Ruggero

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Uma maldita crise de pânico. Mais uma. Uma de tantas que me acometem desde o falecimento de Cristina.
Eu não devia ter saído de casa. Foi uma burrice sem tamanho. Não posso me dar ao luxo de simplesmente achar que a minha vida voltará ao normal se assim eu decidir.
Isso não está mais no meu controle.

− Tem certeza que está bem? – Candelária pergunta enquanto senta-se na beirada da minha cama. Eu detesto a ousadia dela, mas não falo nada. Não quero deixar minha mãe ainda mais nervosa. – Se quiser, eu durmo aqui com você.

Puxo minha perna para o lado, pois ela está quase tocando no meu joelho.

− Não preciso que ninguém durma comigo. Estou bem. Saia da minha cama, aliás.

Candelária troca um olhar com minha mãe e depois dá de ombros se levantando e ajeitando a blusa.

− Filho, a sua prima só está tentando te ajudar. – Mamãe diz. – Ficamos muito preocupadas. Você nunca sai e, quando finalmente inventa de sair, resolve ir sozinho? Você sabe que não deveria ter feito isso.

− E porque não?! Porque diabo eu preciso dar satisfação dos meus passos? Sou um homem adulto, porra! – Falo exasperado.

Não tenho paciência para essa merda toda.

− Calma. – Candelária diz. – Eu o entendo, Tia. Está tudo bem. Eu vou embora, depois eu ligo.

Minha prima pega sua bolsa e vem na minha direção se despedir, porém viro o rosto para o lado e ela desiste.
Com o canto de olho vejo minha mãe cruzar os braços e fazer um gesto negativo com a cabeça.
Ouço a porta ser fechada e só então me levanto da cama e vou até a mesinha no canto da parede onde ficam minhas bebidas.

Preciso de uísque.

− Você vai beber, Ruggero? Beber? Você tem noção do quê acabou de acontecer? – Minha mãe grita alto demais e minha cabeça dói mais forte. Que inferno. – Estou falando com você!

Pego uma garrafa e viro-me na direção dela com a raiva querendo abrir espaço e explodir por todo meu corpo.

− O que você quer que eu diga? Que eu não consigo ir nem na merda da esquina comprar uma vela de aniversário para o meu filho sem ter uma crise de pânico e surtar? É isso que você quer que eu diga? – Retruco quase gritando. – Eu sou a bosta da sombra do homem que eu fui e só quero beber para enfrentar isso. Quer tirar esse meu único prazer?

Ela para entre a cama e o lugar onde estou em pé.
Minha mãe ainda é jovem, mas quando essas coisas acontecem comigo eu noto que ela envelhece pelo menos uns dez anos; sua boca se enruga e seus olhos caem, sem contar que noto que suas mãos tremem de nervoso.
Ela adoece quando eu adoeço.

− Eu só quero que você entenda que beber não é a saída, mas sim que a melhor coisa é procurar um psicólogo e se tratar.

Nego com a cabeça.

− Já tenho os remédios que preciso e isso é o suficiente. - Coloco a garrafa na boca e entorno uma boa dose de uísque que desce rasgando pela minha garganta. Limpo a boca com as costas da mão. – Já pode ir, o espetáculo acabou, mamãe.

Antonella balança a cabeça em um gesto de completa decepção e seu olhar se perde como se não tivesse nem me enxergando; ela dá meia volta, pega a bolsa e sai batendo a porta com bastante força atrás de si.
Fico encarando a porta fechada e bebo mais um pouco da bebida.

O que eu mais queria era esquecer o olhar de puro desapontamento que Karol me lançou antes de descer do carro. Aquele olhar jamais sairia da minha alma, havia ficado desenhado em contornos fortes e provavelmente eu sonharia com ele.

Nos Seus Olhos (Volume 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora