Meditar era coisa nova para mim. O que isso significava? Pensar em uma mesma coisa o tempo todo até que se tornasse realidade? Ou pensar em nada -- o que me parece totalmente impossível -- e ver o que acontece?
Fiquei parada sozinha por um bom tempo revivendo os acontecimentos que despertaram em mim o sentimento de amor e paz. Mas era como se para cada pensamento que eu buscava, outro me invadia. Medo e arrependimento vinham sem convite, e o esforço para afastá-los parecia torná-los mais fortes em minha mente. Argh! Assim está difícil!
Levantei do chão e deitei em minha cama de pedra. Talvez assim, mais confortável, eu consiga resgatar a paz.
Deitei e me estiquei o máximo que pude, sentindo cada fibra dos meus músculos alongar e relaxar. Então, me concentrei em cada parte do meu corpo, sentindo o relaxamento dos pés até meu pescoço e então meu couro cabeludo. Tudo em meu corpo teria que estar relaxado para que eu continuasse.
Dessa vez permiti que minha consciência, que nesse lugar era mais livre e forte, me ajudasse a recuperar a condição de leveza e paz à qual Vulteran me havia apresentado.
Permiti que a névoa translúcida de minha consciência me envolvesse totalmente, como um véu que se expandia do topo de minha cabeça até meus pés.
Ao invés de constituir uma espécie de escudo que impedia os pensamentos de medo, julgamento e cobrança de chegar, ela simplesmente tirou de mim toda a resistência. Para quê resistir, se não havia ameaça iminente?
A sensação, a princípio, me trouxe um pouco de apreensão, mas eu deveria confiar em minha consciência... Em mim mesma.
E então, aos poucos, foi como se minha mente esvaziasse totalmente. Era como estar dormindo e acordada ao mesmo tempo. Era como mergulhar em uma folha de papel em branco.
Não demorou para que imagens frustrantes surgissem e então eu as ignorava e submergia mais fundo no branco, ignorando cada pequeno filme que trazia consigo arrependimento, dor e saudade como se eles não fossem meus, como se eles tivessem nada a ver comigo. E então, o branco me envolvia mais intensamente...
E o branco permaneceu em mim por um tempo que eu não poderia precisar, como o se o tempo em si não existisse ou não importasse.Aos poucos, lembranças de minha vida no morro e do convívio com cada pessoa desde a minha infância me visitavam docemente como se viessem trazer-me algo novo dentro do que já era conhecido. Como se retirasse um filme que encobria cada lembrança para que eu pudesse ver o que havia realmente em casa acontecimento.
E eu pude ver que em cada momento da minha vida havia amor... Doação... Serviço... Em cada sorriso de bom dia eu via amor... Cada criança brincando com brinquedos improvisados e suas gargalhadas despreocupadas significavam amor e esperança enchendo o ar da favela. Cada pote que carregava um pouco de comida dividida entre os vizinhos era também repleto de amor, doação e serviço.
Os atendimentos feitos por Davis e Claudia na ONG não focavam apenas em ajudar a resolver os problemas dos moradores que os buscavam, mas era a manifestação do amor que Davis e Claudia sentiam por aquelas pessoas necessitadas e de alguma forma exploradas.
E então minha consciência resgatava dentro de mim imagens que eu imaginava não haviam sequer sido registradas em minha mente. Eram cenas de pessoas comuns na rua compartilhando o guarda-chuva com estranhos quando a chuva chegava de repente... Eram cenas de pessoas dividindo o lanche com cães de rua... De pessoas que colocavam refeições bem embrulhadas dentro de lixeiras pois sabiam que eventualmente alguém buscaria entre o lixo seu alimento.
E em cada imagem, em cada cena, eu sentia o amor aumentando dentro de mim... Eu sentia como se a emoção que permeava cada um daqueles gestos intensificasse o que eu sentia, somando um ao outro e aumentando em mim, como se fosse somente isso que me preenchesse e nada mais importasse...
Então a cena nas memórias de Bruno que me mostraram o resgate dos humanos-gado dentro dos contêineres de metal, logo me encheu de amor... Eu amava a cada um deles através do Bruno. Da mesma forma, estavam cheios de amor os seres que partiram em naves de ataque em direção à grande nave de carga que se distanciava para entrar no buraco escuro.
Foi por amor que John Bernard havia renunciado à sua vida na Terra para auxiliar no resgate desses mesmos humanos, tornando-se um desertor.
Era isso que significava fazer parte da causa Shey... Amar incondicionalmente ao ponto de dar sua vida por seres que necessitavam de libertação e cuidados. Era essa a razão da existência da causa: amor, doação e serviço.
Nesse momento era como se tudo fizesse sentido em mim... Eu descobria o verdadeiro sentido da vida. Enquanto a programação Réptil incutia na mente dos seres na superfície da Terra que o sentido da vida era a posse e o poder perseguidos através da escravidão mental e física, eu entendia agora, que o verdadeiro sentido da vida é totalmente oposto a isso. E isso era totalmente libertador.
Aos poucos minha consciência permitiu que eu retornasse da imersão em minhas memórias, trazendo-me de volta ao que eu tinha em mãos: começar a viver de verdade.
===^.^===
Desculpem o capítulo curtinho e desculpem a demora em postar. Espero me redimir em breve.
O que estão achando da história? Deixem sua opinião nos comentários e não esqueçam de votar ;)
Obrigada!
VOCÊ ESTÁ LENDO
Nova Ordem (Livro #2)
Science FictionEm Nova Ordem, a sequência de Nova Drasskun, Brigitilene é agente da causa Shey infiltrada na Sociedade, o governo oculto. Ela terá que descobrir o máximo que puder para derrotar os opressores da Terra, enquanto controla a réptil dentro de si, a fim...