Prólogo

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"Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias."

Clarice Lispector

***

Bati a janela do meu quarto um pouco forte demais, os riscos de chuva ainda escorriam pelo vidro fazendo desenhos aleatórios e sem sentido que se desmanchavam segundos depois com a chegada do vento gelado. Às sete horas da manhã, a chuva fina e fria já molhava a cidadezinha de Rye, na Inglaterra.

A verdade é que eu adoro pensar em como somos minúsculos. É o meu pensamento matinal, aprendi com a minha mãe. Ela sempre falava sobre isso enquanto fazia minhas tranças nas manhãs antes do horário da escola. Arrisco dizer que é uma das coisas que eu mais sinto falta desde que ela partiu.

Ela costumava dizer que a Via Láctea é enorme e ao mesmo tempo pequenina comparada ao resto do universo desconhecido. Galáxia pequena, sistema solar ainda menor, e a Terra então? E o nosso continente? O nosso país? A nossa pequena cidade? Rye, cidade pouco conhecida no sudoeste da Inglaterra. Ruas de pedra, construções pitorescas, lindíssimas flores nativas. Casas enormes, muito antigas. Quem mora em Rye ou nasceu aqui ou não teve escolha. Cidade sem muitos atrativos usuais, a coisa mais animada por aqui é o barzinho chique com recitações de poemas, músicas ao vivo, e alguns saraus semanais. E claro, uma construção histórica literária: a Lamb House.

Pisquei enquanto olhava a janela, ouvi meu pai batendo a porta na sala, ele havia acabado de voltar da padaria. Suspirei pesadamente. Já era sete horas da manhã e ele já estava de pé novamente. Meu pai trabalhava muito, na loja que montou sozinho e que leva o nome da minha mãe, Angeles Sweetness. Nós não temos problemas financeiros, pelo contrário, eu tenho boas roupas, sapatos, já viajei pra lugares lindos e estudo numa escola bacana. Mas eu sei o quanto ele se esforça e o quanto ele tenta preencher todos os vazios que a minha mãe deixou

— Bom dia. — sorri quando abri a porta do quarto.

Papai estava com as mesmas feições levemente cansadas.

— Olá, minha querida. — ele sorriu de volta, indo em direção da cozinha. — Trouxe pão de mel.

Segui-o enquanto arrumava meus fios dourados e ralos num coque completamente errado e que iria desmanchar dali a dois minutos. Entrei na cozinha, o cheiro forte de café me fez fazer careta e sem hesitar peguei umas ervas cheirosas e pus água pra ferver. Chá é a minha paixão, outra coisa que aprendi com minha mãe.

— Philip chega hoje. — papai disse enquanto pegava a garrafa de leite na geladeira.

Eu estava observando a água ferver, franzi o cenho e olhei meu pai.

— O filho da sua madrinha. Lembra da madrinha Genevra, não é? A que vive em Londres? — ele puxou a cadeira da cabeceira da mesa, sentou-se nela bebericando seu copo de café com leite.

Assenti devagar, mergulhando as ervas na água fervente. Lembrei que papai tinha falado sobre a chegada desse menino há alguns dias.

— Genevra não vem nos ver desde o que aconteceu com a mamãe. Por que o filho dela está vindo pra cá mesmo? — perguntei desinteressada, não conhecia o garoto e tampouco me lembrava da minha madrinha.

Papai abriu a sacola que trouxe da padaria e tirou pãezinhos minúsculos de batata de lá.

— Aparentemente ela teve problemas com o garoto. Coisas que não podem afetar a imagem dela. E, bem, eu não iria negar a hospedagem.

As Treze Rosas BrancasOnde histórias criam vida. Descubra agora