Capítulo 24

108 25 3
                                    

Audrey 


Tédio. É a única palavra que me vem à mente para definir o dia que estou tendo.

Apesar de ter pedido, implorado e argumentado um milhão de vezes, não me deixaram ir além da cozinha do Abrigo. Eu queria sair, ver o céu, sentir a brisa gélida no rosto e escutar o caos da cidade. Porém, nenhum dos meus companheiros se convenceram e me mantiveram presa no Abrigo, sem direito a algo mais divertido.

Todos haviam saído e feito um milhão de coisas que eu desconhecia, mas eu não. Eu havia passado o dia sentada, olhando a pouca movimentação do galpão e comendo tudo que dona Berenice colocava na minha frente. A última foi fácil, comer é algo que adoro e dona Berê é do tipo que gosta de alimentar a todos. Formamos uma boa dupla.

Mesmo ficando um pouquinho ressentida por estar presa aqui, me sinto extremamente feliz com todo zelo que venho recebendo. Eu fiquei doente algumas vezes ao longo dos anos e nunca tive alguém se preocupando comigo e me dando amor. Não tive alguém para checar meu estado e garantir comida para renovar as forças. Dessa vez eu sei que estão me mantendo presa para o meu próprio bem. É bem mais do que um dia desejei.

Mas o tédio não me deixa.

Poxa vida, podiam deixar eu dar uma voltinha ao redor do Abrigo. Eles passam o dia fazendo coisas, custava deixar eu fazer algo também?

— Por que está emburrada? — a voz grave traz um sorriso diminuto aos meus lábios.

O perfume de Lucas me atinge antes que eu tenha a chance de encará-lo. Mesmo vivendo no mesmo quarto que ele, ainda não vi o que ele usa para deixá-lo sempre tão absurdamente cheiroso. Não que eu queira saber, não quero. É mais uma curiosidade, afinal eu amo esse cheiro. Não amo, quer dizer, eu aprecio muito, muito mesmo.

— Não estou emburrada — rebato, quando seu corpo enorme e perfumado se acomoda ao meu lado no banco.

— É mesmo? Não é o que parece — sua resposta descrente aumenta um pouco o sorriso bobo que tenho nos lábios.

— Não estou — repito para convencê-lo. — Só um pouquinho entediada. — Meço com os dedos polegar e indicador, mostrando o quão pouco eu estou entediada.

Lucas ri com gesto e encosta na parede atrás de nós, aparentando relaxar os músculos antes tensionados. Não sei muito sobre o que Lucas faz do lado de fora do Abrigo, mas vejo como ele anda tenso. Sei que parte é por minha culpa, levar um tiro não é a coisa mais relaxante do mundo, mas o resto não tem relação comigo. Tem a ver com o monstro que está transformando esse país em um caos.

Um louco que provavelmente matou meus pais na noite que ele resolveu tomar a coroa para si.

Não entendo muito de leis, mas creio que tenha uma que incrimine atos como o de Carlos. Matar o governante oficial, seu herdeiro e todos que podiam derrubá-lo é sórdido e com toda certeza, um crime imperdoável.

Queria ter a capacidade e a chance de fazê-lo pagar por todos os crimes e injustiças que são atribuídos a ele. Queria ser alguém capaz de destruí-lo assim como ele fez com quem era sangue do sangue dele. Entretanto, tudo o que posso fazer é torcer para que dias melhores venham e que alguém o destrone.

— Cadê o idiota do seu irmão? — Lucas questiona o procurando com os olhos. — Se ele estivesse cuidando de você do jeito que cuida dos meus sentimentos, agora você não estaria reclamando de tédio.

— Ele cuida dos seus sentimentos? — pergunto curiosa.

A expressão de Lucas me revela que não era a intenção dele falar a parte sobre os sentimentos. Isso atiça um pouco a minha curiosidade e sei que fazer o interrogatório com Lucas diminuirá muito o meu tédio e muito provavelmente o dia passará mais rápido, bem mais rápido.

Esperança na Liberdade [COMPLETO E EM REVISÃO] - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora