A R I A
Naquela noite, foi a primeira vez que eu sonhei naquele tempo.
Meu sonho começou normal, eu finalmente estava em casa e não poderia ter ficado mais feliz com isso, porém, logo a imagem se borrou e eu estava naquele mesmo córrego que lembro ter acordado.
Olhando em volta agora, percebo que ele tem as margens de um rio e a aguá que corria não passava dos meus tornozelos. Começo a descer o leito e a água vai subindo cada vez mais, até que vejo que eu teria que ir pela margem, a não ser que quisesse nadar.
Saio e vejo com grande alívio que minhas roupas ainda eram as minhas, e não os vestidões. Continuo andando, mas paro ao escutar vozes.
- Temos muito o que agradecer esse ano! - Temos, subconsciente? Resmungo mentalmente e resolvo continuar o meu caminho, afinal, era o meu sonho.
Chego numa espécie de clareira, onde tinham muitas pessoas daquele tempo em volta do rio, algumas cantando, outras parecendo que rezando. Todas estavam felizes.
- Aria, por que o seu marido não veio? - Franzo a testa e abro a boca para responder o senhor que me perguntou isso, porém algo passa por mim como se eu fosse feita de nada e um segundo depois estou me vendo a minha frente, condizente com as roupas da época.
- Ele acha que isso tudo é uma grande superstição. - A outra eu responde, porém percebo que ela não fala isso com chateação e sim com carinho. Ela não estava chateada por ele não acreditar nessas coisas, parecia até achar divertido.
- Eu imagino, o Malik sempre foi cético. Eu lembro de seu pai querendo o levar para igreja, porém ele ficava questionando o padre a cada cinco minutos. - De novo, não tinha julgamento da parte de nenhum dos dois, apenas carinho. O que vamos combinar, era estranho.
Eu poderia não saber história, porém até eu sabia que antigamente a igreja era considerada, literalmente, sagrada. Não podia contestar a igreja assim e continuar tudo certo. Porém, quem era eu pra julgar? Isso é apenas um sonho.
Você tem certeza?
Automaticamente eu me viro, dando uma volta completa no espaço e olhando apenas rostos felizes. Nenhum me encarava ou parecia ter referido a palavra a mim. Estranho.
Continuo andando no meio do povo e encaro a outra eu, alheia a mim. Ela, ou eu, eu já não sei mais, estava usando o mesmo vestido que eu lembro estar vestida no dia que eu tinha brotado nesse século. Confesso que ela conseguia se mover com muito mais graça do que eu.
Me inclino e penso em tentar falar com ela, porém, de novo, o sonho embaça e eu estou na "minha casa". Dessa vez, eu escuto risadas, vindo do quarto que era o do Eddie.
De novo, resolvo me aproximar.
- Zayn, não sabemos se é um menino. - Minha voz, que não era minha, fala divertida e eu entro no quarto, achando uma cena que eu nunca pensava que veria na vida.
Uma versão de mim grávida. Era, literalmente, uma das coisas que eu mais temia na vida. A responsabilidade de ter uma criança era um peso que eu não estava a fim. Apenas por garantia, passo a mão na minha barriga, sentindo ela sem nenhuma curva a mais. Graças a Deus.
- Mas vai ser um menino. Eu tenho certeza. - A Outra apenas sorri e dá de ombros, como se fosse uma discussão perdida.
- Mas, se for uma menina...
- Não vai ser, eu tenho certeza. - Zayn responde e continua dobrado as roupas, convencido.
- Se for, ela terá que usar roupas de menino.
- Ainda bem que ela não vai ser, então. - Até eu eu estava sorrindo do jeito que ele estava obstinado ao dobrar as roupinhas.
Eddie estava ali para provar que ele estava certo, no entanto.
Como eu ainda achava que o sonho me pertencia, tento interagir com a cena e, de novo, ela some na minha frente como se fosse feita de fumaça.
Eu não podia interagir com as cenas. Nenhuma. Cada vez que eu me aproximava de uma, ela sumia
Suspiro quando outra imagem se forma na minha frente. Porém, essa era a mesma do inicio, mas mais sombria. Bem mais sombria. A sensação de felicidade e paz que eu lembro ter presenciado foi preenchido por medo e angústia. Até a cena em si parecia mais escura, o sol não estava mais presente.
- Corram! - O que?
Escuto apenas isso e em questão de segundos sinto vários corpos passarem pelo meu, correndo desesperados. Percebo pela primeira vez que esta chovendo e mesmo com o meu corpo de "gelatina" consigo sentir os pingos fortes.
- Aria! - Eu?
Percebo que não quando vejo o senhorzinho para de correr e tentar impedir a eu variada de voltar para o rio, agora bravo. Eu nunca tinha visto um rio assim antes, nenhum doido tentaria voltar pra ele. Nenhum doido, a não ser a eu variada.
- Volte aqui!
Enquanto o senhorzinho gritava e a Outra voltava pro rio, consegui ouvi um grito de socorro. Era uma voz fina de criança, e vinha do inferno que estava aquele rio.
Prestando atenção agora, vi uma pequena cabeça subir e logo ser submergida de novo embaixo d'água.
- Aria, saia daí! - Mais uma vez, ela ignora o aviso e percebo a dificuldade que ela estava ao tentar se manter em pé, contra a correnteza e a água que estava em seu peito. Ela vez ou outra também afundava, porém quase comemoro ao ver que ela alcançou a criança, mas vemos ao mesmo tempo que ela não conseguiria sair dali com ela.
Olho desesperada para ela e em seguida pro rio e, de novo, vemos ao mesmo tempo a onda gigantesca de água vindo. Seu olhar passa desesperado pela margem em sua frente, porém dessa vez ela não passa por mim como se não estivesse me enxergando e sim com esperança.
O que eu poderia fazer?
Olho de novo para a água se aproximando e taco o foda-se. Era um sonho. Pulo no rio e a água fria me pinica, parecendo me acertar nos ossos.
- Salve ela! - Percebi que, por mais que eu sentisse a água, ela não tinha efeito algum sobre mim, apenas passava e me deixava continuar em pé.
Sem pensar duas vezes, pego a criança de seus braços e consigo sair tão rápido como entrei, a criança me olhava hipnotizada, como se não acreditasse no que estava acontecendo. Ao deixa-la numa distância segura do rio, resolvo voltar.
Eu poderia salvar a outra, nem que fosse no sonho.
Tento voltar para a água, mas assim que entro, a onda me engole, junto com a Outra. Eu estava me afogando ao mesmo tempo que não sentia nada. Muitas coisas estavam acontecendo de uma única vez, eu não conseguia distinguir nenhuma outra sensação ou visão, apenas um clarão de luz que encerrou meu sonho.
Então, eu acordei.
No escuro do meu quarto.
Você selou o seu destino.
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Beyond Time - Zayn Malik
De TodoCom uma das piores tragédias do ano de 2025, muitas pessoas ficaram desaparecidas e raramente foram encontradas. Uma dessas pessoas foi Aria Moroe, uma estudante de medicina de 22 anos, que foi arrastada pela água como muitos outros. Naquela manhã...