Será que podemos conversar? (Bernardo Mazzaropi)

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Não cheguei na escola de bom-humor na terça-feira.
O soco de Guilherme estava marcado em uma mancha roxa no meu rosto mesmo depois de todos os meus esforços para cuidar dela na noite anterior. Ainda não sabia que desculpa daria para aquele machucado, mas dizer que me meti em uma briga não seria exatamente o que se espera de um professor.
Faltava mais de meia hora para as aulas começarem, então decidi passar um tempo na sala do professores que estava estranhamente vazia para essa hora da manhã. Ignorei o fato e me servi de café na tentativa inútil de melhorar meu humor quando ouvi a porta abrir.
Mia entrou atrapalhada se concentrando em deixar o mínimo de folhas possível cair no chão. Acho que não notou que eu estava lá, pois só depois de recolher os papéis que haviam caído apesar de seu esforço e colocá-los seguros em uma mesa que levantou o olhar e arregalou os olhos assim que me viu.
Mia: Eu... E-eu não sabia q-que você estava por aqui... - ela abaixou o olhar e eu revirei os olhos. Não estava afim de correr atrás dela hoje, apesar de querer ter uma conversa com ela o quanto antes.
Bernardo: Tudo bem. - resmunguei.
Seus olhos aumentaram ainda mais quando notou a mancha crescente na minha bochecha direita.
Mia: O que foi que aconteceu com você?? - ela falou dando inconscientes passos em minha direção.
Bernardo: Guilherme... - eu disse sem pensar.
Percebi que a menção do nome a fez estremecer e olhar novamente para baixo. Estava pensando na mesma pessoa que o autor da obra na minha cara estava quando fez isso: Maia.
Mia: Por que ele faria isso com você?? - perguntou mais para si mesma do que pra mim, mas resolvi responder mesmo assim.
Bernardo: Ele só estava sendo o crianção babaca que sempre foi... - decidi que contar sobre a crise dele depois de saber que a Maia poderia estar na cidade não era a melhor solução. Percebi que Mia assentiu com a cabeça, mesmo sem acreditar no que eu estava dizendo. As gêmeas tinham essa característica: sempre sabiam quando alguém não queria contar algo, mas sempre respeitavam esse tipo de decisão. Lembro-me de que, quando comecei a perceber esse jeito delas, passei a achar que elas eram as que tinham mais segredos da turma, mas logo a Milena me provou que as coisas não eram bem assim. Elas eram um livro aberto, principalmente uma com a outra.
Mia: Talvez eu possa dar um jeito nisso... - ela se aproximou a passos cuidadosos, mas decididos.
Bernardo: Como?
Mia: Maquiagem.
Bernardo: Maquiagem? - repeti irônico.
Mia: Tem alguma ideia melhor que não envolva você perder o seu emprego?
Resmunguei um "não" quase incompreensível, mas fez a Mia sorrir mesmo assim. Ela tirou um estojo da bolsa e começou o seu trabalho com o máximo de cuidado para não me machucar.
Mia: Quer dizer que o certinho do Bernardo Mazzaropi se meteu em uma briga? Acho difícil de acreditar.
Eu soltei um riso baixo.
Bernardo: Pois é... Eu também não conseguia imaginar!
Mia: Como as coisas mudam em 4 anos, né?
Bernardo: É... - tomei coragem para lhe fazer a pergunta que precisava. - Mia, será que podemos conversar?

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