Valiente
Saber que Audrey ainda teme os monstros do passado me faz sentir uma raiva que não esperava. Crescer em um país como o nosso te prepara para muitas coisas difíceis, mas não me preparou para ver o puro terror na expressão de Audrey ao gritar dormindo. Não me preparou para ouvi-la declarar que fugiu de um casamento arranjado e que não era bem tratada pelo futuro marido. Sinto meu sangue ferver ao imaginá-la com alguém que não a trata bem.
— O que te deixou irritado dessa vez? — José questiona, sem me encarar.
Para ser sincero não lembro o motivo de estar em sua sala e nem o assunto do dia.
— Algumas coisas aí — minha resposta seca arranca um sorriso dele.
— Que envolvem a garota nova, suponho.
— Talvez — minha evasiva atrai sua atenção imediatamente.
— O que acontece?
— O que acontece é que eu quero matar todos que a maltrataram e não sei por quem começar e nem onde achá-los. — Cerro meus punhos e sinto a raiva tomar conta de mim novamente.
Ele expressa sua surpresa através de suas sobrancelhas arqueadas e os olhos arregalados.
— Não consigo me lembrar a última vez que você soou com tanta raiva contida.
— A raiva não estaria contida se eu soubesse onde ela vivia antes — murmuro mal-humorado.
— Você se apegou a essa garota — é tudo o que ele diz e o silêncio preenche o recinto.
— O que você quer dizer com isso, José? — O olho irritado e ele abre um sorriso enorme.
— Bom, muita gente chegou aqui com problemas com tutores e você nunca resolveu ir atrás dessas pessoas e matá-las.
— É um caso diferente — retruco e me levanto da cadeira. — Precisa de mim?
— Como você não parece disposto a ajudar hoje, não — a resposta divertida me faz revirar os olhos para ele. — Vai espairecer. — Me viro na direção da porta. — Ou vai atrás dela e a convence a te contar sobre o tutor — ele acrescenta e eu o ignoro.
A vejo assim que fecho a porta. Por algum motivo ela está sozinha observando as pessoas do Abrigo em suas atividades de rotina. Alguns limpam o local, outros fazem seus trabalhos manuais para vender na feira, alguns cuidam das crianças e outros só jogam conversa fora.
Ela não me vê se aproximando e quando paro em sua frente, ela sorri e essa visão é o suficiente para apaziguar a minha raiva.
— Por que está sozinha? — questiono, me sentando ao seu lado em um dos bancos que há nas extremidades do Abrigo.
— Lettie sumiu tem um tempo e não sei onde Marcos está. Tenho a teoria que os dois estão juntos por aí. — Seus olhos brilham ao responder e percebo que seu tom está mais vivo do que estava antes.
— Você provavelmente está certa, sempre que eles somem, estão juntos — digo divertido, e aproveito o momento para observar o Abrigo ao lado dela.
Quando cheguei nesse lugar, me surpreendi ao ver a vida seguir mesmo enquanto o caos reinava lá fora. Esse lugar permitiu que eu encontrasse um propósito e uma forma de obter redenção. E provavelmente está permitindo que Audrey veja um lado bom do mundo.
— Os dois são bem previsíveis — ela diz rindo. — Ao contrário de você.
A olho de lado e percebo que ela me encara.
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Esperança na Liberdade [COMPLETO E EM REVISÃO] - Livro 1
Ficción General•2º lugar em Romance no Concurso Young Writters •3º lugar em Ficção Geral no Projeto Realizando •Honraria de Melhor Protagonista na categoria Jane Austen - Romance e Literatura Feminina no Prêmio Imaginadores 2019 Um casamento arranjado. Um rei tira...