Ruggero

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Março de 2017

"O que aconteceu naquele barco, Ruggero Pasquarelli?"

Que inferno!
Atiro o celular em cima da cama e passo a mão pela nuca.

Eles não param de publicar essas merdas. Já faz dois anos e ainda tocam nesse maldito assunto como se tivesse sido ontem. Como se não doesse lembrar.
Abutres miseráveis!

− Ruggero? – A voz da minha mãe preenche o ambiente e mesmo de costas eu sei que ela acabou de entrar, pois ela não sabe pedir licença. – Filho, acabei de ler a matéria daquele tal de Cláudio Guerra.

Giro nos calcanhares e coloco a mão na cintura.

− E daí? Eu também li. – Dou de ombros.

Mamãe me olha com seus olhos de águia pintados de preto – afinal ela adora muita maquiagem, muita jóia e muita cor – e balança seu braço magro.

− E como está tão calmo assim? Devíamos ligar para o seu advogado.

Até parece que os advogados conseguem dar jeito nessa maldita imprensa. Quanto mais meus advogados falam, mais assunto rende. Assunto do qual eu sou sempre o vilão. Já desisti a muito tempo de tentar provar algo.
Que pensem o que quiserem.

− Não me importa, Antonella.

− Odeio quando me chama de Antonella! Me chame de 'mamãe' como sempre chamou. – E então ela faz bico e parece uma criança mimada.

Na verdade, minha mãe foi uma criança mimada mesmo. Ela sempre teve tudo o que quis, até se casou com o homem que queria no momento, mas aquilo não era amor e o casamento dela com o meu pai durou só o suficiente para eles brigarem sempre que se encontram, por qualquer coisa que seja.
E eu já vivo cansado disso.

− O que você quer aqui hoje? – Indago impaciente.

Ela ajeita uma das três pulseiras que traz no braço esquerdo.

− Vim ver o Tomás e saber se ele queria ir comigo até o shopping, mas seu filho é um bicho do mato. – Reclama. Como sempre. – Acredita que ele quase não abriu a boca para me responder? Olha, esse menino já tem sete anos, está na hora de aprender a falar direito.

Meu filho. Tomás. Está ai um assunto que eu evito.
Apesar da pouca idade eu sei que ele entende que eu não tenho cabeça para estar o tempo todo o paparicando. Vivemos bem. Ele no quarto dele com todos os brinquedos que o dinheiro pode comprar e eu com meus pensamentos e os contos que a minha editora insiste que eu entregue todo inicio de mês para suprir os livros que deixei de escrever.
No fundo, Tomás me entende.

− Deixa o garoto em paz. – Encerro o assunto e vou até a minha escrivaninha buscar meu notebook, porém minha mãe vem atrás de mim e começa a falar de novo.

− Ele não é um garoto qualquer, ele é seu filho e você deveria dar carinho a ele, sabia?

− Eu dou tudo que ele precisa e ele está bem. – Contraponho já sem paciência.

Eu sabia muito bem como criar o garoto e ninguém tinha que se meter.

− As crianças precisam de ar livre, de diversão, de curtir com os pais e não de ficar trancafiado numa mansão que mais parece uma prisão!

Viro-me para encará-la e aperto o notebook contra o meu corpo com força.

− Tomás está muito bem e você não tem que se meter na criação do meu filho!

− Que criação, Ruggero?! Que criação é essa que você está dando se você nem olha no olho do menino?

Umedeço o lábio e passo por ela para ir até a porta, mas paro no meio do caminho e me viro para olhá-la.

Nos Seus Olhos (Volume 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora