Capítulo 38

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Audrey


Nos primeiros dias de minha liberdade, o mundo que me foi apresentado era maravilhoso. Havia muito tempo ao ar livre, dias recheados com o som de crianças se divertindo e a constante presença daqueles que me amam. Mas desde que Carlos piorara seu jeito de governar eu me encontrava a maior parte do tempo do lado de dentro do Abrigo. As crianças haviam sumido e ninguém parecia disposto a me contar onde elas estavam. E o meu trio... Não faço ideia de onde eles estão nesse momento.

Nem o que meu namorado faz ao longo do dia eu sei. Quando não está na rua, está enfiado na sala de José, conversando sobre coisas que desconheço.

Coisas que posso aproveitar esse momento para perguntar...

Nunca consigo interrogar Lucas pois ele tem a capacidade de atrapalhar a minha linha de raciocínio quando estamos juntos. E nem posso reclamar muito porque adoro ficar entre seus braços.

Entretanto, José sempre me pareceu alguém extremamente aberto. Considerando que minhas únicas opções é ver a TV — que me dá calafrios — e seguir olhando para o Abrigo vazio, sigo diretamente para a sala dele.

No mesmo instante que bato a porta vem a resposta me convidando a entrar. Assim que piso em sua sala, José abandona seus papéis e me abre um largo sorriso.

— A que devo a honra de sua presença, senhorita Audrey? — seu tom carinhoso é tão diferente daquele que passei anos ouvindo. Aqui, todos sempre pronunciam o meu nome dessa forma e isso sempre me recorda que venci.

— Estou entediada e resolvi vir conversar com o senhor — respondo, fechando a porta atrás de mim e seguindo para a cadeira vaga a sua frente.

Ele junta os papéis que lia anteriormente, se acomoda melhor na cadeira cruzando as mãos e as repousando na altura no abdômen.

— Será um prazer conversar com a senhorita. Algum tópico em mente?

— Como é que tudo isso aqui funciona? — Suas sobrancelhas claras se erguem até se aproximarem de seus cabelos brancos. — Um galpão desse tamanho com tanta gente assim não faz sentido para mim. Não com o Rei que temos.

Um segundo se passa e José passa a rir. Sua risada é tão sincera que chega a deixar suas bochechas rosadas e noto que seus olhos brilham com lágrimas.

— Eu estou há semanas esperando essa pergunta e veio em um momento inesperado — pronuncia após um tempo. — Senhorita Audrey, eu sou uma pessoa que prega a honestidade sempre. Bom, nós somos ladrões, comerciantes, prestadores de serviços e o que mais que der, todos aqui dentro é bom em algo, e com o dinheiro que conseguimos mantemos o Abrigo funcionando. Também temos o que podemos chamar de investidores, pessoas que doam dinheiro para que possamos permanecer existindo. Com tudo isso só precisamos de uma Guarda que não liga para os mais pobres, é o suficiente para tudo funcionar. Pergunta respondida?

Não.

— Mas e a comida? Os remédios? — insisto.

— Simples também, cada pessoa do Abrigo tem algo a oferecer a causa. Os ladrões, saem daqui lisos e voltam com os bolsos cheios. — Recordo de ouvir Lucas citando que Marcos era um ótimo ladrão. — Os comerciantes fazem essa mercadoria seguir a diante e trazem o dinheiro para auxiliar o Abrigo. E há os trabalhadores das diversas empresas que existem na cidade. Cada um ajuda da forma que sentir vontade, todos sabem que o dinheiro que entra é revertido em comida para todos e que ninguém é obrigado a ajudar caso não queira.

O encaro por um tempo, tentando decidir se acredito ou não nele.

— Eu levei um tiro, fui tratada por um médico e tomei remédios. Sei que eles são caros.

Esperança na Liberdade [COMPLETO E EM REVISÃO] - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora