7 - Um Novo Sentido

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Vaguei sem destino pelas ruas lisboetas. Tinha tantas perguntas inquietantes alojadas dentro da minha mente que me pareceu impossível concentrar-me no que quer que fosse. No meu rosto, um número infinito de rastos de lágrimas cobriam-me a pele.Estava a sentir-me um caco, tanto por dentro como por fora. E embora me custasse admitir, começava a arrepender-me ferozmente de ter abandonado o Seth sozinho, numa cidade onde ele não se sentia familiarizado. Contudo, que mais poderia eu fazer depois de as perguntas sufocantes, me deixarem sem qualquer capacidade de tentar compreender as suas acções?


Estava atenta a todas as perguntas que nasciam sem permissão no interior da minha mente, mas mais nenhuma me pareceu tão significante como aquela que se mantinha acesa precipitando todas as outras para segundo plano. A pergunta esculpia em mim uma dor dilacerante, talvez por não lhe ser capaz de dar uma resposta suficientemente boa. A pergunta marcada a negrito, reluzia como se fosse feita com letras de néon: "Porquê eu?"

– Porquê eu? – repeti desta vez em voz alta a pergunta pertinente que me assolava o espírito. Num mundo de encantar como aquele em que o Seth vivia, porque é que ele me escolhera a mim?

Eu não era reconhecida nas ruas, não tinha nenhum talento especial nem tão pouco era bela o suficiente para fazer com que ele se apaixonasse por mim. Por isso, como é que um ser tão perfeito como ele decidiu demonstrar um pouco da sua piedade beijando-me? Será que julgara que isso me faria sentir melhor? Depois de uma conversa de repleta sinceridade, ele decidira que um beijo fora o prémio ideal para a fã que movera um mundo inteiro para poder ir de novo ao encontro dele?

Todos aqueles pensamentos magoavam demais. Parecia que a cada um que era conjurado, lhe era atribuída um tipo de faca diferente, um corte mais profundo, mais doloroso. Não queria continuar a pensar naquilo, mas parecia que a minha própria mente se tornara masoquista pois não me permitia esquecer.

Não me estava a aperceber muito bem para onde me dirigia por estar tão absorta nos meus pensamentos. Contudo, foi-me fácil distinguir o cheiro da maresia. Um pouco mais à frente e apesar de não me ser possível aceder ao oceano, conseguia ouvir ao longe o marulhar das ondas no areal.

Encaminhei-me ligeiramente até a um pequeno jardim imponente plantado no meio de uma avenida cujo crepúsculo não me permitia distinguir com perfeição. Deixei-me cair no relvado e puxei os joelhos de encontro ao peito permitindo que todas as minhas lágrimas escorressem finalmente pela minha face. Não tive noção de quanto tempo estive naquele cenário agoniante onde os sons das árvores a balançarem na dança sibilante do vento e o cheiro da relva molhada foram os meus únicos acompanhantes. Senti uma pontada de dor a enfraquecer ligeiramente o meu coração quando me apercebi que chorava com pena de mim própria. 

Obriguei-me a parar de chorar nesse exacto momento. 

Acalmei a respiração e esperei que o meu coração sossegasse alguns batimentos antes de poder analisar claramente a situação em que me encontrava. Quando o choro não passava de piedosas lágrimas que escorriam sem direcção pelos meus olhos entorpecidos, consegui reflectir calmamente sobre tudo o que me tinha acontecido desde que deixara a minha casa no inicio daquela tarde.

A primeira coisa que me ocorria, era que tinha concretizado um sonho ínfimo que tinha desejado desde que abandonara esta cidade à meses atrás. Antes de retesar todos os pensamentos que se conjurassem à volta dele e do que nos unira antes de regressar a casa, desejei voltar a vê-lo. Desejei poder ter um último vislumbre dos seus olhos azuis cristalinos que brilhavam de um modo tão singular. Um desejo irreflectido de alguém que não percebia muito bem o que acontecera e precisava de uma explicação a todo o custo. Ou talvez, um desejo pateta de alguém deveras masoquista.

Por um MomentoOnde histórias criam vida. Descubra agora