O recomeço

Capítulo 11

Simon Klein

Eu não queria contar a Adam, mas não tinha escolha. Ele era meu melhor amigo, me conhecia bem, e em algum momento iria descobrir. Talvez com ele aí meu lado as coisas se tornem mais tranquilas e eu não vou ter que inventar tantas desculpas.

Joseph me olha pelo espelho central e vai diminuindo a velocidade até parar no acostamento. Adam fica me olhando por alguns segundos e como não deu nenhuma resposta ele abre a porta. Eu seguro a pasta dele e faço um sinal pra ele fechar a porta.

- Tudo bem Adam. Mas precisa levar isso a sério. – Falo irritado.

- É violência contra a mulher. Quem não leva isso a sério? – Ele me responde no mesmo tom.

- Ela é filha de um amigo. O ex marido bateu nela. Não sei o que aconteceu. Mas ele está foragido e ele me pediu para mantê-la em segurança. Foi tudo muito rápido. Não pude me organizar, mas não podia dizer não. – Falo e encosto a cabeça no banco.

- É a filha daquele cara Russo... Klaus... – Ela pergunta.

- Sim. Mas precisa manter segredo. Não pode contar nem para a Hellen. – Ele me interrompe.

- Não me pede pra mentir para a minha esposa. Ela vai me matar. Vou contar a ela. Mas ela vai guardar o segredo. – Ele fala decidido.

- Ok... Só para a Hellen. – Respiro fundo.

- Como ela está? – Ele me olha com pena.

- Não entendi. – Olho pra ele.

- A Nathalie. Como ela está. Pelos machucados foi grave. E que história foi essa de perder um bebê? – Ela pergunta preocupado.

- É mentira. Ela inventou essa história. Ela tomou um tiro na barriga e um na perna. Mas o da barriga estava sangrando. – Falo lembrando.

- Meu deus. Ela está tendo ajuda... Está indo a um psicólogo? – Adam pergunta preocupado.

- Não... Eu nem pensei direito. Não sei o que está acontecendo. A duas semanas tentei perguntar mas brigamos. Ela surtou. Achou que eu era o marido dela. Foi assustador... Quase toda madrugada tem pesadelos, grita porque provavelmente acorda assustada e depois fica chorando muito por horas. Hoje acordou ignorante e estúpida. – Termino irritado.

- Normal. Ela está se protegendo. O que você fez que lembrou o marido dela? – Adam pergunta curioso.

- Nada. – Falo pensativo.

-Ele bateu no sofá. No dia da briga quando ele bateu na mesa ela também se assustou. – Joseph fala nos olhando pelo espelho.

- Provavelmente isso. Tenta se controlar. Você é a pior pessoa para receber alguém que veio de um relacionamento abusivo. Ela precisa de carinho. Ser cuidada e não sentir medo. Ela está na sua casa, provavelmente não queria vir, não te conhece. Imagino o pânico dela. Se um homem que ela conhece fez o que fez. Imagina você, que ela não conhece e não tem coração. Ela deve estar morrendo de medo. – Ele fala me olhando.

- Entendi. Vou pensar nisso. Mas não sou bom com pessoas. Você sabe. E ela é muito complicada. - Falo e olho para Joseph.

- O pouco que vi hoje cedo, não achei complicada. Ela é muito simpática e educada. – Ele olha para Joseph. – Achou ela complicada?

- Não. Só está muito assustada. Está atacando para se defender, provavelmente desesperada. – Joseph fala.

- Então meu amigo. Se você decidiu ajudar... Então ajude. Seja Paciente. – Ele fala e sorri.

Joseph da partida com o carro e eu tento relaxar. O resto do caminho foi silencioso. Adam assumiu pela primeira vez uma postura seria e adulta. Ele sempre mudava quando ia entrar em um tribunal, era alguém sério que eu não reconhecia, mas que poderia conviver em paz, pena que durava pouco. Hoje seria um dia importante, estaríamos enfrentando a primeira audiência desse processo que estava me tirando o sono.

-Hoje vamos tentar resolver os conflitos da melhor maneira possível. Roberto está sendo acusado de abuso de poder, agressão física e verbal. - Ele fala enquanto lê o papel.

-Espero que dê tudo certo. Ele vai acabar manchando o nome da empresa. - Falo preocupado.

A primeira audiência aconteceu como Adam imaginava, Leandra não aceitou o acordo, ela queria mais dinheiro, alegando que o trauma que ela sofreu não tinha como reparar. Eu de verdade não sei o que aconteceu. Eu estava a quatro dias fora visitando a minha mãe que não estava se sentindo bem. E quando voltei recebi essa bomba.

Nunca trabalhei com Leandra de perto. Então não a conhecia bem. O que sei é que Roberto queria demiti-la a um tempo. Estava sempre reclamando das roupas inapropriadas que ela vinha trabalhar, da maneira que se comportava no escritório, que nunca fazia o deu trabalho completo ou sozinha. E além dos chegava sempre atrasada. Adam a conhecia melhor e confirma tudo isso.

Quando finalizamos a audiência eu não acreditei que teria que voltar, que isso iria continuar. Trabalhei muito para conseguir o nome da minha empresa. E agora isso. Isso saiu na mídia, os investidores ficaram sabendo e deixaram de fechar contratos. Ninguém queria se unir a uma empresa com um escândalo de abuso com funcionário. E Leandra fez de tudo para tornar isso o mais público possível.

- Bem, vamos ter que esperar 4 meses. – Adam fala e me olha. - Vai passar rápido e logo vamos resolver isso.

- Queria ter resolvido hoje. Ter colocado um ponto final nisso. São quatro meses de atrasado. – Respiro fundo.

-Vamos resolver Simon. Fica tranquilo. – Ele fala tentando me deixar mais calmo.

Voltamos para o escritório e eu passei o resto do dia olhando papeis, projetos, tentando organizar para correr contra o atraso que era na verdade, inevitável. Na hora do almoço vou ao restaurante de sempre, como rápido, passo no banco para sacar o dinheiro de Nathalie.  volto para o escritório.

Eu estava cansado. As vezes tinha vontade de desistir de tudo. Mas dessa vez era mais. Estava sobrecarregado, tudo estava acontecendo ao mesmo tempo, o processo da empresa, Nathalie que não estava ajudando. Adam que era um criança. Só faltava minha mãe aparecer.

Sento em minha cadeira e pela primeira vez depois de muito tempo, não consigo produzir nada. Olho os meus diplomas na parede e o retrato do meu pai ao lado. Para eu nunca me desmotivar.