Diário de bordo 130420

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Eu consegui.

Cheguei à Ala Leste.

Acho que não dá pra expressar o quanto estou aliviada de sair da Ala Sul. Há remédios aqui e o equipamento daqui está em inglês americano, algo que eu posso entender. Apesar de em um estado precário - o que me leva a me perguntar por quanto tempo fiquei desacordada - o equipamento pode ser usado. O replicador de tecidos está funcionando e acredito que posso usá-lo para finalmente cicatrizar meu machucado. Ah, como é bom ter tecnologia a meu dispor novamente.

Receio que essa mensagem não possa mostrar o quanto estou feliz agora. Ainda não explorei o local para ver como tudo está, já que tive que procurar abrigo dos monstros. Estranhamente até agora nenhum me atacou.

Chiado.

Quanto às circunstâncias para a minha chegada... Receio que minha situação tenha piorado. Um ser estranho e digno de pesadelos me seguiu. Eu ainda não o vi fisicamente, mas noto quando ele passa pela ventilação. Sempre que isso acontece, os equipamentos ficam malucos e começam a ligar todos ao mesmo tempo e...

Chiado.

Ele faz com que meu gravador fique chiando muito ou faz som de estática caso queira ser mais discreto e me aterrorizar ao mesmo tempo...

Mais chiado. Silêncio. Ruídos na ventilação. Sons de garras batendo no metal. Grito agudo. Respiração ofegante. Tensão. Som de garras se distanciando. Silêncio novamente.

Não era ele.

Suspiro de alívio.

Esses seres ainda estão por aí. De qualquer forma, tenho que ficar alerta. Amanhã irei explorar. Preciso achar o resto dos alimentos. As barrinhas de emergência são duras demais, mas parecem ser o único alimento disponível que tenho que não se deteriorou. O que é estranho. Nossos suprimentos são organizados para durarem o tempo que nossas viagens pelo espaço duram. Ou seja, muito tempo. Por quanto tempo eu desmaiei? Será que esses seres tem alguma relação com a degradação dos alimentos?

Suspiro.

Eu não faço ideia. São perguntas demais. Tenho que resolver logo isso. A cada minuto que passa, eu fico mais paranóica. O rosto daquele monstro está em meus pesadelos e, se eu fico no escuro, quase consigo enxergá-lo em todos os cantos. Às vezes é ele mesmo, brincando comigo, mexendo com a minha mente...

Som de soco na mesa.

Ele não é como os outros. Tem inteligência própria e não quer apenas me matar, eu sinto isso. Eu preciso saber qual é o mistério desses seres, como eles entraram aqui... Preciso saber se há sobreviventes! Preciso de alguém humano e vivo para conversar...

Suspiro.

Eu estou enlouquecendo. Cheguei a começar a conversar com um desses sugadores de energia! E o pior é que acho que ele estava me entendendo. Claro que isso foi antes de ele tentar me atacar. Então acho que era só coisa da minha cabeça. Os sonhos só tornam tudo pior. É sempre a mesma memória, visão, sei lá... É sempre o mesmo sonho! Mas quando eu vou ver o que está atrás de mim, eu acordo ou algo me acorda. Claro que isso é quando eu consigo dormir, o que só ocorre quando eu tomo um calmante. Isso não é saudável, eu sei. Mas se eu tentar dormir sem eles, o máximo que consigo é cochilar e acabar vendo os três olhos vermelhos e os dentes pontudos no sorriso psicopata daquele ser. Eu não sei mais o que fazer...

Chiado. Suspiro e som de fricção de papelão.

Eu andei olhando as coisas que tinha conseguido trazer para cá da minha área de residência e descobri alguns objetos que eu tinha esquecido que eu tinha trazido.

Momento de silêncio.

Eu achei a minha "bolinha de apertar" de quando eu estava fazendo terapia para solucionar meus problemas de ansiedade.

Som de mexer em papéis.

Eu achei meu caderno de anotações de todos os projetos que eu planejei fazer.

Suspiro triste.

Claro que agora não poderei mais fazê-los.

Silêncio.

Eu achei esse cartão que a minha filha tinha feito pra mim antes...

Voz trêmula.

Antes de eu vir pra cá.

Eu sinto tanta saudade.

Riso triste.

"Para a mãe mais legal do mundo..."... Ela adorava quando eu dizia que trabalhava numa estação espacial.

Choro. Fungadas.

Por que eu vim pra cá?

Suspiro. Silêncio.

Eu deixei minha família pra trás para ficar aqui... Primux, "a mais nova e moderna estação espacial já criada, onde sonhos se tornavam realidade".

Som de vidro sendo quebrado.

Ia ser minha última missão. Eu tinha prometido para ela. Eu disse que depois disso íamos ficar juntas e ir para qualquer lugar que ela quisesse. Eu prometi passar mais tempo com ela, ajudá-la com os passos de balé...

Riso triste.

Ensinar a jogar xadrez...

Fungada. Som do alarme de emergência.

Ah, droga. Desestabilizou de novo.

Suspiro. Gemido de dor ao se levantar.

Eu sabia que era bom demais pra ser verdade. Há uma falha na conexão entre o receptor de energia daqui e o gerador de energia principal dessa Ala. 

Som de teclas sendo apertadas rapidamente.

Tudo está dando erro. A ventilação, o sistema de purificação do ar, os aparelhos... Mas que droga.

Suspiro.

De qualquer jeito, terei que ir lá fora para consertar isso amanhã. Pelo visto minha perna não irá ser curada tão cedo. Vou terminar essa gravação aqui. Tenho que aproveitar enquanto o sistema de manutenção do oxigênio ainda não pifou.

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E foi isso, pessoal! Curtinho, mas espero que tenha gostado! 😊
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Contágio: O terror no espaçoOnde histórias criam vida. Descubra agora