10 - PARTE II

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DANIEL

Se um dia eu fiz você chorar, nem meses vão te recuperar. Te perdendo eu cresci tanto que eu não sei se eu quero mais te encontrar.

(Desde Quando Você Se Foi Fresno)


Sentada num chaise redondo repleto de almofadas, Lilo me observa com curiosidade enquanto passo por ela até o sofá suspenso do outro lado da varanda, a apenas 2 metros de distância de onde ela está.

Eu me deito no sofá e tiro o celular do bolso para checar a hora e procurar algum joguinho que possa me distrair durante o tempo em que ficarei aqui.

É tão ridículo o que estou fazendo, trocando o lugar e os momentos de socialização por um aparelho eletrônico viciante, que inclino minha cabeça para o lado, pensando em um assunto para puxar com Lilo, mas me surpreendo quando me deparo com ela ainda olhando para mim.

– E aí? – falo, para quebrar o gelo.

Ela semicerra os olhos e ergue uma sobrancelha, me lançando um olhar desconfiado. Pergunta:

– Por que você não foi com o pessoal?

Eu tenho a resposta pronta na ponta da língua.

– Não gosto do mar.

Mas Lilo é ainda mais rápida ao replicar, com justificativa:

– Mentira! Minha mãe disse que poderia ser bom você vir pra cá, porque você ama a praia.

Não é uma mentira, mas também não é uma verdade muito bem contada. Eu explico, ou tento:

– Eu gosto da praia, não do mar.

– Um pertence ao outro.

– Eu não... Eu achei que você tivesse deixado subentendido que por você tudo bem eu ficar aqui quando me deu aquela encarada antes de o pessoal sair.

Ela ignora minha reclamação, insistindo:

– Você não sabe nadar, é isso?

– Mais ou menos.

Ela abre mais os olhos e inclina sutilmente a cabeça para mim, como se estivesse pedindo mais explicações. Com um suspiro lento, eu digo:

– Eu não sei direito. Em piscinas fico numa boa, consigo sobreviver. Mas quando muda para a praia ou algum lago, rio, é outra coisa. Não é questão de saber ou não nadar, é que eu simplesmente não me sinto à vontade.

– Então não é medo de água, porque aí você não entraria em piscinas.

– Eu só não gosto de não saber onde estou pisando. Quando as águas são escuras e eu não posso ver o que há debaixo dela... meio que me dá uma sensação de pânico.

– Já falou disso com sua terapeuta? Sabe, só pra não perder a diversão com os amigos e deixar todo mundo te achando sem graça.

Eu devolvo meu celular ao bolso e a encaro por um longo tempo, observando os detalhes do seu roto bem desenhado e procurando qualquer traço de sarcasmo ou ironia, mas, mesmo com o brilho malicioso no olhar e a voz soando tão neutra que até parece tentar esconder outros sentidos para sua fala, não encontro nada que possa justificar a impressão quase negativa que tenho sobre ela. Sem mais opções, eu pergunto, falando sério:

– Por que será que você, até quando parece que não quer, consegue me incomodar de um jeito tão estranho?

Ela dá de ombros, sem parecer nem um pouco afetada. Na verdade, parece quase orgulhosa.

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