Não sei se você se lembra, mas a primeira coisa que disse no começo desta história é que não sou um escritor. Não sou de contar histórias ou descrever precisamente o que acontece na minha vida e jamais tive um diário ou bloco de anotações onde colocava meus pensamentos.
Ouvi dizer que, quando você se vê obrigado a contar pelo o que passou, o monstro volta e te ataca com a mesma intensidade de antes. No meu caso, contar essa história me ajudou a ver como tive sorte em continuar vivo independente das adversidades que me atingiram. E acredite quando digo que elas foram muitas.
— Abra a porta! – gritou Jessie, socando a madeira que nos separava.
Fui rápido até a tranca e a desfiz. Jessie entrou às pressas junto de TK. Ambos tinham revólveres em mãos e TK mantinha um facão sujo de sangue preso à lateral da calça. Até hoje não faço de ideia de como ele conseguiu aquilo.
— O que houve? – perguntei, sondando se estavam feridos.
— São homens do Bernardo – disse TK, ofegante.
— Não pode ser. Tínhamos um acordo com ele!
— Acho que ele se cansou de esperar.
Jessie veio até mim e viu se eu não estava ferido.
— Está tudo bem – tentei acalmá-lo. – Ninguém tocou em mim, matei os dois que se aproximaram pela escada.
— Minha nossa! – disse meu irmão, exaltado. – O que diabos está acontecendo aqui? Você matou duas pessoas, Thiago!
— Ele fez o que tinha que fazer – TK me defendeu. – Antes aqueles dois do que vocês.
— Não aja feito um bárbaro, irmão – Jessie bufou. – Andem, temos que ver um jeito de sairmos daqui. Vou abrir a janela e subimos para o telhado.
— E o meu pai? – Perguntei, aflito. – Se são homens do Bernardo provavelmente querem o Rey. Temos que impedir que o levem.
— Rey sabe se cuidar.
— Mas...
— Vamos em frente – disse TK. – Rey deve ter matado todos que se aproximaram dele. E quanto ao meu pai, espero que aquele velhote esteja decapitado a essa altura. Se bem que vaso ruim não quebra.
— Não fale asneiras, TK – Jessie o repreendeu – Preciso que você ajude o John enquanto cuido do Thiago.
— Você é melhor com o revólver do que eu – interveio TK – é melhor você ficar com o John. Ele é o único desarmado aqui.
Jessie ponderou, e então concordou.
Caminhei em direção a janela e fui surpreendido por dois disparos que atravessaram o vidro. Me afastei rápido, antes que mais viessem, e todos nós fomos para o chão.
— Merda! – falou Jessie. Eram poucas as vezes em que o ouvia xingar. – Eles sabem que estamos aqui. Venham, é melhor tentarmos a porta.
Seguimos ele, que foi até a porta e, agachado, girou a maçaneta.
Lá fora não havia ninguém, então meu marido colocou John perto dele e deixou que TK fosse logo atrás comigo.
Havia bastante sangue pelo corredor e escutamos as vozes das pessoas que conversavam no térreo. Aquilo nos deixou encurralados, então seguimos para o escritório do meu pai e fechamos a porta atrás de nós. Pelo menos lá dentro ainda podíamos ouvir o que ocorria com os demais.
— Onde está? – gritou um dos capangas de Bernardo. – Estamos cansados de você, Rey. Diga agora onde ele está e prometo que vai morrer rápido e indolor. Caso contrário...
Levei a mão à boca, apavorado com a possibilidade do meu pai ser torturado.
— Pode vir! – Gritou Rey, com a voz entusiasmada. – Vamos ver do que as mocinhas são capazes.
Mais socos vieram em seguida e virei o rosto, receoso. TK me abraçou devagar e disse que tudo ficaria bem, mas não acreditei de verdade nisso.
Olhei ao redor e percebi que, talvez, aquele lugar fosse o local certo para desvendar qualquer um dos segredos do meu pai. Afinal, foram poucas as vezes em que ele me deixou passar por aquela porta.
— É aqui – falei, contente comigo mesmo. – Tenho certeza que está aqui em algum lugar!
— O que? – Perguntou TK, confuso.
— Esse é o escritório do meu pai, os segredos dele só podem ficar aqui. Não existe outro lugar onde ele se sinta mais à vontade do que o local de trabalho dele – e corri até as gavetas. – Rápido, busquem qualquer coisa, qualquer papel que fale sobre o pai do Bernardo.
Todos entenderam o plano e começamos, o mais silenciosamente possível, a busca por algo que nos abrisse os olhos para o que meu pai escondia. Seja o que for, ele estava disposto a morrer sem deixar que os demais descobrissem, porque ouvi o momento em que levou os primeiros socos.
Abri uma das gavetas da escrivaninha e encontrei um envelope. Joguei o conteúdo dele no chão e comecei a analisar as fotos que encontrei.
Eram imagens antigas de alguma criança. Ali havia fotos de aniversários e as velas do bolo indicavam o passar dos anos: 5 anos, 8 anos, 10 anos... Entre as fotos também encontrei eventos e algumas anotações no verso. Ali estava registrado meu primeiro recital de piano, a primeira vez que caí de patins, eu de mãos dadas com a minha primeira namorada e, alguns anos depois, com meu primeiro namorado.
Me surpreendi com aquilo tudo. Nunca tinha visto tantas fotos minhas em um único lugar.
Como podia? Esse tempo todo, meu pai se mostrava presente, de olho em cada passo meu. Ele sabia tudo sobre a minha vida e mesmo assim optou por me manter afastado. O que isso significava?
— Aqui! – disse John, arrancando uma gaveta de arquivos do lugar. – O nome é Filipe Ramires, não é? Tem umas fotos aqui e alguns anexos.
— Deixe-me ver – falei, deixando de lado meu passado.
Guardei minha arma na cintura e fui até meu irmão. Abri o arquivo com o nome do pai do Bernardo e o que encontrei fez meus olhos se arregalarem.
— Não sei se o Bernardo irá gostar de ver isso – falei, depois de engolir o seco.
— Como assim? – Perguntou Jessie, curioso – O Filipe está morto?
— Não – respondi. – Mas tenho sérias dúvidas se o Bernardo vai nos manter vivos quando descobrir.
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Pacto de Gangues (Romance Gay)
Fiction généraleGay | + 18 | Classificação indicativa. Thiago sempre acreditou não ter um pai, até o dia em que o colocaram frente a frente com Rey - um homem frio e calculista. Não demora para o jovem se descobrir herdeiro de um negócio milionário de tráfico de...