6. O Caminhão

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Ao amanhecer do dia foi preciso parar, precisavam abastecer, tomar café e descansar um pouco, Isabela continuava na mesma posição, pernas esticadas no banco de trás, cabeça apoiada no vidro entreaberto, olhando a paisagem que passava assustadoramente veloz, chorava em silêncio.

 
André e Simone estavam cansados, conversavam apenas entre si, falando de assuntos variados, desistiram de puxar conversa com a pequena garota, desde a saída de Itapecerica da Serra ela não falava absolutamente nada, todas as perguntas a ela ficavam sem resposta, estava calada, muda, decidiram então não mais perturbá-la.

 
Pararam num posto de gasolina ao lado da estrada, abasteceram e estacionaram pra tomar café, caminharam até a lanchonete, Isabela não tinha fome, mas forçou-se a comer algo, em seu íntimo não sabia ainda o que aconteceria com ela, já que ia mesmo ganhar uma bela surra de sua mãe, se estivesse de estômago cheio poderia adiar esse momento.

 
Caminharam pelo gramado que cercava toda a região, à sombra de belas e altas árvores, André e Simone, não tiravam os olhos de Isabela, não confiavam nela, era muito esperta, principalmente por não desgrudar de sua mochila pra onde quer que fosse, parecia já estar planejando algo, enquanto ela atirava pedrinhas nos galhos de uma árvore, eles ficavam mais atrás conversando entre si.

 
Simone precisava ir ao banheiro, Isabela seguiu-a, pelo visto queria ia ao banheiro também, Simone e André nunca iam juntos ao banheiro, primeiro um ia e outro ficava vigiando Isabela, depois invertiam, dessa vez porém, André ficou sozinho no estacionamento esperando as duas voltarem, depois veio Isabela sozinha, André imaginou que sua esposa ainda estava lá e caminhou com Isabela até o gramado que ficava a uns cinquenta metros dos banheiros, mas Simone estava demorando, o café tinha sido excelente, a sombra daquele jacarandá também era incrivelmente convidativa, não faria mal vigiar a garota sentado por uns minutos, estava cansado, dirigia desde as quatro da manhã, começou a ficar sonolento, Simone não vinha, balançava a cabeça para os lados a fim de afastar o sono e a menina não desgrudava os olhos dele, ele percebia, ela disfarçava mas ele percebia claramente que também estava sendo vigiado, uma brisa agradável assoprava e fazia seus olhos pesarem, André abria e fechava os olhos repetidas vezes, a menina continuava jogando pedrinhas e olhando pra ele, de súbito Simone estava ao seu lado chacoalhando-o:

 
- André, acorde, acorde!

 
- O que aconteceu?

 
- Onde está a menina?

 
- Menina? Que menina?

 
- Como que menina? Isabela, onde está Isabela?

 
- Eu acho que cochilei um pouco.

 
- Venha, vamos procurá-la, ela não está longe.

 
Assim que percebeu que André dormia, apressou-se, precisava sair dali, correu para os fundos da lanchonete, havia uma pequena trilha aos fundos, correu por ela sem demora, correu o mais rápido que pode, olhava pra trás a todo o momento, a distância percebeu que estavam alcançando-a, gritavam para que parasse, mas ela seguia em frente, a trilha começou a descer, ao longe via algumas casas e uma rua onde transitavam poucos carros, continuou a correr e André e Simone estavam já bem perto dela, gritando seu nome, dobrou rapidamente num terreno abandonado, desceu pela rua de trás, havia um garoto brincando com uma lona velha, ao ver a garota perseguida pensou em ajudá-la.

 
- Ei, ei, rápido, venha, deite-se aqui, eu te escondo.

 
Isabela não pensou duas vezes, precisava arriscar, deitou-se rapidamente de bruços enquanto o garoto jogou a lona velha por cima dela e sentou-se em cima. Embrulhada pela lona, Isabela agarrou-se a sua mochila e ficou torcendo para que o garoto estivesse sendo sincero e não a entregasse, seria seu fim com certeza, é certo que se fosse mesmo voltar para a casa de sua mãe, fugiria de novo, mas isso demoraria muito e daria muito mais trabalho. Por baixo da lona, com o garoto sentado bem às suas costas, Isabela pode ouvir quando chegaram.

ISABELAOnde histórias criam vida. Descubra agora