Ativo e Passivo - Opostos que se atraem

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Por Braz

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Resolvi fazer algo que já fiz dentro de vários contos, apontar algumas diferenças entre eu e Túlio, isso como homenagem aos nossos quase dez anos juntos.

Degustar um prato gourmet em um restaurante sofisticado, acompanhado por um vinho perfeito e altamente recomendado é algo excelente. Chamo de aproveitar um pouco a vida.

Porém no dia a dia, nada como o clássico, o básico que dá sustância, enche a pança, o corpo de energia e até uns quilos extras se o cara não se cuidar.

Jamais tive luxo na alimentação, a não ser que pague por isso em um ambiente que cobra caro pra cacete, porque em casa como eu citei, somos presenteados com a simplicidade da alimentação trivial. Um trivial de respeito, eu digo. Porque não tem nada melhor do que sentar à mesa e ter um feijãozinho, arroz, salada e carne. Pra variar, a Itália faz um bife de fígado, peixe ou ovo frito.

O quê? O Braz come ovo frito?

Meu Deus gente, quer coisa melhor? Agora um cidadão que tem um pouco de grana tem que almoçar todos os dias no melhor restaurante e postar numa rede social a quem se interessa por futilidades?

Eu gosto de comida simples. Nossa empregada faz comida de gente, comida boa, bem temperada e que sustenta. Polenta, galinha caipira com molho, arroz, feijão, carne, macarrão caseiro com um bom molho, peixe, carne assada, costela cozida na panela de barro, legumes refogados, couve frita e um bucho bovino que é de lamber os beiços. Tem comida para todos os gostos e eu só não como algo quando estou doente e sem apetite porque tirando chuchu que não tem gosto de nada, demais comidas eu devoro. Como tudo.

Para amenizar o lado do Túlio nesse capítulo eu posso afirmar que ele não reclama da comida. Nunca reclamou declaradamente. E se colocar na frente dele um prato somente com arroz e feijão sem mistura alguma, ele come bem quietinho. Uma polenta com um pedacinho de carne, ainda ok. Uma macarronada e só um pouquinho de molho, ali na estica. Um peixinho frito, quase bate na trave. Agora os detalhes, amigos, os detalhes me dão nos nervos.

No caso da polenta com frango caipira, ele revira o pedaço da carne pra ver se não tem pele ou gordura grudada. Na feijoada se tem carne dentro, ele não come se ela disser que pôs itens suínos com medo de mastigar um naco de orelha ou rabo de porco. Peixe, se achar um espinho, já coloca de lado. Abóbora ele nem mexe. Carne de panela só se não tiver gordura e bucho... ele diz que o cheiro o deixa enjoado. Nisso eu até o respeito, porque dobradinha é amar ou odiar esse prato.

— Como que pode, filho de colono que não come ovo, não toma um copinho de leite e corta as coisas nas pontas dos dedos. — Itália adora perturbá-lo sempre.

— Dona Itália, não sou obrigado a gostar de tudo o que vocês gostam. Eu sou muito grato pelo alimento do meu prato, mas tem coisa que não desce.

— Mas é difícil de tu se agradar cem por cento.

— Não mesmo.

— Nem mexeu na abóbora. Essa cabotiá eu recheei com carne seca e assei no forno do fogão a lenha, tá um prato quase de luxo. Só pegou um pouquinho de recheio lá do meio pra nem encostar na abóbora.

— Eu não gosto de abóbora.

Tadinho. Ela sempre pega no seu pé, mas de uma maneira maternal autoritária. Parecendo mesmo mãe e filho na maioria das vezes. Claro que ela uma grande mulher ítalo-brasileira e ele um gato, enjoado, descendente de alemães.

Ativo e Passivo 2 - Rotina não contábilOnde histórias criam vida. Descubra agora