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DANIEL

Eu vou começar novamente e encarar qualquer dor que vier. Hoje isso acaba, eu estou perdoando o que eu fiz. Eu vou enfrentar a mim mesmo para ultrapassar aquilo que me tornei.

(What I've Done Linkin Park)


Uma coisa interessante sobre estar na casa de praia é que eu nunca sinto tédio. Nunca. Seja porque me ocupo caminhando pela praia, assistindo o ritmo constante da maré, tomando sol na areia, ouvindo música na varanda ou apenas deitado numa rede e balançando enquanto o tempo passa.

Eu relaxo. Algo inédito, mas que aqui sempre consigo fazer.

Hoje, em específico, estou apenas uma parte relaxado. Meus dedos tamborilam sem parar contra minha perna, como perninhas que querem desesperadamente correr do compromisso que estou adiando.

Estou com o celular na mão, os números que digitei brilhando na tela, mas ainda não apertei a tecla para iniciar a ligação. O que eu vou dizer? Porque tenho a sensação de que, seja lá o que eu disser, vou ser julgado.

Isso é estúpido, pois ela é minha médica. Ela não me julga. Mesmo que seus olhos emitam diferentes tipos de brilho conforme ela anota informações interessantes sobre mim vez ou outra enquanto falo durante a consulta. Mas ela não estará de frente a mim desta vez, não verei seu rosto contido e seus olhos brilhantes avaliando cada reação que meu corpo reproduz, cada tremida ou falha em minha voz, cada piscada nervosa ou olhar desviado. E talvez isso seja ainda pior, porque vou estar imaginando.

Vou imaginar que, longe da minha vista, ela sorria ou faça cara feia, revire os olhos, aperte os lábios, se decepcione.

– Eu estou vendo a garota que eu amei, e não sei o quanto desse sentimento ainda existe. Um pouco, talvez muito – eu diria. É o que eu tenho para dizer.

Renata deve estar se preocupando com meus sentimentos em relação a morte e eu estou me preocupando com meus sentimentos em relação a Alissa.

Eu não estou pensando em minha mãe. Não de uma forma negativa. Pelo contrário, desde que cheguei, de vez em quando, tenho lembranças dela.

Eu a vejo caminhando pela varanda durante uma noite iluminada apenas pela lua, indo até a ponta da cerca, apontando para o mar e dizendo:

– Não tenha medo do escuro. E, se tiver, não grite por socorro.

– Por quê? – minha versão criança pergunta.

Sou um garoto de oito anos nessa lembrança. Estou sentado numa rede com Thalia, que ainda é Thalia, e é apenas alguns meses mais velha do que eu. Ela olha para minha mãe com expectativa, mal se aguentando sentada.

– Vocês sabem o porquê – uma Hanna alta e esbelta, de batom vermelho igual a cor que seu cabelo já possuiu um dia, nos encara de volta. – Ela vai farejar seu medo.

– A velha alma perdida? – Thalia provoca, ansiosa pela história. – Que aparência ela tem?

Minha mãe volta o olhar para a escuridão que leva até a praia antes de se aproximar de nós novamente e curvar seus ombros para frente, franzindo a testa e o nariz, arreganhando os dentes numa careta terrível e imitando garras com as mãos enquanto dá um rugido maléfico.

Eu e Thalia gritamos, mas depois rimos para aliviar a tensão.

– Ela parece com o seu pior pesadelo – mamãe diz. – É a personificação de todas as pessoas que já morreram afogadas nas águas dessa praia. Almas perdidas, sem descanso, que mal podem esperar para arrastar espíritos bons e inocentes para as trevas!

EmergidosOnde histórias criam vida. Descubra agora