Demorei a pegar no sono naquela noite, em parte porque Alfonso não saia da minha cabeça, ainda sentia meu corpo se arrepiar apenas com a lembrança do cheiro de sua pele e em parte porque não tinha tomado banho. Fiz uso da água do jarro para lavar apenas o essencial e mais nada. Custei a dormir. Entretanto, meu sonho foi muito real naquela noite. Alfonso e eu estávamos em casa na minha casa. Ele sentado no sofá e eu deitada, minha cabeça em seu colo. Conversamos sobre coisas banais e sua mão brincava em meus cabelos. Uma música suave coloria a cena. Foi tudo tão real que eu podia dizer até o nome da música que ouvi em meu sonho.
Acordei cedo outra vez, não sei se devido ao sonho estranho ou se pelo incômodo. Mas, já que estava desperta e o sol havia nascido, decidi sair da cama. Juntei os apetrechos de banho e minhas roupas, minha saia e regata e saí sorrateiramente. Não encontrei ninguém na cozinha ou nos corredores. Imaginei que ainda fosse muito cedo para que os empregados estivessem por ali. Segui o caminho que Alfonso e eu fizemos no passeio do outro dia e assim que cheguei ao rio procurei em todas as direções por algum olho curioso, mas eu estava sozinha.
Deixei a trouxinha perto da margem do rio e me despi. Pensei em entrar na água aos poucos, mas imaginei que ainda estaria um pouco fria, o sol ainda era fraco. Então dei um impulso e mergulhei na água cristalina. Caramba! Gelada! Gelada! Gelada! Minha respiração se acelerou e me arrepiei inteira. Batendo os dentes, alcancei a trouxinha e comecei meu banho, quanto mais rápida eu fosse, mais rapidamente sairia da água fria. Contudo, depois de alguns minutos, meu corpo foi se habituando com a temperatura da água e pude aproveitar melhor meu banho. Não me lembrava da última vez que tinha tomado banho de rio, talvez quando ainda era criança. A suave correnteza brincava em minha pele e, depois de me sentir limpa, realmente desfrutei o rio. Tanto que realmente estava brincando exatamente como uma criança jogando água pra cima e tudo! Quando Alfonso me encontrou.
—Você é impossível! —Censurou, me assustando.
—Alfonso! —Gritei, afundando na água o mais rápido que pude, mas pela sua cara constrangida, tive plena certeza de que ele tinha visto bem mais que meus belos olhos azuis.
Era a segunda vez que ele me via tomar banho. Pelo menos dessa vez meu cabelo não estava verde, me consolei.
—O que está fazendo aqui?
—Pretendia lhe fazer a mesma pergunta. O que faz aqui tão cedo, desacompanhada e... —Ele olhou o vestido jogado no chão. —Sem seu vestido?
—O que parece? Estou tomando banho, não deu pra notar?
—Notei sim. Lá da estrada! —Seu sorriso me perturbou. Não sabia se era irônico ou desgostoso. Mas, com certeza, não era um sorriso feliz. —Você devia ter pedido aos criados para que lhe preparasse o banho. Não é seguro, tampouco apropriado, que esteja aqui nestas condições. —Proferiu austero.
—Acontece que dá muito trabalho tomar banho por aqui, sabia? Já tentou preparar seu próprio banho alguma vez? —Sua testa se enrugou. Claro que ele nunca tinha feito isso. —E pare de chamar seus empregados de criados, é irritante, grosseiro e ofensivo!
—Perdoe-me, senhorita, mas acho que não a compreendi.
—Você me entendeu sim! Pare de dizer que são seus criados. São seus empregados. Seus funcionários. É tão ridículo se referir a eles dessa forma!
Alfonso não sabia se ria ou se ficava irritado.
—Por que se importa com isso? —Questionou.
—Por que eu também trabalho! Se meu chefe se referisse a mim como sua criada, eu te juro que arrancaria as tripas dele pela orelha!
Alfonso tentou não rir do meu pequeno discurso trabalhista, mas acabou gargalhando alto. Só então me dei conta que Storm estava ali também.