choramingando. Parecia ter por volta dos dezesseis anos –, me deixe ir.
— O que aconteceu? – a voz de Hayden soou calma e complacente.
— Eles estão pra lá, no fim do corredor – a jovem respondeu. – Eu não sei quem são, mas tinha sangue, uma mulher morta – ela balançou a cabeça. – Não vi muito bem, eu só... corri.
Hayden olhou para mim e assenti. Era estranho, claro que era. Dadas as circunstâncias tinha uma grande probabilidade de o hotel ter sido invadido, e maior ainda eram as chances de, quem quer que fosse, estarem procurando a mim... ou a Marli. Não sabia se acreditava no que ela dizia. Tudo aquilo podia ser uma armadilha.
— Eu vou dar uma olhada – Hayden soltou a garota, que naquela altura já parecia mais calma, e ligou uma lanterna que eu nem sabia existir, apontando para o caminho que se estendia.
— Tome cuidado – o alertei, sem saber se devia mesmo deixá-lo ir sozinho, mesmo que só por alguns passos.
Ele assentiu. A garota ficou parada ao meu lado, olhando assustada em sua direção e, assim como eu, observando-o caminhar até onde a luz de minha lanterna podia alcançar. Em segundos tudo o que via era sua silhueta contornada pela luz que ele mesmo segurava, e em um piscar de olhos Hayden sumiu na escuridão. Cerca de dez segundos se passaram. Eu não via mais nada, não escutava nada. Chamei por seu nome, mas não obtive resposta.
Coloquei meu telefone para a outra direção, vendo o restante do caminho, que levava ao início do corredor. Do lado esquerdo havia um elevador, o que não ajudaria, e do outro lado vi a porta para uma escada de emergência. Não estava longe.
— Vá embora – orientei a menina que me seguia com os olhos. – Tome cuidado e se guie pelas paredes quando chegar a escada. Vou iluminar seu caminho até a porta.
Ela concordou com a cabeça e agradeceu com uma voz saída do fundo da garganta e engasgada no caminho. Assim como falei fiz, observando até o momento em que a moça abriu a porta e saiu. Voltei minha atenção para o corredor e engoli em seco. Chamei por Hayden mais uma vez, esperançoso por sua volta. Nada.
Confiando nos instintos que naquela hora já me faziam suar, apertei o botão na pequena caixa preta que segurava, e assim que a luz vermelha oscilou no canto a joguei no chão, posicionando meus dedos livres na arma de fogo. Dessa forma segui caminhando. Apontando a luz para o corredor, e com a outra mão mantive o revólver pronto para imprevistos. Portas e mais portas, aproximava-me da esquina e nem sinal do meu guarda-costas.
Virei o corredor, e com um baque surdo pelo lado esquerdo, não pude perceber mais nada.
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— Vamos lá, acorde – senti um cano frio empurrar levemente o meu rosto, facilmente fazendo-o pender para o outro lado.
Abri os olhos devagar, e tudo o que consegui ver – de um jeito muito embaçado – foi a luz amarelada que parecia preencher todo o lugar. Tentei piscar algumas vezes para focar a visão, e aos poucos consegui distinguir alguns componentes ao meu redor. Meus sentidos começaram a despertar e mexi os braços com alarde. Eu estava amarrado. Sentado em uma cadeira com os braços amarrados nas costas. Havia aproximadamente cinco pessoas na sala, cinco homens de terno, foi o que comecei a perceber. A luz amarela estava apontada em minha direção, e foi essa luz que traçou a silhueta que lentamente começou a se revelar.
— Está tudo bem – aquela odiosa voz ressoou e fez eco em meus sentidos ainda um pouco adormecidos. Eu sentia o suor escorrer em minha testa. Ela riu. – Vai ficar tudo bem, querido. Acorde – e mesmo com a visão embaçada eu pude reconhecê-la, e a percepção de sua presença me fez despertar com muita urgência, fazendo meu sangue ferver. Ela sentou em uma cadeira frente a minha e tocou minha perna com os dedos do pé. – Vamos, acorde. – Abri bem os olhos e forcei minha visão, encarando o sorriso cínico que parecia permanentemente estampado nos lábios de Lila.