9 - O presente

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Memórias de dezembro de 2008, 14 anos. 


— Mãe, preciso te contar uma coisa. Sobre Raquel.

Era sexta-feira. Minha mãe como sempre não parava quieta, fazia mil coisas ao mesmo tempo. Naquele momento ela colocava as roupas no varal da área de serviço, e não pareceu tão interessada no que eu tinha a dizer, até eu tocar no nome da minha irmã.

Raquel fez algo muito grave. Eu não queria contar, mas não vi escolha.

— Meu Deus do céu! — Minha mãe colocou a mão na cabeça nervosa. Seus olhos encheram de lágrimas, mas ela não chorou.

Ela se sentou lentamente no chão e continuou com as mãos na cabeça pensando por um longo tempo. Não importava o quanto eu falasse naquele momento, ela não estava me escutando. Fiquei quieta esperando ser útil, até mesmo nos problemas da minha casa.


***


Sempre foi raro eu ter um aniversário decente e legal. Primeiramente, eu sempre tinha que ajudar a preparar tudo, então eu basicamente cansativo e eu não me divertia.

O meu aniversário de 14 anos foi um pouco preto e branco. Não teria festa, estava um caos na minha casa e eu não tinha muitos motivos para comemorar. Então apenas passei um dia normal, como qualquer outro. Meus pais precisaram ir para a capital urgentemente levar Raquel para algumas consultas com o psiquiatra, eles estavam muito focados em diagnosticar ela corretamente. Antes era apenas "desvio de conduta", agora eles perceberam que ela tinha era muito mais grave. Só não queriam admitir.

Minha mãe não queria me deixar em casa sozinha, mas eu não queria ir para a casa de Rafa e aguentar a gritaria daquela casa, além de que o padrasto dela me dava medo. A minha segunda opção era a casa de Enzo, ficar lá com vó Ana. E foi o que eu escolhi.

Eu sempre achei estranho ficar na casa dos outros. Minha timidez não me deixava sequer abrir a geladeira para beber água sem antes pedir autorização, então era uma tortura. Preferia ficar em casa sozinha. Colocaria meus fones de ouvido e escutaria música até cansar; assistiria alguma comédia boba e comeria besteira. Seria perfeito. Mas meus pais jamais deixariam.

No fim das contas ficou tudo certo para eu passar a noite na casa de Enzo. Rafa queria ficar conosco até o outro dia, mas a mãe dela descobriu que ela estava namorando escondido e colocou a garota de castigo por tempo indeterminado.

Quando já estava tudo pronto para a partida, meus pais colocaram Raquel no carro — a garota dormia angelicalmente depois do tranquilizante que minha mãe colocou na comida dela. Minha mãe estava nervosa, e conversava com Vó Ana baixinho com as sobrancelhas franzidas de preocupação. Vó Ana tentava acalmar ela pelo que eu via.

— Se comporte, Margot. Mamãe volta amanhã de tardinha. — me abraçou e bagunçou meus cabelos. Ela as vezes agia como se eu tivesse 6 anos de idade, mas pela tensão do momento eu relevei. — Pegou tudo? Escova de dentes, roupas...

Era muito estranho quando minha mãe se preocupava comigo, já que eu sempre fui a filha meio deixada de lado — mesmo que inconscientemente — por ela. Me sentia até mesmo deslocada. Eu sabia que não era porque ela queria, e sim porque Raquel consumia toda a energia e paciência que ela tinha.

— Está tudo aqui mãe. Relaxe. — ela entrou no carro e meu pai acenou para mim.

— Vá tranquila, Margot vai ficar bem. — disse vó Ana e nós observamos eles darem partida no carro.

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