10. Telhado

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Jessie me levou até o heliporto, no terraço do prédio da família Killian, e fez com que eu enxergasse uma das coisas mais belas que já vi na vida: um céu negro, recheado de estrelas e logo abaixo o contorno do prédio espelhado.

Me aproximei do parapeito, com Jessie me avisando para tomar cuidado e de olho em cada movimento meu. Na verdade, ele me observava bastante e depois do que aconteceu na mesa do jantar, não sabia bem como agir ou como iniciar uma conversa normal.

Felizmente, isso não parecia um problema para ele.

— Esse é um dos lugares mais lindos do Kansas – ele disse, com um sorriso grandioso. – Venho aqui quando quero me desligar do resto do mundo, dos problemas da família e principalmente quando quero me lembrar da Amanda.

— A sua esposa?

— Sim, ela era uma joia rara. Tinha um espírito rebelde, agia como se o universo fosse todo dela e isso me atraiu de imediato. Amor à primeira vista, te garanto.

— É bom ver gente que ainda acredita nessas coisas.

— Significa que você não acredita?

Os olhos dele me analisaram, aguardando uma resposta, e isso me fez corar um pouquinho. Jessie era diferente de TK. Me via aos poucos desejando saber mais sobre aquele garoto de sorriso simpático e jeito de homem que deve ter passado por muita coisa na vida.

— Então, você costuma trazer garotas para cá? – Perguntei, mudando um pouco de assunto.

— É, confesso que sim. É um lugar romântico. Ótimo para trazer algumas garotas. E garotos também.

Acho que ele gostava de cruzar os limites, porque enquanto conversávamos ia chegando mais perto. Até que senti nossos braços encostarem um no outro.

— Acho melhor voltarmos lá para baixo, o TK pode estar preocupado.

— Não me importaria com isso, Júnior.

— Na verdade o meu nome é Thiago. Foi meu pai quem inventou essa besteira de me chamar de Júnior, mas eu...

Não consegui terminar a frase quando ele destruiu qualquer barreira entre nós e me beijou.

Seus lábios eram doces, o beijo foi calmo, gostoso e me causou um arrepio por todo o corpo. Nunca imaginei que fosse sentir algo assim, foi diferente de qualquer garoto com quem já fiquei e quando ele se afastou, queria mais.

— Desculpe por isso – ele falou, sem jeito – Acho que ultrapassei alguns limites hoje, mas é que desde que te vi não parei de pensar em como seria bom fazer isso.

— Tudo bem, eu gostei. É só que estou com o TK agora.

— Mas nós dois sabemos que é uma união forçada. Você não deve nada a ele, então não podem exigir algo de você. Nossas famílias ganharão bastante quando você assinar os papéis para o casamento, mas seu coração é livre para conhecer outras pessoas.

— O que quer dizer com isso? – Perguntei, confuso.

— Quero dizer que comprometido ou não, ainda quero te conhecer mais – e seus olhos brilharam quando perguntou – Quer sair comigo qualquer dia desses? Acredite, não vai se arrepender.

Depois do beijo, fiquei tentado e dizer sim. Não sei porque, mas Jessie despertava um sentimento diferente em mim, algo que nunca experimentei com qualquer outro cara. E que também não encontrava em TK.

Não sabia como agir dali pra frente, mas tudo o que queria era continuar naquele terraço. Infelizmente não podia. John sempre me ensinou a ser leal, a cumprir minhas promessas e ser sincero com quem eu gostava. A situação em que meu pai me colocou podia ser complicada, mas não podia deixar de ser eu mesmo. Não trairia a única pessoa que me ajudou desde que meu mundo virou de cabeça para baixo, não importa o quanto meu coração batia forte naquele momento.

— Desculpe, mas não posso – falei, sem jeito. – Fiz uma promessa pro TK. Sei que magoaria muito ele se saísse com você e não quero isso.

— Isso quer dizer que você o ama? – Ele perguntou, com uma expressão mais séria.

— Sinceramente, acho que é um pouco cedo para falarmos em amor. Mas gosto dele, então não posso magoá-lo ou deixar que o tranquem em uma clínica.

— A clínica é ideia do Tom, não tenho nada a ver com ela, mas ele está certo!

— Não me venha com essa.

— Ainda não viu o quanto as drogas interferem no comportamento do meu irmão, ele já fez coisas horríveis por conta da dependência e precisa de tratamento.

— E vou fazer meu melhor para ajuda-lo, sem abandoná-lo e jogar a chave fora como vocês querem fazer – falei, sério. - Agora, se me der licença, tenho que voltar para aquele jantar.

Me afastei, mas antes de ir embora Jessie interrompeu.

— Escute, sei que te coloquei em uma posição difícil, mas quero que saiba que quando mudar de ideia ainda estarei aqui – ele disse, atencioso. – Só não demore demais.

Depois daquilo, fiquei confuso. Jessie conseguiu me deixar balançado, mas não iria me deixar levar tão facilmente. Meu principal compromisso ainda era com TK. Por isso, quando deixei o heliporto e voltei para o apartamento procurei por ele.

Tom estava na sala de estar e me olhou com satisfação, como se soubesse do beijo e imaginasse coisas a mais. Ignorei ele e passei os olhos pelo local.

— Aí está você – disse meu noivo, se aproximando do nada e me puxando para perto dele. – Onde diabos você foi, Thiago? Sumiu com a porra do meu irmão, não foi? Como pôde ignorar tudo o que conversamos!?

— Assim você vai me machucar – avisei, com ele apertando forte o meu braço.

— Te pedi uma única coisa! Tudo o que você tinha que fazer era ficar longe do Jessie. Quantas vezes vou ter que dizer? Pode transar com a merda do Kansas inteiro se quiser, mas fique longe do Jessie.

Puxei meu braço, irritado por todo aquele papo. Na minha cabeça, ele não tinha o direito de exigir absolutamente nada de mim. Desde que me colocaram naquele universo de gangues, tudo o que fiz foi me manter calmo e tentar seguir as regras. Isso não significava que ficaria quieto e ouviria tudo em silêncio.

— Seu irmão e eu não temos nada – afirmei. – Tudo o que ele fez foi me mostrar o lugar. Fomos até o heliporto e só!

— O heliporto? – Ele ouviu aquilo com choque – Sabia que ele levava a ex-esposa para lá? Sabia que Jessie já levou várias pessoas para lá? Você não é especial para ele, Thiago.

— Sabe, você consegue ser um escroto quando quer – falei, incomodado por aquele jeito estranho dele. – Jessie me contou tudo isso.

— Então agora estão de conversinhas!

— Sei que está com ciúmes, mas não tem com o que se preocupar.

— Ciúmes? – Ele riu, sarcástico. – A última coisa que sentiria é isso. Meu pai me escolheu para cumprir a tarefa de casar com você. Não me importo nem um pouco com o meu irmão.

Nossos pais saíram do escritório naquele momento e me impediram de explodir do jeito que eu queria. Mesmo assim, me aproximei dele e disse o que estava entalado na garganta.

— É bom saber que sou só uma "tarefa" para você.

— Não foi o que eu quis dizer – ele pareceu arrependido.

— Mas foi o que falou – enxuguei os olhos. Não ia me deixar chorar na frente dele. – Quer saber, é bom termos essa conversa porque fica cada vez mais claro que só estou com você porque nossos pais mandaram. Em outras circunstâncias nós nunca teríamos ficado juntos.

Vi a decepção no olhar dele, mas não me arrependi pelo que disse. Era a mais pura verdade, porque quando encontrei TK não imaginei que ficaríamos juntos. Não houve uma química imediata. Pelo menos não como aconteceu com Jessie.

Me perguntei quanto tempo suportaria toda aquela pressão antes de explodir. TK também não pareceu bem, porque assim que encontrou uma garrafa de bebida, começou a encher o copo.

Aquela noite ainda seria longa. 

Pacto de Gangues (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora