XVII

29 7 8
                                    

(Sugiro ler com a  música disponível na mídia acima)


A frio da neblina deixa minha pele irritada, esfrego os tornozelos incomodada. Afundo a mão direita entre meus fios embolados coçando a cabeça, um pouco zonza. Pisco algumas vezes tentando me situar e respiro fundo. O ar gélido arranha minha garganta, é horrível. Demora um pouco até que me situe do que esta acontecendo. Onde estou? No meio da floresta. O dia ainda não amanheceu completamente já que passa pouca luz em meio a copa das árvores, o suficiente para ver os grandes troncos a minha volta. A terra seca arranha meus pés descalços. Apesar de minha lerdeza matinal sei que algo esta errado, eu não deveria estar. Por inúmeros motivos.

Ao tempo que meus olhos conseguiam fixar a minha volta indagações cresciam na minha cabeça.

Como havia parado ali?

Por que estava ali?

E o mais importante.

Por que não estava correndo para longe neste exato momento?

Cruzo os braços a frente do corpo, esta frio demais para deixar o casarão sem um bom casaco. Olho para trás, conhecia o caminho, mas meus pés não seguem meu comando. É como se estivesse sendo tragado a seguir em frente. Não há como lutar contra isso. Desvio dos troncos e tento pisar nos lugares mais limpos, afinal estava com os pés nus. A floresta esta quieta, a neblina impede que eu enxergue mais que dois metros no perímetro a minha volta, é quase como andar sem um destino. O gorjear melancólico do pássaro de penas cintilantes ecoa a minha volta, ele me acompanhava desde que havia começado a me mover. Talvez fosse um presságio, um agouro. Um aviso o qual meus ouvidos teimosos não ouviam. Paro com o barulho de folhas, olho para trás, os lados, mas nada vejo. Sigo em frente, ou talvez em círculos, considerando meu péssimo senso de direção.

Os raios do sol ganham uma tonalidade cinza ao descer no pequeno espaço entre as folhas verdes. Parece uma luz divina. Estico a mão sob a luminescência vendo meus dedos ganharem um tom cintilante. É mágico.

Algo toca minha espinha dorsal, como um empurrão sutil me alavancando. Desvio de um bolso de galhos finos. O canto do pássaro volume, ele voa a minha frente parecendo atordoado. O bater das suas asas se mistura com seu gorjear até que a pobre ave cai sem vida no chão. Me abaixo tocando suas penas macias, ele não se move, pelo contrário, parece empalhado.

Uma lufada de ar pujante desce da copa das árvores sobre mim, afastando toda neblina em um raio de tamanha proporção que já não vejo mais qualquer resquício da fumaça gélida. Solto o passara preto dando passos para trás. É como se tivesse acordado e só agora estivesse me dando conta de que aquilo não era um sonho comum. E talvez não fosse um sonho mesmo.

Meus pés se embolam, envoltos em raízes invisíveis que me fazem cair de costas, minha cabeça dói. Apoio os cotovelos no chão erguendo o dorso. Meus olhos curiosos olham envolta até encontrarem o que não deveriam. Acima da minha cabeça. Pelo menos três metros no ar estava um corpo. Uma garota com uma corda envolta em sua pescoço.

Ela é cinza, como uma fotografia velha. Uma camisola longa e suja envolve sua silhueta, não consigo ver muito bem seu rosto, mas agradeço por isso. Estou muda, assutada. Com dificuldade eu me levanto, não consigo retirar os olhos daquela figura grotesca. Só quero ir embora.

Um, Dois. Três passos.

Consigo senti-la. Levo as mãos ao pescoço, o ar me falta e parece que vou morrer. Estou morrendo. Meus joelhos batem com tudo no chão. Tão rápido quanto a sensação veio, ela se vai. Estou sendo observada.

Página Vinte SeisOnde histórias criam vida. Descubra agora