Acordei completamente desnorteada, meu corpo todo doía e a luz do sol fazia meus olhos lacrimejarem. Olhei ao redor, estava no meu quarto na casa de Alfonso. Ele estava ali, assim como o médico. Minha memória voltou como um raio, fazendo minha cabeça latejar. Encolhi-me na cama, como um bicho acuado, sentindo todas as juntas doerem.
— Não vão me levar viva pro hospício! — ameacei, procurando alguma coisa para poder usar como arma, caso eles tentassem me pegar.
Alfonso se aproximou lentamente da cama, os olhos grudados nos meus. Eu me encolhi mais quando se sentou na cama com deliberada lentidão.
Eu ainda não tinha encontrado nem uma arma.
— Ninguém a levará a parte alguma. — um sorriso agoniado nos lábios. — Jamais permitirei que alguém a machuque. — O Dr. Almeida está aqui porque você está doente. Ardeu em febre por dois dias. — explicou.
Dois dias?
Não me lembrava de quase nada! Tive um sonho estranho, cheio de imagens soltas. Alfonso me colocando na banheira ainda vestida. Eu podia ver seus lábios se moverem, mas ouvia o que ele dizia, parecia estar muito assustado. Madalena correndo apavorada com uma bacia nas mãos, o rosto de Maite cheio de lágrimas, o médico tocando meu pulso, uma colher cheia de gosma preta — essa imagem se repetia diversas vezes.— e depois o gosto amargo descendo em minha garganta. Os olhos verdes desesperados e úmidos, seu rosto retorcido pela dor, seus lábios tocando as costas de minha mão de novo e de novo. Tudo muito confuso.
— Senhorita Anahí, você teve hipotermia por ter ficado tanto tempo naquela tempestade. — o médico disse sem se aproximar. — Quando finalmente conseguimos aquecê-la, começou a queimar em febre. Imagino que se resfriou.
Funguei um pouco. Meu nariz realmente estava um pouco entupido.
—Pensei que fosse perdê-la. — Alfonso sussurrou, a voz cheia de angústia. — Você não reagia, resmungava muito enquanto a febre estava alta, pensei que... — Ele não continuou.
Abaixou a cabeça e deslizou sua mão sobre o lençol à procura da minha. Recuei um pouco e ele desistiu.
— E o pior é que seria por minha culpa! —e fechou os olhos.
— O pior já passou, Senhor Herrera. — disse o médico, se aproximando lentamente. — Não se aflija mais. A melhora dela é visível!
Não tirei os olhos do médico. Esperava que, a qualquer momento, um bando de enfermeiros entraria no quarto e me amarraria numa camisa de força. E o castiçal, que poderia ser tão útil caso isso acontecesse — eu poderia derrubar dois ou três deles antes que me pegassem —, estava sobre a cômoda, ao lado da poltrona, jamais o pegaria a tempo.
— Preciso checar sua temperatura, senhorita, — esclareceu o médico quando me afastei de sua mão.
Fiquei imóvel, mas muito alerta. Pularia pela janela ao menor sinal de enfermeiros. O médico, lentamente, tocou minha testa.
— Ainda está um pouco quente. — ele disse a Alfonso. — Acho melhor que tome o elixir novamente.
Alfonso concordou. O médico pegou uma garrafinha e uma colher.
— Creio que ela prefira que você faça isso, Senhor Herrera. — o médico sorriu sem graça.
Alfonso abriu o vidro escuro e um forte odor atingiu meu nariz.
— Eca! Não vou tomar isso! — cruzei os braços teimosamente.
— Precisa tomar para se curar, amor. — pediu numa súplica. Não deixei de notar a falta de surpresa nos olhos do Dr. Almeida. — Por favor?