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DANIEL

Talvez você nem saiba, mas o que fez comigo me ajudou a ser melhor.

(Vamos Seguir Di Ferrero)


Estou vasculhando os armários da cozinha quando escuto meu pai falar atrás de mim.

– O que está procurando? – ele não tem a voz severa, apenas curiosa e levemente preocupada.

Eu fecho a tampa do último armário onde estive mexendo e viro-me para ele.

– Chás. Eu estou tomando de vez em quando agora.

Ele assente com um gesto de cabeça.

– Sua avó comentou comigo.

– Foi?

– Na verdade, ela falou sobre uma lista de horários e itens importantes que você e ela fizeram juntos.

Eu sorrio, nostálgico. É verdade. A vovó quase me obrigou a fazer essa lista detalhada e fofa com todos os horários e informações úteis sobre minha nova rotina que meu pai e Sarah fossem precisar para me ajudar a cumprir tudo.

– Está na minha mochila – eu explico. – Posso te entregar depois.

– Podemos colar na porta da geladeira – ele sugere.

Gosto da forma como ele diz "podemos" ao invés de "você pode" ou "eu posso". Concordo com um aceno silencioso e viro-me para os armários outra vez.

– Aqui tem lavanda?

– Não – meu pai responde após pensar por alguns segundos.

– Erva cidreira?

– Não tenho certeza.

– Pêra?

– Você toma chá de pêra? – ele pergunta, surpreso.

– Suco – corrijo, sem olhar para trás.

– Ah.

– Iogurte? – Recomeço minha lista. – Granola? Aveia? Abacate? Laranjas?

– Temos laranja – ele interrompe. – Mas, por que está tão preocupado com isso agora? Achei que tivesse dito que fizeram uma lista.

– Eu só quero checar antes o que já tem. Também pensei em fazer alguma coisa para comer agora.

Quando olho para meu pai outra vez, ele está me observando com um olhar cauteloso, apertando levemente as pálpebras enquanto me examina. Eu olho para a bancada bem organizada da cozinha e passo a mão por ela rapidamente, depois pego um copo e ando até o outro lado do cômodo para colocar água.

Enquanto bebo, lanço um olhar de esguelha para meu pai, e ele continua me encarando. Não sei o que pensar disso, mas fico desconfortável.

– Você está ansioso – ele diz.

– Eu não... – Começo, mas então me interrompo, relutante. Eu disse a minha avó que faria as coisas certas dessa vez e, para isso, preciso ser sincero, por mais difícil que seja. – Um pouco.

Uma das coisas que estou trabalhando com a psicóloga é o negócio de esconder os sentimentos e emoções. Estava sendo fácil com meus avós, eles eram quase como pessoas novas na minha vida, após tanto tempo que passamos afastados. Mas com meu pai é outra história. Ele viu muito de mim e sabe muito sobre o que eu passei. Nos conhecemos a vida toda e não temos a metade da intimidade que construí com meus avós nos últimos cinco meses.

EmergidosOnde histórias criam vida. Descubra agora