CAPÍTULO DEZOITO

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Se a situação em si já era estranha, imagia chegar em um lugar, depois de tanto tempo sem dar notícias como se nada tivesse acontecido? O lado bom? Naquele momento eu não precisaria me explicar a ninguém. Não precisaria falar nada sobre mim, porque naquele instante, apesar dos olhares na minha direção, eu não era o foco.

No canto da sala, não muito longe do caixão, Christian estava sentado, fitando o chão enquanto mechia em algum objeto que eu não conseguia identificar. Na medida que ia me aproximando com Anahí, eu podia ver como ele estava. A situação física dele não era tão diferente da minha. Ele tinha emagrecido, seu rosto pálido e ressecado tinha algumas linhas de expressão, a maçã de seu rosto estava funda e seus lábios um pouco feridos. É... ele estava pior que eu.

— Chris?

Os lugares ao lado dele estavam ocupados, então sem hesitar, abaixei-me à sua frente, e me sentei no chão. Peguei suas mãos e depositei um beijo ali.

— Dul...

— Eu tô aqui agora. Sinto... sinto muito.

— Como você está?

— Não importa, tá? Eu tô aqui por você e vou ficar bem se você prometer pra mim que vai ficar bem. — Minha voz falhou. Christian deixou seu corpo escorregar até o chão, ficando sentado à minha altura.

— Dói tanto, mas eu sei que ela tava cansada. Que ela precisava partir.

— Ela tá bem agora, né? E tenho certeza que onde ela estiver, ela está olhando por você e que ela jamais gostaria de ver o neto preferido dela sofrendo desse jeito.

— É tão difícil.

— Você vai conseguir superar. — Enxuguei o rosto dele quando a primeira lágrima traçou seu rosto. — Eu sei que vai.

— Eu sou tão fraco.

— Não. Você não é. Você é o Christian, o palhaço da turma, lembra? O que faz todo mundo rir, o que irrita a gente. O que adora ver o circo pegar fogo. Se você desistir de ser assim, o que será da gente?

Olhei em volta, suplicando por apoio, mas ninguém disse nada. Christopher parecia ter perdido as palavras, Alfonso estava consolando Anahí que estava chorando silenciosamente e Maite... ela nem se moveu. Seu olhar sombrio stava sobre mim, como quem estivesse desejando que eu não estivesse ali.

— Você tem a gente pra sempre, Chris.

— Ninguém quer saber de mim. Eu sou uma pessoa horrível.

— Não! Para com isso, você não é. — Olhei para a mão dele e vi que ele estava sem aliança. — Não importa o que pensem ou o que digam, você ainda é o meu amigo maluco, e uma das melhores pessoas que conheci na minha vida. Eu, mais que qualquer um entendo o que você tem passado nesses últimos meses, sei como se sente e caramba, se alguém foi capaz de te deixar pelo que você tem passado, sinto muito, mas essa pessoa não tem ideia do que está perdendo. — Olhei para Maite que revirou os olhos.

Eu deveria discutir aquilo? Ela era namorada dele, e deveria ser a primeira a apoiá-lo, ao invés de simplesmente dar sas costas pra ele.

— Eu fiz uma escolha. Fui fraco e escolhi o lado errado, mas agora eu não sei como voltar.

— É... ele fez!

— E você fez a sua, Mai. Fez a sua escolha de ter que fazer ele escolher entre a dor dele e você.

— Olha só quem fala.

— Sério que vamos discutir isso aqui? — Olhei em volta tentando demonstrar o óbvio.

— Meninas, isso não é hora nem lugar... — Alfonso disse, e eu revirei os olhos.

— Eu não sei se sou bem vinda aqui, talvez não seja.

— Nem sei por que voltou, ninguém aqui precisa de você.

— Mai! — Anahí enxugou o próprio rosto enquanto expclamava. — Não dê ouvidos a ela, Dul.

— Eu sei que ninguém precisa de mim. — Olhei para Christian que se manteve calado. — Talvez seja melhor eu ir embora.

— Não. Você é bem vinda aqui, Dulce. — Christian me segurou, antes que eu tentasse me levantar. — Não faz a menor ideia de como fez meu dia melhor vindo aqui.

— Chris, você vai voltar a ser você, tá bom? Pode levar um tempo, mas vai. Nem que seja na base da porrada. — Ele deu um sorriso fraco. — Eu entendo você, de verdade. — Olhei para Christopher que assentiu, como se o que eu estivesse falando fosse a melhor coisa para ele ouvir naquele momento. — Minha vida também não foi das melhores, mas aos poucos a gente vai chegar lá. Você só precisa ter a pessoa certa na sua vida, a sua âncora.

— A minha âncora se desfez, Dulce. Ela se soltou, e agora eu tô perdido em mar aberto e tá perigoso, tá muito perigoso. — Ele esticou o braço e puxou a manga da blusa. Tinha cicatrizes ali. Cicatrizes horríveis.

— Não é só droga, né? — Ele negou. — Ah, Chris... eu não sei mais o que falar. —

— Há quanto tempo está se cortando? — Maite indagou, como se aquilo fosse surpresa para ela. Na verdade, a julga pelo espanto no olhar de todos ali, era surpresa pra todos.

— A dor diminui.

— Você precisa parar, Chris. Isso é perigoso demais e não queremos perder você.

— Eu sei. — Ele mordiscou seu lábio inferior. — Eu queria sair daqui, essa música está me irritando.

— Quer que eu peça para eles pararem?

— Minha mãe vai surtar. — Olhei em volta procurando a mãe dele, e a vi bebendo enquanto conversava. — É... ela tá bêbada. Na verdade tem um monte de gente bêbado aqui.

— Esse país é muito estranho.

— Sim.

— Eu convidaria você pra irmos pra algum lugar, mas não acho uma boa ideia. Já, já vão enterrar o corpo e...

— Eu não ligo. Dulce, eu estive do lado dela o tempo todo enquanto pude. O que tá ali agora, é só um corpo, minha vozinha já não tá mais aqui. Não quero que minha última lembrança dela, sejam homens que nunca vi na vida jogando terra em cima do caixão. Não quero dormir e ter isso em mente.

— Mas você já viu ela lá no caixão.

— Na verdade, não. Eu não olhei pra lá ainda.

— Sério? — Ele assentiu. — Se é assim, tudo bem.

— Tá vendo isso aqui. — Ele me mostrou uma correntinha dourada. Era o que ele tinha em mãos. — Ela me entregou na última vez que a vi. Ela tava sorrindo, e aí ela dormiu e é assim que quero me lembrar dela.

— Sabe onde devíamos ir?

— Hurrum. Será que mais alguém vai, ou só nós dois?

— Não sei, o que acham pessoal? Um milkshake bem grande com batata frita?

— Isso é ridículo, mas ok. Se vocês acham que vai fazer bem, eu vou. — Maite fora a primeira a responder, para minha surpresa.

— Vocês dois são malucos.

— Se fôssemos malucos sempre, não estaríamos no fundo do poço. — Levantei-me e estendi a mão a ele e então o ajudei a se levantar. — Vem aqui, eu amo tanto você. — Puxei-o para um abraço apertado que logo fora retribuído. — Ah não...

— O quê?

— Nada. — Na porta de entrada, estava Marcela e Aaron. Seus olhos estavam espantados olhando na minha direção. Soltei um suspiro e forcei um sorriso. — Vamos?

[REVISÃO] Inevitável - RedençãoOnde histórias criam vida. Descubra agora