16 - Cristina Stevens

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— Eu vou buscar a mamãe, já está tarde.

O relógio marca quase meia noite, Isabel para de brincar com as bonecas e olha para mim.

— Agora?

— Sim, já era pra ela ter voltado há duas horas, deve ter se metido em confusão.

Isabel guarda os brinquedos dentro de uma caixa.

— já está tarde, porque não vai dormir?

— Não consigo dormir quando ela está daquele jeito, tenho medo.

— Eu também, mas é melhor do que você ficar acordada gritando.

Isabel abaixa a cabeça, todas as vezes que aquilo acontecia minha mãe a chamava de bastarda e de coisas terríveis. Proteger minha irmã era minha prioridade, e assim que eu tivesse idade para me virar, levaria ela para longe dali. Mas até lá tinha que lidar com os "problemas" que a minha mãe trazia naquelas noites em que ela passava dos limites.

— Só tranque a porta do quarto, talvez dessa vez não seja tão ruim.

Me preparo mais mentalmente do que fisicamente. Fazia algumas noites que ela não demorava tanto, e isso nunca era uma coisa boa.

Chego no bar onde ela trabalha, desvio de vários bêbados que me proferem cantadas baratas e tentam tocar em mim. Eu já passava por aquela situação desde que comecei a ter consciência de que depois das onze tinha que ir até lá e trazer ela pra casa, antes que algo pior acontecesse.

— Mãe? 

Minha mãe está com a cabeça deitada sobre uma das mesas, o uniforme de garçonete sujo e molhado de cerveja e vômito.

Sim, vai ser bem pior do que eu pensava.      

— Cristina?

— Vamos pra casa. 

Ajudo ela a levantar.

— Você é o meu erro preferido.

— E você está deplorável.

Tiro ela do bar a força, os olhares que nos lançam na rua enquanto voltamos para casa são perturbadores, alguns de pena, alguns de nojo. Minha mãe ri para algumas mulheres e diz boa noite, como se a careta delas fosse a coisa mais normal do mundo.

— Por que você faz isso? 

— Porque a vida é minha.

Chegamos em casa, olho para o quarto de Isabel e torço para que ela tenha dormido, mas a luz acesa me diz outra coisa. 

— Onde está o meu segundo erro preferido?

— Deixe ela em paz, mãe. 

Minhas palavras não adiantam. Mamãe cambaleia até a porta do quarto e tenta abrir, felizmente está trancada.

— Sabe o que eu não gosto em você? Que você tem os olhos do desgraçado do seu pai!

— Pare, por favor.

Era sempre assim, ela sempre descontava em Isabel e ela sempre chorava.

Arrasto ela até seu quarto, tentando ignorar as coisas que ela diz enquanto a obrigo a se deitar na cama.

— ESTÁ LOUCA? VOCÊ NÃO PODE ME TRATAR ASSIM! — diz enquanto tenta me bater.

— Eu vou trancar a porta, e só vou abrir de manhã quando tiver parado com isso. 

Bato a porta com força e tranco, abafando os gritos da minha mãe. Corro até o quarto da Isabel e bato na porta.

— Pode abrir, sou eu.

Como eu esperava, ela estava chorando.

— O que ela está dizendo?

— Nada, não ligue para ela.

— Você pode dormir aqui?

— Posso.

Coloco meus fones de ouvido nela para que não escute os gritos, em alguns minutos ela ficaria cansada e pararia de falar, mas até lá era melhor que Isabel não escutasse o que estivesse dizendo.

Coloco uma música para Isabel e recebo uma mensagem no celular, é de Dolores. 

Sei que já é tarde, mas tive uma ideia. Charlie convidou Edith para a festa, e ela vai. Vamos aproveitar a oportunidade para conseguir provas. 

Apago a mensagem sem responder. Naquela noite eu já tinha muitas coisas para me preocupar. 

Charlie Tem Que Morrer | Completo Onde histórias criam vida. Descubra agora