Quando acordei fiquei estático sobre a cama por alguns poucos – mas longos – minutos, encarando o teto que parecia estranhamente claro, uma luz calma que preenchia o recinto. Tudo em que pensei naquele momento foi que o sábado finalmente havia chegado, teria dois dias de descanso, não devia, mas fazia questão de ter esse tempo para mim, não importava o que os outros iriam dizer. Levantei e sai para o corredor, esfregando os olhos enquanto caminhava por instinto. Assim que cheguei a sala passei os olhos até a mesa e os arregalei com o que vi.
— Hayden? – balbuciei confuso por infinitos segundos.
— Bom dia – ele olhou para mim e enfiou o garfo na boca.
— O que... – franzi o cenho. Ia perguntar o que Hayden fazia ali, mas parei. Sim, eu havia esquecido de dispensá-lo. Quer dizer, ele não precisava ficar no apartamento o fim de semana inteiro. Eu não queria isso. O que faria preso com ele durante dois dias? – Se quiser, você pode sair. Apenas fique atento ao celular, mas não precisa ficar preso aqui por todo o fim de semana.
— Tudo bem – ele assentiu.
Sentei a mesa para comer e não consegui digerir mais que um pão e um copo de suco, mantendo os olhos fixos nas mãos enquanto o silêncio nos consumia. Era sempre assim.
Após comer fui para o quarto e tomei um longo banho. Peguei meu notebook e o levei para a mesa, mexendo em redes sociais nas quais a tempos não entrava e sequer me interessava, queria apenas passar o tempo. Tão logo acessei o rosto de Lila saltou em minha frente, aquele rosto falso e sorridente. Como ela continua em contato comigo? Aquela mulher era um demônio! Fazia questão de esfregar-se na minha cara. Então era verdade, tinha se casado com aquele homem, com certeza por interesse. Fechei o computador em um impulso de raiva e o levei de volta para o quarto. Decidi então fazer uso de uma sala que não solicitara mas que havia sido providenciada por Willam. Profissional como sempre.
Abri a porta do escritório que só não começava a acumular poeira por ter uma doméstica que cuidava da casa em minha ausência. Passei os dedos pelas lombadas na estante de madeira escura, observando os títulos que em nada combinavam com meu gosto. Não que eu fosse grande amante de livros, mas clássicos românticos eram tudo o que menos queria folhear, quem dirá poesias! Bufei e sentei na cadeira macia por trás da mesa, relaxando e fitando o teto pouco claro. Com as cortinas fechadas aquele era um ótimo lugar para pensar e relaxar. Alguém bateu a porta, só podia ser Hayden. Pedi que entrasse.
— Eu vou sair, tudo bem para o senhor? Preciso resolver alguns problemas deixados com minha ausência – disse.
— Já disse que pode sair – respondi com calma – Vá.
O vi deixar a sala e suspirei aliviado. Ao menos não teria que vê-lo a todo instante, e com sorte Hayden teria compromissos suficientes para afastá-lo por longas horas. Talvez voltasse apenas para dormir. Sorri com a ideia. Já estava me acostumando com o que acontecera e se sucedia, seguindo em frente. Era o que pensava. Tudo estava normal. Normal demais.
Dei um pulo na cadeira e encarei o feixe de luz que recaía sobre a porta, um tom azul pouco escuro e assustador. Não é possível! Estaria tão cansado a ponto de dormir por quase um dia inteiro? Com certeza! A tarde já se encerrava e havia um buraco extenso em meu estômago. Precisava comer alguma coisa, foi esta minha missão. Saí direto para a cozinha.
Não havia muita "comida de verdade" na geladeira, visto que almoçávamos e jantávamos em restaurantes ou pedíamos comida, portanto acabei me contentando com dois sanduiches, suco, e frutas estocadas. Pelo menos não estaria mais com fome.
Assim que saciei minha necessidade básica fui ao quarto e sentei em frente à janela, observando a tarde que se encerrava. Olhei para o notebook ao lado e o abri. Ele hibernara naquela página detestável. Fechei-a com raiva e fiquei encarando a tela clara. Abri o navegador mais uma vez e digitei "Agência Sullivan" no campo de busca. Não que eu fosse o homem mais informado ou com mais contatos na rede, mas sabia ao menos realizar funções e pesquisas simples quando precisava ou queria. O site era simples e monocromático, a apresentação era sucinta e transparecia profissionalismo e mistério. A agência inglesa conseguia, com apenas um site, demonstrar seu nível no mercado. Sorri. Fazia todo sentido que Hayden fosse de um lugar assim. Balancei a cabeça, não era hora de pensar nisso. Vi rapidamente quando o céu escurecia de vez e desliguei meu computador, seguindo para o banho. Dormira o dia todo, estava descansado e via a hora de aproveitar meu tempo de folga. O sabor do álcool conseguia ser muito diferente longe de casa, tinha gosto de liberdade.

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Toque
RomansaUma cidade com passado sombrio e segredos que perduram para sempre, essa é Hidden Shadows, palco de experimentos e planos dos quais seus moradores sequer desconfiam. Dylan, filho da família responsável por toda a cidade, governando nas sombras...