4 - Regresso

5 1 0
                                    

Depois de ter chorado a minha alma nos dias que sucederam o meu regresso do encontro com o anjo, tentei adoptar um sistema que me facilitasse reaprender a viver sem a sua presença. Fiz tudo o que era suposto ter feito, tal e qual como todos esperavam de mim. Fui para a Faculdade no curso de Jornalismo e tentei viver a vida num modo em que não me sobrasse tempo para me permitir pensar nele.

Desse modo, cinco meses passaram no meio do rebuliço que se tornara a minha vida, sem que sentisse a necessidade de pensar no anjo de negro com frequência. E tal como tinha pensado, ao fazer a nota mental no dia do meu regresso, consegui aprender a ser sociável o suficiente para conseguir estender os meus laços de amizade.

A Faculdade tinha sido uma instituição a que me fora um pouco difícil adaptar. Mudara tudo, os colegas, o local, e somente a responsabilidade que isso acartava crescera. Não consegui ser muito coerente com os meus pensamentos quando Outubro chegou e trouxera consigo o tal novo sentido de responsabilidade. Com a mente repleta de sentimentos de pânico e receio, era-me mais difícil procurar usar eficazmente a máscara pelo que me vi obrigada a deter pensamentos quando me apercebia que já o Seth divagava há muito tempo na minha cabeça.

Contudo, como tudo na vida se ultrapassa, os sentimentos que me assombraram o espírito nos primeiros meses desapareceram permitindo-me concentrar-me em utilizar eficazmente a minha máscara protectora. E com um uso permanente da máscara, pude tentar arranjar formas de distracção que me permitissem aliviar a dor da alma abstraindo-me noutro qualquer passatempo que não o envolvesse o nome que se tornara proibido. 

Podia ter pensado em várias formas mais seguras e talvez mais originais de me distrair, mas foi na moto 4 que encontrei, juntamente com toda a adrenalina que esta me proporcionava, a cura perfeita para as dores do meu interior. 

E era exactamente isso que estava a fazer neste início de tarde de sábado, a meio do frio e chuvoso mês de Dezembro. Felizmente podia contar com uma temperatura amena no Porto, uma vez que não nevava e a chuva que estava prevista para cair hoje, parecia ter decidido cessar no final da manhã. Sentia-me muito aliviada pela chuva ter parado, assim e apesar do piso ainda se encontrar um pouco lamacento, era mais fácil concentrar-me em contornar habilmente todos os obstáculos que eu, em conjunto com alguns amigos impusera-mos na nossa pequena pista improvisada.

Contornei o último obstáculo e decidi que estava na hora de me recompor e dar por terminada a minha sessão de libertação de tensões acumuladas. Encostei a moto e pousei o capacete verde-escuro no assento preto aproximando-me de alguns amigos que estavam encostados a dois sobreiros que cresciam sobre a verdejante relva repleta das mais diversas flores, que eu não me sentia capaz de identificar.

Observei cada um dos meus amigos antes de me sentar. A Sofia conversava animadamente com uma rapariga ruiva que tinha vindo com o Rodrigo, julgávamos que era sua namorada, mas a distância que ele insistia em manter dela levava a crer que era mais uma das suas intermináveis fãs. Não prestei muita atenção ao que conversavam, mas pareceu-me que mantinham uma discussão acesa a cerca de trajes universitários, o que agravou ainda mais o meu desinteresse no tópico. O Rodrigo mantinha-se na pista, juntamente com o Lucas, ao longe parecia-me que estavam numa pequena competição para averiguar qual dos dois alcançava, o último obstáculo mais rápido. A Rita, uma das minhas mais recentes amigas, uma rapariga muito morena com o cabelo castanho-escuro, lia atentamente a nova edição da revista para adolescentes mais famosa no meu país.

Rastejei até estar suficientemente perto para poder ler a revista. Durante cinco meses, evitara a todo o custo comprar aquele tipo de revistas com a certeza que cada uma traria pelo menos um artigo sobre a banda do momento. Mas este artigo chamou-me especial atenção, talvez por causa do cabeçalho que, em letras gordas escritas em rosa fúcsia, dizia: 

Por um MomentoOnde histórias criam vida. Descubra agora