24 - Dolores Frank

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Ainda tento assimilar tudo que aconteceu com a gente naquela festa. Depois de ter visto Kay, todas as lembranças parecem um borrão na minha mente, apesar de tudo ter acontecido há no máximo 10 minutos. O rosto e o sorriso de Charlie enquanto aqueles dois caras me seguravam sem que eu pudesse fazer nada além de gritar, era algo que com certeza ainda me traria pesadelos. 

— VOU PROCURAR UM TÁXI! — Cristina levanta cambaleando, mal consegue ficar de pé. Quando vejo seu rosto, noto que seu nariz está quebrado.

— CRISTINA! 

Ela anda até o outro lado da rua, poucos carros passam. E o que faríamos depois? Levaríamos Edith para um hospital e os pais dela nunca mais deixariam que eu me aproximasse?

Deito Edith de lado para que ela não se engasgue, percebo que seus olhos estão entreabertos e os movimentos ficaram mais lentos. Talvez passe, mas ela sofreu muito antes disso. Foi o meu plano, foi minha culpa. Do outro lado da rua, Cristina pede carona para todo carro que passa, mas ninguém para o carro para uma menina com o rosto sangrando.  

Um minuto. Dois minutos. Talvez tudo tenha durado apenas cinco segundos mas para mim, foram horas. Cristina volta quase correndo. - Consegui carona. - Edith, com a cabeça sobre meu colo reduziu sua convulsão a leves tremores no corpo. Passou. Mas ela não diz nada, apenas me encara com um olhar concentrado, não tem forças para falar mas sei que está lutando para controlar os leves espasmos nos braços e nas pernas. 

— Dolores, eu consegui carona. 

Cristina me ajuda a levantar Edith, carregamos ela até um carro vermelho parado do outro lado da rua. 

— Você melhorou? — Edith não responde, mas olha para o nariz quebrado de Cristina com uma expressão preocupada. 

Entramos no carro, uma jovem de cabelo colorido, sentada no banco de motorista pergunta para qual hospital queremos ir. 

— Eu quero ir pra casa — Edith diz.

Eu e Cristina a encaramos, seu olhar está suplicante.

Ela não queria que os pais soubessem que teve uma convulsão na primeira festa que foi, e eu também não queria que eles me obrigassem a me afastar.

— Lá eu tenho tudo de que preciso, Dolores. 

— Eu acho que a moça aqui precisa mesmo ir ao hospital. — A jovem entrega alguns lenços de papel a Cristina, que limpa o sangue das mãos e do nariz. 

— Você pode deixar a Dolores e a Edith em casa primeiro? Eu agradeceria muito. 

— Tudo bem. 

Cristina diz a jovem o endereço da casa de Edith, que finalmente consegue ficar sentada sem a minha ajuda.  

— Como você está? 

— Eu sou a idiota que quase matou todas nós. Eu deveria estar perguntando como você está.

Passamos o resto do caminho em silêncio, mas sei que nos pensamentos nós três estávamos gritando. O carro para na frente da casa de Edith, ajudo ela a descer e falo com Cristina pela janela. 

— Você vai ficar bem?

— Eu ligo pra você.

— Desculpe...

Não pudemos falar mais nada sem que a jovem que nos deu carona desconfie. Cristina aperta minha mão por um instante, sei que aquela é sua forma de me dizer que está tudo bem. 

Paço meu braço pelo ombro de Edith e observamos o carro se afastar na rua escura.

Foi minha culpa.

— Não quero que eles saibam — Edith diz, quando o carro some. Sua voz está firme, mas sei que mal aguenta ficar de pé. Desamassa o vestido e arruma o cabelo, encarando com certo receio a porta de casa. 

— Você consegue esconder? 

— Não tenho mais certeza se consigo fazer nada. Mas é importante pra mim que meus pais achem que correu tudo bem, foi a primeira vez que sai sem eles. Não quero que percam a confiança...

— Eu entendo.

— Me desculpe.

— A culpa foi toda minha. Eu não devia ter deixado você ficar perto da Charlie, ela machuca as pessoas.

— Não foi sua culpa.

Edith sorri para mim uma última vez antes de entrar em casa, posso ver que seus pais estavam esperando.

Eles não ligaram nem uma vez. 

Saio antes que um deles me convide para entrar. Ando até minha casa em passos largos, desejando mais do que nunca deitar e dormir, mesmo sabendo que isso não vai me fazer esquecer. Procuro meu celular na bolsa, eu ainda tinha as fotos das drogas e da bebida na festa dela. Não era o suficiente, mas ela tinha que pagar pelo menos um pouco pelo que fez com minhas amigas. 

Charlie Tem Que Morrer | Completo Onde histórias criam vida. Descubra agora