PARTE 31

53 5 1
                                    

O vi empurrar Otávia e, em poucos segundos também tombei ao chão. Despertei em um lugar completamente diferente, desta vez amarrado sentado ao chão junto com alguém escorado em minhas costas, pude sentir suas mãos amarradas junto das minhas.

Uma dor de cabeça quase insuportável me tonteava, mas, uma coronhada é melhor do que um tiro, não sei se é correto dizer "melhor", mas algo próximo disso.

Senti o indivíduo às minhas costas se movimentar e, logo apertar uma de minhas mãos.

— Ei, me solta. Que está ai? — Estávamos tão amarrados um ao outro que era humanamente impossível que pudéssemos nos olhar.

O silêncio se manteve no ambiente mas, assim que respirei fundo pude sentir seu perfume.

— Seu cheiro é meio, único sabia? Não sei se me sinto mal ou, aliviado ao saber que é você. — Pude ouvir um riso um pouco abafado — Está amordaçada pelo jeito. Graças a Deus me pouparam de ficar te ouvindo discursar sobre sua beleza inabalável. — Logo senti suas unhas cravarem em minha mão.

— Ai! Caramba Alice. Eu só tô brincando — Me calei assim que vi Victor aparecer na penumbra.

— Olha só, vejo que os pombinhos acordaram. Desculpem a indelicadeza, mas sua outra namoradinha me obrigou a isso, Engomadinho. Infelizmente sua fidelidade a mim estava ferida e aparentemente, houve uma tentativa de avisar a outra pombinha que anda pousando e seu jardim, isso, aquela que eu tão sutilmente ...

— Não se atreva a menciona-la!

— Quanta mágoa. — o vi se abaixar em minha frente e segurar em meu rosto apertando minha bochecha, como quando somos crianças e aqueles tios insuportáveis acreditam por algum motivo que isto seja confortável.

— Onde ela está?

— Quem? A sua, ou a minha? Ou seriam as duas minhas?

— Otávia, idiota! Onde ela esta. — Ouvi um suspiro de Alice logo atrás de mim e já sabia que ela estava revirando os olhos, mesmo sem poder olha-la.

— Digamos que estou cuidando dela, como sempre cuidei.

— Se tocar nela eu..

— Você o que? Ein? Se desamarra e vem me bater? — Senti um leve tampinha em meu próprio rosto e logo o vi levantar rindo. — Se parasse de bancar o machão, nem estaríamos aqui. Você as colocou em risco. A culpa é sua, Engomadinho. — Deu as costas e desapareceu no escuro novamente

De fato, devo a admitir que a culpa realmente era minha, toda minha. Em meter-me e a todas elas nesta bagunça em que nem mesmo eu, se quer conseguia mais entender.

Depois de ficar alguns minutos em silêncio, me martirizando dentro da minha própria mente, pude sentir Alice segurando minha mão, mas dessa vez, carinhosamente. Sorri.

— De uma forma bem louca, por mais estranha que tenha sido nossa relação em todos esses anos e, por mais ausentes que tenhamos sido um na vida do outro, não sei. Por algum motivo muito louco mesmo, eu gosto de você. E sei que nunca digo, e provavelmente não volte a dizer, não sei se é a adrenalina do momento mas, me sinto bem quando está comigo. Mesmo que estejamos assim, amarrados. — Ela riu. — Acho que é isso, talvez estejamos amarrados um ao outro para o resto da vida e, talvez eu nunca mais vá encontrar uma amiga como você. E eu meio que te odeio por isso.

O silêncio voltou a vingar assim que parei de falar e, senti seu polegar acariciar minha mão. Não precisei de respostas. Pela primeira vez, sem palavras, senti sinceridade e paz em uma "conversa" entre nós dois, como tinha de ser.

Quando estávamos quase pegando no sono vi umas luzes fazerem claridade em meio a escuridão. Cutuquei Alice para que despertasse.

— Ei, olha só.. parece uma luz de sirene não parece? — Sussurrei. — Consegue levantar? Acho que a gente consegue chegar até aquela janela. — Consegui perceber que ela balançou a cabeça de forma positiva. Okay, no 3 a gente levanta. Se apoia em mim e eu vou me apoiar em você. 1..2..3 — e levantamos juntos. — Isso, muito bom, agora vamos até ali devagar.

Andamos até a janela e de fato, duas viaturas policiais estavam paradas e, alguns policiais vasculhavam o local. Uma figura familiar apareceu em meio aos policiais e, senti meu coração fraquejar ao percebe-la.

—Sarah.. — Senti Alice me cutucar ao falar um pouco alto. Logo ela deu jeito de me fazer virar na direção de um vidro quebrado e eu logo entendi. — Boa Alice, anda, vamos lá. Acho que da pra cortar a corda.

Andamos novamente sem fazer barulho e assim que pegamos o vidro voltamos a sentar da mesma forma que estávamos. Enquanto eu passava o vidro pela corda pude senti-lo também cortando minha pele.

— Droga! Caramba isso dói. — Consegui soltar primeiro minhas mãos e depois, da Alice.

Assim que conseguimos levantar ela tirou a fita que a impedia de falar e, avançou em minha direção me dando um abraço longo e apertado.

— Ei, a gente vai sair dessa.

— Eu também.

— Você também o que?

— Também gosto muito de você! — Acabei sorrindo involuntariamente e logo me afastei um pouco a olhando

— Eu sei que gosta, encrenca. Mas agora vamos sair daqui, tá bom? — Segurei uma de suas mãos e quando ia puxa-la para partirmos ela antes o fez.

— Sua mão, Anthony. Você se machucou.

— Está tudo bem, depois cuidamos dis... — Parei de falar quando Victor voltou correndo e abaixado ficando fora do alcance das janelas. Me pus na frente de Alice na intenção de protege-la.

— Eu vou matar aquela desgraçada, sabia que ela ia ferrar com tudo. — Ele se aproximou de nós dois e dessa vez pude perceber seu olhar se voltar para Alice. — Você! Vem aqui. — Ele a puxou e quando tentei impedi-lo o vi sacar um canivete do bolso e lava-lo até seu pescoço.

— Ei ei ei, você já está indo longe demais Victor. Vai fazer o que? No que isso tudo vai te levar? Vai matar a gente ou o que? No ultimo mês você cometeu crimes o suficiente pra passar a vida inteira na cadeia, ou ao menos parte dela. Não piora a situação cara.

— Você não vai me dizer o que fazer engomadinho! — Em meio aos gritos de Victor, de repente o barulho ensurdecedor de tiros contra a porta e, sei lá quantos policiais invadindo o local.

— Não! Ele vai machuca-la. — Foi só isso que eu consegui gritar e, em seguida passei a observar detalhadamente a situação buscando uma saída. Por fim lembrei do vidro caído atrás de mim, utilizado para nos soltar. Logo olhei para um dos policiais e fiz um discreto sinal, ele entendeu.

Levaram breves 8 segundo, no máximo, para tudo acontecer desde então.

Um disparo fez Victor se distrair dando espaço para que Alice fugisse de suas mãos e, assim que ele avançou para vir até mim, peguei o vidro e antes que eu pudesse pensar já estava feito. Ele tombou.

Ah não! Aquela tontura e a vontade de vomitar voltaram. Droga.

Vi Victor tombar, primeiro de joelhos, me encarando ainda com aquele olhar frio e o sorriso psicótico no rosto, logo depois ir ao chão com toda sua extensão. Deixei o vidro cair e muito de longe pude ouvir o som do mesmo quebrando.

— Não... não não não não não! — Me pus de joelhos ao seu lado e levei minhas mãos fazendo pressão no ferimento. — Segura firme, você vai sobreviver.

Aquele sorriso ainda estava posto em seu rosto. Uma lagrima correu de seus olhos e pude vê-lo olhar para mim.

— Não quer sujar suas mãos de sangue, Doutorzinho? — Sua voz saiu baixa em meio a muito esforço.

Logo fui agarrado por trás e arrastado para longe por sei lá quem, para sei lá onde. Só sei que como sempre, desmaiei.

Café, insônia, mistério e... Londres?Onde histórias criam vida. Descubra agora