Você não deveria dançar sozinho

161 28 7
                                    

deixe um votinho~

Brindamos não sei a que e bebemos nossa segunda remessa de cerveja. Tem o gosto estranho e eu sinto um pouco de aversão, mas é legal visitar a Catedral de Notre-Dame meio bêbado com Kihyun. Analisamos cada detalhe da arquitetura, até porque é isso o que me interessa. Ele fala sobre arte gótica e eu arroto a cada cinco minutos. Sobrou apenas poucas garrafas na caixa e estamos bebendo-as enquanto assistimos o rio Sena como se algo extraordinário estivesse acontecendo.

— Só sobrou essa, toma — ele me empurra a garrafa com uma gentileza anormal, como se eu quisesse-a mais que tudo.

— Pode beber, primeiro as damas — eu rio, empurrando-a de volta.

— Dama teu pau! — a boca dele fica suja quando está sob efeito de álcool, e é impossível não surtar internamente com isso.

— Quem disse que eu tenho?

— Quem disse que eu não tenho? — seu olhar me desafia. Eu rio e dou o primeiro gole na bebida.

— Sua vez — empurro a garrafa para ele.

Kihyun revira os olhos e dá, não só um, mas inúmeros goles, um atrás do outro sem pausa alguma e, depois de trezentos anos, dá um passo para trás e afasta a garrafa da boca enquanto a cerveja desliza pelo seu queixo.

— Meu Deus, você quer ficar louco! — exclamo, enxugando seu queixo com a ponta da manga da minha camisa.

— O que você acha de bebermos algo forte? — indaga ele, e então bebe mais da cerveja e quando vejo, felizmente, não há mais nada que sobrou para mim.

Eu nunca fui de beber. A primeira vez que bebi, eu realmente queria ficar doidão, então roubei as cachaças de meu pai e, idiota, achei que ele não ia perceber que talvez eu tenha bebido, junto com meus amigos, 1/3 das garrafas que ele tinha. Meu pai bebia coisas fortes, do tipo que até ele (que estava acostumado) às vezes ficava meio desequilibrado. Então o idiota aqui bebeu o primeiro gole como se fosse água e fingi que aguentava o tranco. Ocorreu que eu e todos os meus amigos quase morremos. Ok, hipérbole. Mas eu não sabia beber e não tinha comido um mísero grão de arroz para tapear o estômago. Esplêndido, Changkyun, esplêndido.

— Não acho isso uma boa ideia — coço a minha nuca e faço uma expressão de rejeição.

— Então eu vou sozinho — ele se vira e sai andando pela rua. E se ele ficar sem calça de novo?

— Ok, mas eu só vou beber um pouquinho. Estou indo para cuidar de você — apareço caminhando ao seu lado.

— Tenha certeza de que será o contrário — ele sorri de entusiasmo. Sinto que isso não vai prestar.

Foucault tem uma filosofia chamada microfísica do poder, onde diz-se que o poder não só está concentrado em situações políticas, mas também nas mais pequenas e variadas relações sociais. Seria um exemplo a relação entre mãe e filho, amigos e até mesmo namorados. Sabe, talvez eu deva me arrepender do que estou a pensar agora, mas é preciso transparência ao corroborar com este pensamento do século passado.

Eu e Kihyun não somos namorados. Nós não temos nada, como bem especificado por ele. Mas é ele quem define o que vamos fazer, o que vamos comer, aonde estamos a ir e é ele sempre quem dá a brecha, o convite para que eu o beije. Isso é poder. Ele tem poder.

Analisando genericamente as relações gays atualmente, eu posso concluir que comumente quem tem o maior poder na relação é o ativo, o top, seme. 

Com isso em mente, pensando no que Foucault falou sobre o poder em pequenas relações, percebo que talvez eu e Kihyun quebramos alguns paradigmas um tanto corriqueiros do vale. Entre nós dois, eu sou convicto em afirmar que ele é o passivo. Não que eu seja o tipo de ativo que só quer ser ativo e abomina a passividade como se fosse a pior coisa do mundo, é que na minha relação com ele, eu creio ser o ativo.

 café et cigarettes ┊ChangKiOnde histórias criam vida. Descubra agora