Capítulo 10 - Animais atropelados

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Fechei os olhos, desviando-me daquela cena horrenda do cais.

Será mesmo possível? Será que a festa tinha sido estragada por um afogamento antes de ela começar? De repente, pensei em Amy. Ela tinha me alertado para não vir a esta festa. Ficou dizendo que havia uma maldição na família Fear. Mac também tinha me alertado, mas ele era maluco e ciumento, e estava fora de controle.

— Continue em frente, pessoal — Miguel nos ordenou. Não se preocupem com Randy. Antonio está com tudo sob controle. — A voz dele vacilou. Ficou óbvio que Miguel estava mentindo.

— Randy está bem? — perguntei de novo. — O Antonio conseguiu tirá-lo da água?

— Está tudo sob controle — Miguel repetiu. — Agora, vamos, todos em frente.

Eu estava me sentindo mal. Decidi mandar uma mensagem para Amy e dizer que ela talvez estivesse certa sobre a festa. Peguei meu celular. Sem sinal. Claro. Eric tinha me avisado que os telefones não funcionariam na ilha.

O caminho se transformou numa subida conforme nos aproximamos da casa. Ouvi um pássaro estranho cantar no galho de uma árvore. Um longo ru-ruuuuu. Muito triste e humano. Como alguém chorando. Meu pesadelo surgiu em minha cabeça, num lampejo. O pequeno pássaro marrom na grama que se transformou em rato nas minhas mãos. A mordida de suas presas. O sangue jorrando do meu punho.

Não. Para, Rachel. Tire esse pesadelo da cabeça. Pense em Brendan. Ele a convidou porque gosta de você. Pense no quanto ele é gatinho. Não pense no sangue na água que ficou pra trás, no jovem que não voltou à superfície...

Andamos em silêncio. À minha frente, Kerry estava com o braço em volta de Patti. Ela ficava sacudindo a cabeça. Cruzei os braços para parar de tremer. Até Eric ficou em silêncio, com o olhar fixo em algum ponto diante dele enquanto seguíamos Miguel pelo caminho, por entre as árvores.

Fiquei aliviada quando vi um círculo de luz adiante. Saí- mos da mata fechada e chegamos a um amplo gramado bem aparado e cuidadosamente limpo. Não havia folha alguma. E, para além desse campo, a mansão imensa se erguia, iluminada por pontos de luz vindos das sacadas do alto.

Nas portas duplas da frente outra empregada de uniforme preto esperava para nos receber. Seu crachá dizia delores. Ela entregou a cada um de nós um envelope branco lacrado e seguimos até o hall.

— Não abram até que chegue a hora — ela repetia para todos.

Hora de quê?

Pisquei devido à luminosidade da entrada. Um lustre cintilante de cristal pendia sobre nossas cabeças, lançando uma luz branca sobre nós. O chão era de mármore preto e branco. O papel de parede amarelo tinha lindas borboletas brancas, centenas de borboletas voando em fileiras perfeitas.

Miguel sussurrou algo a Delores, depois seguiu correndo pelo corredor. Delores pareceu aflita. Miguel deve ter lhe contado sobre o acidente de Randy, mas ela forçou um sorriso e nos levou até uma ampla escada curva na lateral da entrada.

— Depois do trajeto de barco, todos vocês provavelmente vão querer subir e se refrescar — disse Delores. — Nós abrimos alguns quartos lá em cima. E vocês podem deixar seus casacos e mochilas lá.

— Vou dividir um com a April — avisou Eric. Ele se virou para ela. — Não implore. Eu já disse que posso dividir um com você.

Ela pegou o capuz do moletom que ele usava e abaixou sobre o rosto dele.

— Isso é um sim? — ele perguntou.

Seguimos Delores escada acima. Entramos num corredor comprido e pouco iluminado. Havia quartos dos dois lados, até o final. Enquanto a seguíamos, passamos por imensas pinturas nas paredes, quadros dos Fear, imaginei. Gente de ar soturno, sentada ou em pé, todos rijos diante de um fundo escuro. Não pareciam maus, mas também não pareciam agradáveis.

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