XIX.

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    Como todo internato para jovens especiais Chermont também recebia ajuda do governo local e contribuições do empresários, sem contar o pagamento que os pais e familiares de todos faziam todo mês, por mais que houvesse uma bondade genuína nos corações dos administradores do local nenhum de nós estava ali de graça. O que despertava algumas de minhas questões como por exemplo o fato daquele lugar parecer estar prestes a cair sob nossas cabeças a qualquer momento, desde que tinha chegado ali não via sequer uma pequena reforma no chão que rangia em cada passo e muito menos uma cobertura nova naquelas paredes bolorentas por um papel colorido de péssimo gosto. Era de fato muito curioso imaginar o montante de dinheiro que era recebido mas parecia não ser repassado. Poderíamos estar bem mais confortáveis ou talvez fosse exatamente aquela a ideia, nos punir em um lugar que realmente parecia a sala de entrada de um purgatório.

   Assim como as questões sobre a falta de estrutura tentava entender por que estava carregando caixas com objetos de decoração ao salão principal, era final de outubro e chegava aos meus ouvidos que teríamos uma linda festa de Halloween no dia seguinte, não havia nada demais em uma festinha, na verdade eu gostava bastante da ideia, mas o que me deixava intrigada era o fato das freiras que cuidavam do lugar não terem intervido ou melhor, estarem apoiando uma festa que tecnicamente faz culto a monstros e as vezes até mesmo o diabo. Aquilo pairou na minha cabeça por um bom tempo enquanto retirava a decoração das caixas passando ao grupo que tinha me juntado no salão.

    Desconstruindo tudo que estava martelando em minha mente freira Martha atravessou o salão segurando bandeirolas em roxo e laranja enquanto cantarolava Purple Rain em plenos pulmões, já havia notado que ela era uma grande fã de Prince desde o dia em que a peguei ouvindo em um radiozinho velho os grandes sucessos do cantor. Ela era uma mulher boa apesar da pose autoritária, era compreensível. 

   Apesar de toda a preparação não estava tão animada para a festa, claro que compareceria afinal de contas não daria qualquer motivo para Tadeu acreditar que não estava respondendo bem ao seu tratamento miraculoso. Porcaria nenhuma. Ele apenas me ameaçou e passou alguns exercícios mentais os quais fingia fazer em meus cinco longos minutos de visita em sua sala a cada cinco dias. George em seus fios ruivos mais bagunçados que o normal surgiu em minha frente pedindo que eu ajudasse Sasha e Natalie a pendurar as plaquinhas com desenhos de fantasmas do outro lado do salão. Antes que eu pudesse dizer não ele já se afastava com um sorrisinho maroto nos lábios, ele era uma peste mesmo quando tentava usar sua expressão mais angelical. Me levanto em passos lentos caminhando até as meninas, Sasha estava encima de uma escada com mais mais de um metro enquanto Natalie passava cola quente no fundo dos desenhos, meu trabalho era apenas repassar de uma a outra, foi até bem rápido levando em consideração a minha total falta de vontade de continuar ali. 

—Como estão as coisas com Timothy? — Natalie pergunta me fazendo erguer um olhar confuso até ela.

—Que coisas? — pergunto automaticamente. Sabia que os dois eram amigos, mas não imaginava que ela prestasse atenção no que tinha acontecido.

—Qual é, todo mundo viu vocês se pegando, ele ficou te visitando todos os dias enquanto esteve na enfermaria. Sem mencionar o fato de que a cada cinco frases dele o sue nome aparece em pelo menos três. Esta caidinho. —por pouco não deixo a cola quente escorrer por meu dedo indicador.

—Isso é maluquice, não tem nada entre nós. —ela parou o que estava fazendo e me fitou franzindo o cenho. —Estou falando sério. Nos beijamos algumas vezes mas foi só isso. 

—Acho melhor dizer isso a ele então. Não devia ter alimentado suas esperanças.

—Não alimentei, ele que criou isso em sua cabeça. — solto um suspiro pesado. —Sei que ele é um cara legal, mas não vai acontecer mais nada entre nós.

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