Ruggero

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Tomás nunca havia me pedido nada, muito menos se apegado a alguém que não fosse Marg ou... Cristina. Meu filho quase nunca abria a boca e tão pouco abraçava alguém – ou talvez abraçasse... Eu não o conhecia tão bem assim.

Passo a mão pelo rosto e vou andando na direção de Karol para falar com Tomás, porém desisto no meio do caminho ao notar um olhar de medo do meu filho.
Tomás tinha medo de mim? Não faz sentido.
Paro no meio do trajeto e ponho as mãos na cintura.

− Esse assunto não diz respeito a você, garoto. – Digo.

Karol se agacha e fica quase da mesma altura que ele; ela segura na cintura dele e o olha nos olhos. Meu filho não olha com medo para ela.
Tomás parece tranquilo.

− Sinto muito meu pequeno, mas seu papai e eu não...

Antes que ela acabe de falar, Tomás se joga em seus braços e contorna seu pescoço com os bracinhos finos e languidos. Ele esconde o rosto nos cabelos castanhos de Karol.

− Fica, Karol. Fica. – Implora com a voz abafada. – Eu vou me comportar.

Marg me olha com expectativa e aponta para ambos que estão abraçados e aparentemente totalmente alheios a situação.
Cruzo os braços sem saber muito bem o que fazer com as mãos e comigo mesmo. Sinto-me deslocado.
Eu nunca soube reagir aos rompantes de emoções de Tomás.

− Tomás, vai com a Karol beber um pouquinho de água que eu vou conversar com o seu pai. Certo? – Marg diz, já que eu fico mudo. – Por favor.

Karol se levanta e coloca meu filho no colo, ela limpa o rosto úmido dele com a palma da mão e afasta os cabelos que caem sobre os olhos marejados do garoto; ela não me olha, nem sequer diz nada, apenas assente para Marg e sai fechando a porta atrás de si.

O ar do quarto fica pesado e um nó está se formando na minha garganta.
Porque eu não reagi? Porque aquilo me... assustou?
Minha respiração acelera e fico encarando a porta.

− Ruggero, meu menino, você precisa entender que Karol não fez o que fez por maldade.

Pisco os olhos uma, duas, três vezes para me situar e, por fim, viro-me para Marg que me encara por trás de seus óculos redondos que parecem grandes demais para seu rosto magro.
Respiro profundamente.

− Ela não me respeitou, Margarida. Ninguém mais me respeita! – Me justifico. – Uns tiram fotos como se eu fosse uma aberração, outros escrevem o que querem na internet e tem aqueles que picham o muro da entrada me chamando de assassino... Você acha que isso é fácil? Acha mesmo que eu ainda posso acreditar que há alguém nesse mundo sem maldade?

O maldito nó na minha garganta cresce e fica quase impossível engolir, por isso dou a meia volta e caminho até a janela aberta que parece pouco atraente já que lá fora o dia está cinza.
Ouço Marg suspirar pesadamente.

− Karol veio do interior, vivia entre animais e a natureza. Ela tem o coração puro e alma livre, não pensa mal de ninguém e você já reparou nos olhos da menina? São límpidos como a água do mar. Tenho certeza que ela jamais iria querer ser maldosa com você ou com o Tomás ou com qualquer outra pessoa.

Abaixo a cabeça ainda atormentado pelo olhar de medo que Tomás havia me lançado. Meu filho tinha tanto medo de mim...
Encaro os bicos dos meus sapatos e minha vista fica embaçada.
Karol é a primeira pessoa, fora Marg e eu, que fez Tomás falar. Como eu posso tirá-la da vida dele?
Eu não posso.

Abano a cabeça e giro nos calcanhares para olhar para Marg, ela está parada poucos passos à minha frente e ergue a mão para me tocar, mas eu faço que não com a cabeça e ela desiste.
Não gosto que me toquem. Desde que Cristina morreu ninguém me fez carinho ou me afagou e é melhor assim.

Nos Seus Olhos (Volume 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora