A culpa é das estrelas?

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O dia estava quente e a sensação da grama nas minhas pernas havia deixado de ser refrescante há muito tempo. A sombra que eu havia escolhido não parecia suficiente para impedir que os raios de sol queimassem a minha pele. Minhas mãos suavam e deixavam vestígios no livro que estava em minhas mãos. Essa edição de o Morro dos Ventos Uivantes não poderia ter mais minha marca que isso. A leitura tinha quase uma cadência própria – havia feito no mínimo três vezes. Catherine e Heathcliff me davam nos nervos. Como podem ser tão imbecis? Eu não conseguia superar.

— Quem ainda lê esse livro? – uma voz feminina interrompeu a minha leitura. Por algum motivo a surpresa de ser abordada fez o meu estômago revirar. Endireitei a minha postura e me direcionei para aquela garota. Quem ela pensava que era para abordar estranhos assim?

— Eu ainda leio – respondi quase em um murmúrio.

Ela usava um shorts e uma camiseta de corrida, provavelmente era isso o que estava fazendo antes de me atrapalhar. Seu cabelo estava preso em um rabo de cavalo mal feito preso por um boné. Eu sentia a sua respiração ofegante e era possível ver o seu rosto ligeiramente suado. A estranha se sentou do meu lado e abriu um sorriso, como se achasse engraçada a situação. Por algum motivo senti meu estômago apertar um pouco mais.

­— Você já leu esse livro? – ela fez uma pausa e retomou – Olha, sem querer dar spoiler, mas esse é o romance mais conturbado que eu já li na vida. Não perca tempo.

Sorri. Eu sabia exatamente do que ela estava falando.

— Eu sei. Por isso estou lendo pela terceira ou quarta vez, não consigo entender como deu errado.

­— Quando a gente não assume o que sente, estamos sujeitos a nos tornarmos um Heathcliff da vida – ela esticou a mão – A propósito, me chamo Alice. E você?

Segurei seu aperto de mão e não pude deixar de conter um sorriso.

­— Júlia.

— Prazer em te conhecer, Júlia. – ela respondeu com um sorriso – Então você perde seu tempo relendo romances embaixo do sol?

— É o meu ponto de refúgio – encarei Alice por um instante – A propósito, nunca te vi por aqui.

— Como veria se fica com a cara imersa nos livros? – Ela não deixava de ter razão. De todas as vezes que eu visitava aquele parque, a maior parte delas (para não dizer todas) eu somente olhava ao meu redor ao chegar e ao ir embora. Esse era o meu tempo de qualidade no meio do furacão que estava a minha vida naquele momento.

— Tem razão – concordei.

Alice sorriu em resposta e rapidamente se pôs em pé. Passou a mão pelo corpo para eliminar a sujeira que a grama havia deixado em suas roupas e novamente tornou a olhar para mim.

— Preciso ir. Até qualquer dia, Júlia. Na próxima vez, leia algo produtivo.

— Por que você não traz uma leitura produtiva, então? – provoquei.

Alice soltou uma gargalhada e novamente senti meu estômago apertar. O que tinha de engraçado nisso? Por que eu me sentia assim?

— Vou pensar no seu caso. – piscou e saiu correndo em direção à pista de corrida.

O que havia acontecido ali? Eu sinceramente não sabia responder. Juntei as minhas coisas, guardei na minha mochila e comecei a me preparar para ir embora. O sol já estava quase se pondo e eu podia sentir o frescor da noite se aproximar. Finalmente, pensei comigo mesma. Comecei a caminhar em direção à saída do parque e toda a parte verde da cidade, passou a ser tomada por prédios em toda a parte.

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