CAPÍTULO QUARENTA E SEIS

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O quarto estava escuro quando acordei e eu estava sozinha. A pouca iluminação vinha do monitor dos batimentos cardíacos e essa mesma luz me possibilitava de ver o quarto. Tinham balões cheios de gás hélio presos na grade da maca, um urso de pelúcia enorme perto do meu pé, e alguma coisa na poltrona, que pareciam vários embrulhos. Na mesa de apoio ao lado, um arranjo enorme de rosas brancas e azuis.

Tentei me sentar, mas senti uma pressão enorme sobre minha barriga. Minha garganta estava seca e tudo que queria naquele instante era beber uma boa quantidade de água.

Consegui pegar minha bolsa que estava ao lado do arranjo e procurei pelo meu celular. Deixei a bolsa de lado e desbloqueei a tela. Tinha milhares de mensagens, e até tinham criado um grupo para saberem do estado de saúde dos bebês e meu. A foto do grupo era uma minha que Christopher tinha tirado sem minha permissão, e vendo ali, até que tinha ficado legal.

"Boa noite, alguém por aqui? Eu estou morrendo de sede."

"Eu tô indo."

Christopher respondeu rapidamente. Fiquei lendo as mensagens no grupo, procurando por alguma informação sobre meus filhos ou alguma foto que fosse, mas a única coisa que eu vi era Anahí dizendo que ia ficar tudo bem com os quatro.

Duas leves batidas na porta, e então ela se abriu e a luz foi acesa. Christopher deu um sorriso fraco e veio na minha direção, trazendo uma garrafinha de água.

— Como você está?

— Cansada. Por quanto tempo dormi?

— Algumas horas. Deve tá com fome, né?

— Sim.

— Como eles estão.

— Bem. A Vitória e a Nicole estão na entubadora, mas vão ficar bem. E o Gui e o Artur estão perfeitamente bem, apesar do tamanho deles. Os quatro estão no oxigênio, por que ainda estão com dificuldade para respirar, mas o doutor disse que isso é por pouco tempo.

— De verdade? Você tirou fotos? Como eles são?

— Tão lindos quando a mãe deles. Aliás, as meninas têm o seu nariz e a sua boca. Sua mãe disse que são sua cópia, o que me leva a acreditar realmente que você fez elas com o dedo.

— Christopher! — Dei uma risada, mas me arrependi, sentindo a dor em minha barriga. — Idiota.

— Eu queria tirar foto, mas não deixaram nem entrar com celular lá dentro. Tá todo mundo bem bravo, porque os únicos que conseguiram ver, mesmo assim, só de longe, foram seus pais, a Marcela, o Poncho e o meu pai.

— Nossa.

— Já foi todo mundo embora?

— Sua mãe tá lá fora com sua irmã, tomando café. Já disse pra ela ir embora, mas ela se recusou a sair enquanto você não acordasse.

— Ah... minha cabeça tá doendo.

— Tentou levantar?

— Sim. Me sentar...

— Não devia, agora toma a água e tente voltar a dormir, vai estar melhor quando acordar. Estarei aqui.

— Você também devia ir pra casa, eu vou ficar bem.

— Nem em sonho vou deixar você sozinha aqui, meu amor. Prometi que ficaria com você, não prometi?

Ele abriu a garrafinha e me ajudou a beber a água. Bebi quase que a garrafa inteira, depois voltei a me aconchegar.

— Quando vou poder vê-los?

— Não sei, espero que em breve. Vai se apaixonar por eles assim como eu me apaixonei.

— Você chorou?

— Se ele chorou? — Marcela perguntou, entrando no quarto com minha mãe. — Não contou a ela?

— Cala a boca, Marcela.

— Ele desmaiou na sala de cirurgia quando ouviu o primeiro bebê chorar, foi uma comédia só. Seus amigos riram tanto dele.

— Christopher! — O fitei. — Eu sabia que você ia surtar, passou mal na primeira ultrassom.

— Mas depois que recobrei a consciência eu voltei pra lá, não me olhe assim. — Ele desviou o olhar e suas bochechas ficaram levemente rosadas, demonstrando a cergonha que ele sentia.

— Quem nasceu primeiro? — Troquei de assunto para não constrangê-lo ainda mais.

— Gui, Artur, Nicole e Vitória. Nessa ordem. Olha, aqui tem a anotação com o peso, horário e tamanho deles.

Christopher pegou um papel em baixo do jarro de flores e me entregou. Guilherme, 895g, 33,5cm; Artur, 887g, 34cm; Nicole, 840g, 32cm; e Vitória, 842g, 33cm. Eles eram tão pequenos, mas eu sentia que tudo ia correr bem. Eles cresceriam fortes e saudáveis e eu me lembraria disso para sempre, sabendo que tínhamos vencido todos os obstáculos.

— Por que tá chorando?

— Oi? — Olhei para Christopher, que sorria terno. — Ah, desculpa, eu estou emocionada, só isso.

— Faz parte. Quando vocês nasceram eu só chorava. — Minha mãe se aproximou e deu um beijo na minha testa. — Coisas de mãe, meu amor. Não dá pra explicar. — Ela enxugou meu rosto.

— E o papai?

— Ele foi pra casa, disse que amanhã bem cedo vem pra ficar no lugar do Christopher. Tá todo bobão com os netos, dá pra acreditar?

— Não sei quem é mais bobo. O papai ou o Victor. — Marcela revirou os olhos. — O papai só sabe falar nos bebês.

— Ih, ficou com ciúmes, foi? — Ela deu de ombros e eu ri. — Você é uma das madrinhas, não pode ter ciúmes não.

— Sou?

— Sim. — A fitei. — Você, a Annie e a Mai, quer dizer... você aceita? Eu também nem perguntei pra elas...

— Nem precisa pedir duas vezes, assim vou poder apertar os quatro sem medo do amanhã. Aqueles fofuxinhos da titia.

— E trocar fraldas também. — Dei uma piscada e ela fez careta.

— Ainda bem que eles têm muitos tios. — Christopher concluiu. — Muita fralda pra vocês trocarem.

— Quando vou poder comer? Eu estou faminta.

— Vou comprar algo pra você. À essa altura não vão servir nada.

— Ótimo. Odeio comida de hospital mesmo. — Dei de ombros. — Trás mais água, ainda tenho sede.

— Tá, eu volto logo.

[REVISÃO] Inevitável - RedençãoOnde histórias criam vida. Descubra agora