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ALISSA

Sinto a calma em volta de mim, o teu vento vem me perturbar. Me envolve, me leva daqui, me afoga de novo no mar.

(Você Sempre Será Marjorie Estiano)


Como fazer para parar de reviver uma mesma cena incessantemente em sua cabeça? A lembrança é tão real que mesmo que eu sinta um medo absurdo de ter imaginado tudo, sei que aconteceu, pois minha pele ainda formiga no lugar em que ele tocou. De vez em quando, eu fecho os olhos e passo os dedos bem de leve sobre minha própria pele, imaginando sua carícia outra vez.

Em meio a suspiros e sorrisos que escapam fora do meu controle, eu sou surpreendida por Nathan na varanda.

Estou aqui há tanto tempo que perdi a noção do tempo. Todos na casa estão comemorando a Noite do Baú, mais um evento tradicional das famílias Clarke e Vasconcelos. Não estou tão no clima, apesar de estar adorando a sequência de músicas antigas tocando no plano de fundo dos meus devaneios.

– Sonhando acordada? – Nate brinca, parando ao meu lado.

Estou de pé na varanda, encostada em um dos pilares de concreto que sustentam a lateral da casa - ou seria a frente? Estou na parte de trás, que dá vista para o mar.

Apesar de sentir Nathan ao meu lado, não olho para ele. Ainda estou chateada pelo que ele aprontou. Eu sei, por ter convivido com ele durante todos os últimos meses e presenciado cada momento das suas crises em meio a luta contra o vício em drogas, que é uma batalha difícil. Mas sei que ele estava há tempo suficiente sem usar nada a ponto de já ter poder de escolha. E ele escolheu ceder.

Ainda assim, não quero ignorá-lo, pois mesmo que não faça ideia do que passa por sua mente conflituosa, não quero deixá-lo magoado e frustrado e assim fazer com que ele volte a ter outras recaídas.

Com outro suspiro, este menos sonhador e mais cansado, eu tento dar um sorriso. Meus lábios se entreabem enquanto penso em algo inteligente e descontraído para dizer, mas as palavras simplesmente não saem.

Ouço a respiração de Nathan tornar-se mais intensa e sei que ele consegue sentir o meu desconforto. Forço minha mente ao máximo, procurando palavras que possa dizer e quebrar este clima tão estranho, mas elas não surgem.

– Desculpa, ok? – Natha fala baixinho, me surpreendendo ao tomar a iniciativa, pois não é algo que ele tem feito ultimamente. – Eu não sei o que passou pela minha cabeça.

– Não sabe. – Consigo falar, finalmente, e me repreendo por justo a primeira coisa que consigo dizer tenha que ser algo assim. Foi uma afirmação, mas quase em tom de pergunta, um julgamento.

Atrás de mim, Nathan continua, tão baixo quanto antes:

– Eu senti falta de alguma coisa... Não sei explicar. Estou bem, estou feliz, mas... Foi como se eu quisesse sentir um tipo diferente de adrenalina. Então eu bebi, depois fumei, e só Deus sabe o que mais eu poderia ter usado se Thalia não tivesse aparecido. Eu...

– Por favor, Nathan – eu interrompo, incapaz de continuar ouvindo. – Pare.

Eu ouço quando ele dá um passo, prestes a ir embora. Prendo a respiração, esperando. Não quero que ele vá, mas ao mesmo tempo é insuportável tê-lo tão perto e não poder fazer nada para melhorar nossa situação.

Nathan hesita e eu sinto sua indecisão, seu medo. Dói em mim também.

– Desculpa – ele diz, num lamento sussurrante que me parte ao meio. – Eu não queria decepcionar você nem ninguém.

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