19 - Cristina Stevens

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Dolores? — Recebo uma ligação dela um pouco antes do almoço. Dolores me explica rapidamente que Edith aceitou o plano.

— Certo, que horas vamos?

— Só isso? Não vai me dizer: Parabéns Dolores, por ter enfrentado o senhor Nash!

—Não tenho tempo, estou trabalhandi — grito, em meio ao barulho de secadores de cabelo e mulheres falando.

— Que horas você sai?

— No final da tarde.

— A festa começa as dezoito horas, não vai dá tempo.

— Digamos que não vou perder tempo me arrumando...

— Precisamos conversar sobre o plano. Pode sair mais cedo?

— Não.

Tudo bem, eu podia colocar muita coisa em jogo para fazer Charlie pagar pelo que fez a Patrícia, mas não minha própria pele ou a da minha família. Edith tinha sido insensata em aceitar aquilo. Talvez eu devesse tentar descobrir se Dolores a obrigou. A verdade é que eu nunca teria aceitado.

— Vá para a casa da Edith assim que puder. Te esperamos lá.

Desligo o celular e continuo tentando trabalhar, mas passo a maior parte do tempo fugindo da supervisora ou limpando o mesmo lugar pela décima vez. Tudo o que penso é em como eu vou lidar com minha própria consciência caso algo terrível aconteça com Edith.

Consigo sair um pouco mais cedo, me arrumo o mínimo que posso, considerando a situação tenho vontade de usar roupas pretas e um colete a prova de balas.

— Cristina, você vai sair essa noite?

— Sim.

— Não quero ficar sozinha com a mãe. Hoje é sábado, e ela não trabalha no final de semana.

— Eu preciso ir, querida.

— Me leve com você.

Cada vez que Isabel demonstrava todo esse medo que sentia da nossa mãe meu coração apertava. Mas era algo que eu entendia, na idade dele o medo também era meu amigo constante e eu não tinha uma irmã mais velha para me proteger.

— Não posso te levar. Talvez a mamãe não beba hoje.

— Ela já bebeu.

Levo Isabel para o quarto dela.

— Eu tenho uma ideia. Espere aqui.

Vou até o quarto da minha mãe na ponta dos pés, escuto ela encher mais um copo na cozinha. Aquilo ainda ia se estender por muito tempo se eu não fizesse algo, não podia sair e deixar Isabel naquela situação.

Abro a gaveta da cômoda velha e suja e afasto algumas roupas para o lado, pego algumas caixas de remédio e leio os nomes rapidamente, sempre com a atenção na porta do quarto.

Clonazepan. Tiro dois dos comprimidos da cartela e guardo as caixas no mesmo lugar.

— Mãe?

— Por que está arrumada?

— Vou sair com uma amiga.

— No meu tempo as crianças pediam permissão aos pais quando iam sair.

— Eu não sou mais uma criança, e a senhora não é tão velha assim.

Mamãe entra no meu jogo, começa a falar compulsivamente sobre como as coisas mudaram desde que tinha minha idade. Aceno com a cabeça e finjo prestar atenção no que ela fala, pego uma colher e esmago os dois comprimidos, ela se perde nas próprias palavras e não percebe nada.

— A senhora tem toda a razão. — Sorrio. Mamãe continua com seu falatório.

Pego um copo limpo e encho com o conteúdo de uma das latas de cerveja, sinto nojo apenas ao sentir o líquido respingar na minha mão.

— Você vai beber? — pergunta despreocupada.

- Não.

Ela se distrai abrindo outra lata, aproveito a oportunidade e despejo o pó dos comprimidos dentro do copo. Coloca a colher em um canto e misturo rápido, com o próprio dedo.

— É para você. — Entrego o copo a ela.

— Obrigada. — Mamãe deixa a lata de lado e bebe do copo que eu lhe dei.

Eu já tinha feito aquilo mil vezes desde que aprendi o truque, mas não conseguia deixar de me sentir culpada. Continuo puxando assunto e a ouvindo falar sobre qualquer coisa enquanto espero que o remédio faça efeito.

Olho para o relógio e respondo algumas das mensagens de Dolores, desesperada pelo meu atraso. Meia hora depois, mamãe começa a reclamar do cansaço.

— A senhora que ir para a cama?

— Quero, sim.

Ajudo ela a ir para o quarto, poucos segundos depois de deitar ela cai no sono. Coloco um cobertor sobre ela e fecho a porta.

Você é uma filha exemplar.

— Pronto — vou até Isabel — Ela dormiu.

— Você volta logo?

— Não sei, querida. Mas não se preocupe, ela não vai acordar.

Me despeço de Isabel e corro até a casa de Edith. Dolores está me esperando na porta.

— Desculpe... — começo a falar.

— NÃO DIZ NADA — grita.

— Se eu demorei, tive meus motivos.

Edith sai segurando uma pequena bolsa de pérolas contra o peito, usando um vestido que tinha sido claramente emprestado por Dolores e uma maquiagem muito pesada.

Como um cordeirinho para um lobo.

Você está bonita, Edith.

— Eu estou estranha.

Dolores atravessa a rua e procura um táxi.

— Caso tudo dê errado e eu tenha uma convulsão. — Edith me entrega um frasquinho com um liquido amarelado e uma seringa.

— O que é isso?

— Vai me fazer parar. Eu confio em você.

— Não é com uma convulsão que eu estou preocupada, Edith.

Guardo a seringa e o frasco dentro da minha bolsa, torcendo com todas as forças para que não precise usá-los.

— Vai dá tudo certo — sua voz me passa confiança.

— Vamos!

Dolores nos chama de dentro de um táxi, corremos juntas e entramos na parte de trás do carro.

— Você pode pagar, Edith? Eu pago a volta. — Dolores sorri. Sua voz estava histérica.

Se Edith estava calma, Dolores estava morrendo de medo.

Clonazepan é um medicamento do grupo de benzodiazepinas, indicado para o tratamento de diferentes condições de saúde, como ansiedade e insônia. Produz efeito sedativo.





Charlie Tem Que Morrer | Completo Onde histórias criam vida. Descubra agora