Capítulo 5

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Eu estava assustado com o que tinha acabado de acontecer. Algo dentro de mim dizia que eu tinha sido autor disso. Mas como? Como eu poderia controlar o vento para que pudesse impedir que Felipe passasse pela porta? Olho para seu rosto e ele mantêm seu olhar fixado ao meu, como se estivesse procurando alguma resposta para o que tinha acabado de acontecer. 

Eu não sabia o que fazer, ou falar. Eu tinha quase certeza que isso não era só uma mera coincidência, e algo nele também sabia disso. Mas estava tão confuso quanto eu.

- Como você fez isso? - perguntou sem tirar os olhos dos meus.

- Co... como fiz o que? - estava difícil manter a calma diante desta situação.

- Você sabe do que eu estou falando. - disse se aproximando dessa vez.

- Eu não sei do que você está falando...

- Não se faz de tolo. Você sabe muito bem o que acabou de acontecer com a porta aqui. - ele falava em um tom de voz mais sério.

Seus olhos ainda estavam sobre os meus, só que mais próximos. Ele se mantinha em pé na minha frente, enquanto eu estava sentado na cama.

- Felipe, desculpa se eu não estou entendendo  o que você está querendo saber ... Mas eu realmente não sei do que você está falando. - agora estava tentando ser o mais convincente que podia. Mas não era fácil.

Ele me analisa mais um pouco, e antes de sair ele se inclina em minha direção e sussurra em meu ouvido.

- Eu não sei o que você é, nem de onde você veio, ou qual o seu propósito aqui conosco... Mas a partir de hoje estarei de olho em você. - concluiu e saiu do quarto.

Fiquei paralisado com suas palavras. Ele realmente sabia que eu tinha feito aquilo, e que mesmo não entendendo o que e nem como, para ele parecia ser algo comum. Talvez ele acreditasse nessas coisas paranormais.

Não consegui mais dormir, e como uma mágica toda a febre e fraqueza que eu sentia foi embora. Como se eu só precisasse descarregar um pouco a energia que estava presa aqui dentro do meu corpo para ficar melhor.

Eu preciso pesquisar algo sobre o que estava acontecendo comigo. Ou até mesmo procurar alguém que pudesse me entender. Mas quem? Talvez eu devesse ouvir o Felipe e ir embora daqui, antes que pudesse vir a por a vida deles em perigo. Afinal eu não tenho ideia do que posso fazer, e muito menos da proporção que essa magia poderia chegar.

     ☯

Alguns dias haviam se passado desde o incidente com o Felipe. Ele se mantinha mais quieto do que de costume. Eu tinha certeza que ele me observava com mais atenção, e isso já estava me deixando nervoso. Cada minuto ao lado dele era um medo diferente. De que eu pudesse me descontrolar novamente e ele descobrisse tudo que eu estava escondendo. Ou até pior, que eu pudesse causar algum estrago.

Eu estava convicto de uma coisa: eu não ia mais continuar por muito tempo junto com eles. Seria egoísmo de minha parte querer tirar minha família de risco e colocar a deles.

Estava organizando alguns itens na estante quando Felipe saiu para pegar alguns materiais de estoque para a venda com seu pai. Não demoraram muito a voltar com as mercadorias, e logo estávamos colocando tudo em ordem. Algumas coisas ficariam nas prateleiras e outras iriam para o estoque.

Pela tarde já havia acabado toda a organização e estava apenas sentado olhando o movimento da rua.  Quando Felipe chama minha atenção.

- Arthur! - disse esperando por uma resposta minha.

- Oi! - respondi me virando para ir de encontro a ele. Ele estava sentado no balcão lendo alguma coisa. 

- Poderia pegar aquela caixa que ficou na entrada do depósito e trazer até aqui por favor?

- Claro, já volto.

Me dirigi até o depósito e logo meus olhos encontraram a caixa. Peguei e levei até o balcão. Não era muito leve.

- Obrigado. - agradeceu ele. Acenei com a cabeça e me virei para sentar onde estava antes. - Espera, senta aqui do lado. - disse antes que eu pudesse sair, e assim o fiz.

- Aqui tem alguns livros que meu pai trouxe para vender, assim como esse que estou lendo. - olhei para o livro que estava em seu colo e na capa preta havia o nome "Sobrenatural" escrito em alto relevo. - Achei que poderia se interessar em ler algum deles antes de colocá-los a venda.

Ao ler o nome do livro meu coração gelou. Era como se ele estivesse me chamado até ali de propósito. Poderia até estar imaginando coisas, ou o medo de que ele pudesse descobrir sobre o que eu sou estivesse me fazendo criar algumas teorias. Mas se não for isso, é muita coincidência.

Acenei em concordância com a cabeça e abri a caixa para ver os livros que haviam dentro. Tinha histórias infantis, contos sobre lobisomens, fadas e duendes, livros escolares, e bem no fundo um livro com algumas histórias paranormais, parecido com o que Felipe estava lendo.

- Gostou desse? - perguntou ele enquanto segurava o livro.

- An? Ah, achei interessante. - disse saindo de meus pensamentos. Ele forçou um sorriso de canto de olho e voltou a ler.

Arrumei todos novamente dentro da caixa, inclusive o que havia visto por último. Estava muito nervoso para conseguir me concentrar. A presença dele me fazia isso. 

Fui até a porta e me sentei em um banco. Será que se ele soubesse a verdade sobre mim ele iria contar a seus pais e possivelmente iriam me tirar da casa deles? Ou ele tentaria me queimar como nos livros? O fato é que além do medo que havia de ser descoberto como um bruxo, também existia o medo da rejeição. De certo modo isso também me assustava, e não consigo me lembrar como e nem quando isso começou a passar pela minha cabeça.

Saio um pouco de meus pensamentos e olho em direção ao balcão. Ele estava me olhando. Desvio o olhar depressa, mas quando retorno ele continua a me olhar. Era como se pudesse ouvir meus pensamentos mais profundos. Dessa vez eu não viro mais meu rosto, meu olhar continua fixo ao seu.

Sinto algo gelado descendo em meu rosto. Passo o dedo sobre a minha bochecha e percebo que uma lágrima havia saído de meus olhos. Não sei por quanto tempo mais irei aguentar viver assim. Abaixo a cabeça até a altura dos joelhos e deixo as lágrimas escorrerem, sem fazer nenhum barulho de choro.

- Pega! - ouço Felipe falando.

Levanto o rosto e ele estava em pé, na minha frente, segurando um lenço na mão em minha direção.

Dois Caminhos (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora