41 - Medo

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Alguns mais ligados a superstições diziam que tempestades eram sempre mal presságios. Outros tinham apenas um medo irracional delas. Katharine nunca se encaixou em nenhum dos dois grupos, muito pelo contrário, se achava uma amante da chuva e sempre se sentia bem quando ocorria. Entretanto pela primeira vez na sua vida ela estava com medo da tempestade, que novamente mostrava todo o seu poder. Ela havia perdido a conta de quantos tempo estava chovendo sem parar, mas os resultados eram impossíveis de não serem notados. O prédio onde estavam se deteriorando por conta da água que invadia os primeiros andares e os alagavam por completo. Rachaduras gigantes nos apartamentos permitiam que qualquer um visse o que estava acontecendo na rua. A batalha já durava várias horas, e o sol já havia se recolhido no horizonte, tornando o dia mais escuro do que já estava. "Eles devem se acalmar durante a noite" pensou a garota, mas ela estava errada. Quanto mais anoitecia mais a batalha rugia ferozmente. "Está se aproximando", o pensamento invadiu sua mente, fazendo seu frágil corpo tremer, talvez de frio, talvez de medo ou quem sabe por conta dos dois.

De repente a jovem sentiu um braço quente contorna-la, ficando assustada durante um segundo, até perceber que se tratava de Sebastian. Permitiu-se se aconchegar um pouco mais, deixando os ombros se relaxarem.

- Acho que podemos fazer uma fogueira aqui. – Disse Clara. – Está ficando muito frio
- Gosto dessa ideia. – Disse Susana, batendo queixo de frio.

No apartamento, por conta das infiltrações causadas pelas rachaduras, a maioria dos moveis estavam molhados, mas o grupo conseguiu alguns pedaços de madeira suficientemente seca para iniciar uma fogueira no chão da sala. A grande televisão que estava a poucos metros dali serviu como um refletor improvisado, iluminando ainda mais o ambiente. Aparentemente naquela casa viviam uma família grande, pois em dois dos três quartos haviam brinquedos espalhados. Num deles, bonecas, carrinhos entre outras coisas indicavam a presença de uma menina, enquanto no outro, haviam bastante livros, que infelizmente jaziam encharcados pela chuva que entrava. O terceiro quarto obviamente era do casal.

- Eu gosto de ficar imaginando como era a vida das pessoas nas casas que a gente vai. – Disse Sebastian tentando quebrar o gelo.
- Eu tentei isso uma vez. – Disse Clara. – Não consegui dormir por três dias.

A conversa morreu ali. Ninguém estava disposto a jogar papo fora, pois todos se sentiam apreensivos com a batalha que claramente se tornava mais violenta e cada vez mais próximas. Se aproximava das dez horas quando um barulho externo invadiu os ouvidos do grupo e aterrorizou seus corações. Parecia um grande trator ou talvez algo maior ainda, bastante pesado andando pelas ruas. "Um tanque" pensou Katty. A curiosidade era maior do que o medo e ela, por uma das várias rachaduras, conseguiu vislumbrar na rua aquele gigantesco veículo blindado com seu gigante canhão apontado para frente. Aquele monstro negro era cercado de vários inimigos fortemente armados que marchavam ritmadamente para combater os adversários humanos. O coração da garota parou durante aquela visão, sua pele tornou-se branca como papel e seu corpo frio como gelo. Ela não conseguia parar de olhar aquela aterradora imagem.

- Temos que sair daqui. Agora. – Disse Sebastian.
- Não! – Retrucou Susana. Katharine estava atônita ainda.
- Olha o monte de soldados lá fora. Aqui não é mais seguro.
- Exatamente Sebastian. Olha o monte de soldados lá fora. E você quer sair? Eles não sabem da nossa existência.
- Suzzy tem razão cara – Concordou Clara. – Nossa melhor opção é nos manter quietos aqui e rezar.
- Quando eles estiverem longe o suficiente, a gente vai embora.

Enquanto isso, Black recebia curativos do médico de campo. Seu braço estava perfurado por um projetil inimigo, mas ele não iria deixar aquele pequeno ferimento abalar seus soldados. A moral deles havia diminuído desde a notícia de que novos reforços inimigos estavam a caminho. O número de carros de guerra dos adversários já estava se igualando ao deles. Quando a atadura terminou de ser envolvida no braço do Major, ele levantou-se com o vigor renovado e gritou a plenos pulmões:

- ELES PODEM TIRAR NOSSAS VIDAS. MAS NÃO PODEM TIRAR NOSSA LIBERDADE! – E por todos os cantos gritos de euforia foram ouvidos. A frase de efeito do antigo filme foi ecoada por toda a tropa. – NÃO VAMOS RECUAR AGORA! ESSA CIDADE É NOSSA. ESSE PLANETA É NOSSO!

O reforço inimigo já era visível e aquela visão fez com que o estomago de Black se congelar. Mas ele não deixaria isso o abalar. "Os bastardos estão usando armamento russo. Mas como..." pensou rapidamente ele antes do primeiro disparo do canhão de 125 mm acertar o prédio a esquerda deles, fazendo-o desmoronar sob alguns combates que não tiveram tempo de correr. Correndo até o um soldado responsável pelas comunicações, Augustus imediatamente pediu suporte aéreo.
- Água dourada aqui é alcateia branca. Na escuta? Cambio. – Ele esperou durante alguns segundos, mas nenhum retorno foi dado. – ÁGUIA DOURADA AQUI É ACATEIA BRANCA. NA ESCUTA? CAMBIO. – E novamente apenas estática foi recebida. Ele xingou e repetiu o chamado uma terceira vez. Dessa vez obtendo a tal esperada resposta.
- Alcateia aqui e águia na escuta. Cambio. – Respondeu o piloto.
- Temos um T-14 causando problemas aqui. Precisamos de suporte imediatamente. Repito Precisamos de suporte imediatamente, Cambio.
- Copiado. Marque o inimigo. A ajuda está a caminho. Cambio.

Aquela resposta o alegrou de tal forma que até um pequeno sorriso surgiu em seu rosto, mas rapidamente foi substituído pela feição de combate. Com um binoculo, o Major marcou o alvo a laser, de forma que somente o jato de combate pudesse ver. Ficou naquela posição durante o que pareceu para ele uma eternidade, até que de longe ouviu o barulho da aeronave se aproximando a toda velocidade e despejando dois projeteis, causando uma onda de choque que levantou poeira e cobriu parte dos inimigos que estavam próximos do alvo. Quando a mesma abaixou, Augustus praguejou alto, pois o veículo ainda estava operacional. Entretanto, observando com o binoculo ele percebeu que havia um soldado perigosamente próximo das linhas inimigas. Identificou o infeliz como cabo Vasquez. Pegou seu rádio e imediatamente lhe mandou uma mensagem:
- Vasquez, saía daí imediatamente. O que está fazendo?
- Isso é um T-14 senhor. É a melhor blindagem russa. – Disse ele, mas a mensagem quase não foi entendida, graças ao ruído estático.
- Vamos fazer outro ataque. Você precisa sair daqui.
- Sessar fogo senhor. Eu sei o que estou fazendo, cambio e desligo.

Sem mais o que fazer, o major observou seu soldado que, na visão do líder, iria para uma missão suicida que apenas resultaria em sua morte. Ele correu o máximo que pode, e depois soltou uma granada de fumaça, o ocultado da visão de todos. Os alien começaram a atirar aquela bola preta de gás e nesse momento Black sabia que não iria mais ver Vasquez com vida. Durante alguns segundos o mundo simplesmente parou de girar, e só voltou a sua rotação normal quando uma última mensagem eu seu radio o assustou.
- Atire na bomba. – Foi o que ele disse antes de ser finalmente alvejado. Os tiros eram altos o suficiente para fazer o ouvido do líder doer. Ele pegou seu binóculo e percebeu uma pequena carga de explosivo plástico preso em um ponto da fuselagem do carro de combate.
- Maldito filho da puta. – Retrucou Black. – ADAMS! – Gritou ele, e pouco tempo depois um franzino rapaz segurando um fuzil que era quase metade do seu tamanho apareceu diante ele. – Naquele tanque há uma carga de c4. Eu quero que você atire nele.
- Mas senhor. – Disse o jovem, visivelmente aterrorizado com a ideia. – Eu não consigo nem vê-la senhor.
- Vamos Adams. Não quero covardes no meu batalhão. Você vai atirar no c4 e vai explodir aquele maldito tanque. Use isso. – O major entregou para o garoto um pequeno objeto, que parecia mais um monóculo. – É uma mira infravermelha. Eu vou marcar o Alvo e você atira nele.
- Sim senhor. – Nesse instante mais um disparo aconteceu, dessa vez destruído um tanque de guerra dos humanos.

Os dois combatentes tomaram a melhor posição possível e deitaram no chão. A chuva era um fator que atrapalhava bastante aquela situação, mas nenhum dos dois se deixou abater por isso. Durante vários segundos os dois ficaram ali, deitados imóveis. Alguns soldados até estranharam aquela posição já que a batalha se torava cada segundo mais acirrada. Por fim, o rapaz atirou, e nada aconteceu.
- Calma garoto. Não temos muito tempo. Se concentre e tente novamente.

Adams fechou os olhos, tirou a água do rosto, respirou fundo e abriu lentamente o olho esquerdo, colocou-o na ponta da mira e o mundo tornou-se avermelhado. Respirou lentamente enquanto um ponto surgia naquele monstro de metal que parecia apenas uma mancha escura. Novamente inspirou e expirou o ar dos pulmões. Pensou em casa, nos amigos, na família, e por último prendeu a respiração e puxou o gatilho. Só teve tempo de ver aquela mancha negra se tonar uma bolha vermelha gigantes. Os gritos dos seus companheiros revelavam que ele havia conseguido.
- Bom trabalho. – Disse o Major, dando dois tapinhas no ombro antes de levantar e voltar para a batalha. 

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