10. A Noite de Terror

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Isabela acordou de madrugada morrendo de frio, não sabia quantas horas tinha dormido, seu relógio marcava três e vinte e três da madrugada, o ar condicionado do ônibus estava fortíssimo, de modo que ela se encolhia toda e batia os dentes de frio, continuou assim sem conseguir dormir, o frio espantava o sono, teria que aguentar assim até amanhecer o dia ou pior, até chegar em Fortaleza. 

Por sorte, uma senhora foi ao banheiro do ônibus, e na volta parou ao lado de Isabela e olhou–a por alguns segundos, depois voltou a sua poltrona, porém não se sentou, parecia mexer em algo dentro de sua mala de viagem. Voltou alguns segundos depois com um cobertor. 

– Mocinha, tome minha filha, você está morrendo de frio. 

– Mu... muito... obrigada. 

– Você desce em Fortaleza? 

– Sim senhora – respondeu embrulhando-se com o cobertor o qual a senhora ajudava pra que ela se aquecesse rápido. 

– Então fique com ele até o fim da viagem, eu também desço lá, na saída você me devolve. 

– Sim senhora, muito obrigada – respondeu Isabela já começando a se sentir melhor. 

A senhora levantou-se e voltou pra sua poltrona, Isabela ficou ali, embrulhada com o cobertor e ainda agarrada em sua mochila olhando a escuridão fora do ônibus, alguns minutos depois voltou a adormecer. 

Acordou novamente um tempo depois, trovões e relâmpagos por fora do ônibus anunciavam uma chuva forte que começava a cair em grossos pingos no asfalto. Cinco e vinte cinco da manhã marcava em seu relógio. 

Não tinha nem ideia de onde estavam agora, mas com certeza estavam já bem longe de São Luiz. 

Ah se pudesse adiantar o tempo, não via a hora de chegar logo, ainda se pegava pensando em como seria seu pai, agora já sabia muito mais coisas dele, seu nome era Fernando Marcatto, morava a pouco tempo em Fortaleza, desses doze anos em que tinha se separado de sua mãe, a maior parte desse tempo tinha vivido em Itapecerica da Serra, tinha mesmo morado na fazenda, namorou sua mãe sempre escondido naquela linda cachoeira, achando que ninguém via o namoro dos dois, quando na verdade todos sabiam mas não se importaram muito, até que seu avô separasse os dois quando descobriu que sua mãe tinha ficado grávida com a mesma idade que ela contava agora, doze anos, não culpava ninguém por isso, nem mesmo pela separação de seus pais, embora fosse nova ainda, ela também sabia que gravidez aos doze anos era um absurdo, bebês eram apenas pra adultos, provavelmente se estivesse no lugar de seus avós ela também faria a mesma coisa. 

Sua mágoa não era pela separação, era por esconderem o passado de seus pais dela. 

Obrigando-a a acreditar em uma mentira, que seu pai tinha morrido, não entendia por que sua mãe passou sua vida inteira batendo nela e brigando pra que ela acreditasse em algo que seu coração não conseguia, agora já tinha confirmado, era mesmo uma mentira, não queria nem pensar mais em sua mãe pois provavelmente nunca a perdoaria por isso. 

Em seu coração já sabia, a surra que ela tomou algumas semanas antes de fugir de casa, no dia em que sua mãe a pegou mexendo na mala de seu avô, a separou de sua mãe para sempre, nunca mais perdoaria sua mãe. 

Ao remexer nessas lembranças não percebeu que já começava a chorar sozinha, enquanto os pingos da chuva molhavam a janela por fora, Isabela chorava sozinha encostada no vidro da janela, os pés dobrados sobre a poltrona ao lado, embrulhada no cobertor emprestado ela se lembrava de sua família que tinha deixado em Amador Bueno, o único com o qual ainda se preocupava lá era André, seu querido irmão, sentia muito a falta dele, doía estar longe dele já a tanto tempo sem nem mesmo conseguir falar com ele. Por um instante imaginou que era pra ele estar junto dela naquele momento, sua viagem poderia ter sido bem diferente caso André tivesse aceitado a ajudar. Ele fez sua escolha, não o culpava por isso, sabia que o irmão não pensava como ela, mas o amaria de qualquer forma até o último dia de sua vida. 

ISABELAOnde histórias criam vida. Descubra agora